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Meio Ambiente

Estudo revela mudança genética em filhotes de araras, impacto da urbanização

Pesquisa científica comprovou anomalias celulares em aves que nasceram na Capital

Por Gabriela Couto | 31/12/2024 13:13
Filhotinhos de arara-canindé passando por exames de monitoramento e colocação de identificação (Foto: Arquivo/Paulo Francis) 
Filhotinhos de arara-canindé passando por exames de monitoramento e colocação de identificação (Foto: Arquivo/Paulo Francis)

Um estudo inédito publicado na revista Urban Ecosystems trouxe à tona os impactos da urbanização na saúde genética de filhotes de arara-canindé (Ara ararauna) nascidos em Campo Grande.

RESUMO

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Um estudo inédito revelou os impactos da urbanização na saúde genética de filhotes de arara-canindé em Campo Grande. Analisando 48 filhotes, a pesquisa constatou alta frequência de anormalidades nucleares em eritrócitos, principalmente em aves de ninhos próximos a áreas com intenso tráfego e pouca vegetação. 100% dos filhotes apresentaram anormalidades, com micronúcleos em 47,9% das amostras, indicando danos cromossômicos. O estudo destaca a arara-canindé como bioindicador da qualidade ambiental urbana, alertando para a necessidade de conservação de áreas verdes e redução da poluição para preservar a saúde genética dessas aves.

A pesquisa, liderada pela médica veterinária, Maria Eduarda Monteiro Nascimento e coautoria de especialistas como Larissa Tinoco, Neiva Guedes, Alda Souza, LuizHepp e Larissa Grunitzky, analisou a presença de anormalidades nucleares nos eritrócitos de 48 filhotes monitorados pelo Instituto Arara Azul, durante a estação reprodutiva de 2022 (outubro de 2022 a fevereiro de 2023).

O estudo, que utilizou o teste de micronúcleos e outras anormalidades nucleares para avaliar danos no DNA dos filhotes, revela que a urbanização tem um efeito direto sobre a frequência de mutações celulares nos animais.

A pesquisa constatou que os filhotes de araras que nasceram em ninhos situados próximos a áreas com intenso tráfego de veículos e escassez de vegetação apresentaram maiores índices de anormalidades, como núcleos entalhados e células anucleadas.

"As anormalidades nucleares indicam danos ao material genético das células, o que pode comprometer processos fundamentais como a divisão celular e a reparação do DNA. Esses danos, em um longo prazo, podem afetar a saúde dos organismos, tornando-os mais vulneráveis a doenças, acelerando o envelhecimento e prejudicando a reprodução, o que impacta negativamente a sobrevivência das espécies. E é importante ressaltar que apesar de termos encontrado as anormalidades, não podemos afirmar como isso afeta de fato as araras em Campo Grande", explicou a médica veterinária Maria Eduarda.

Anormalidades nucleares em esfregaço sanguíneo de filhotes de A. ararauna de vida livre da cidade de Campo Grande, MS: A, núcleo entalhado; B, broto nuclear; C, núcleo redondo; D, núcleo reniforme; E, F micronúcleo; G, binucleado; H, anucleado. May-Grunwald Giemsa aumento de 1000x (Foto: Reprodução) 
Anormalidades nucleares em esfregaço sanguíneo de filhotes de A. ararauna de vida livre da cidade de Campo Grande, MS: A, núcleo entalhado; B, broto nuclear; C, núcleo redondo; D, núcleo reniforme; E, F micronúcleo; G, binucleado; H, anucleado. May-Grunwald Giemsa aumento de 1000x (Foto: Reprodução)

A escolha das araras-canindé como objeto de estudo não é casual. A espécie é considerada um excelente biomonitor ambiental, pois, devido à sua ampla distribuição e sensibilidade a mudanças no ambiente, pode refletir os impactos de poluentes e outras condições adversas.

"Os animais sentinelas, como as araras, compartilham o ambiente com os seres humanos, e as anormalidades observadas neles podem refletir riscos semelhantes à saúde humana. No entanto, é importante destacar que esses resultados são iniciais, e mais estudos são necessários para avaliar com precisão o impacto dessas alterações no bem-estar e na saúde dos indivíduos. No nosso estudo não podemos relacionar com os seres humanos pois isso não foi avaliado", completa Maria Eduarda.

Além disso, as aves têm uma alta taxa metabólica e um sistema respiratório eficiente, o que as torna particularmente vulneráveis à absorção de contaminantes presentes no ar, como metais pesados e compostos orgânicos persistentes.

De acordo com os resultados, das 45 amostras analisadas, 100% dos filhotes apresentaram anormalidades nucleares, com 47,9% apresentando micronúcleos, um tipo de alteração genética que indica danos cromossômicos.

As células com núcleos entalhados foram as mais comuns (44,6%), enquanto as células anucleadas, que indicam danos mais graves, foram as menos frequentes (2,8%). A frequência média de micronúcleos foi de 0,7 por cada 5.000 células analisadas, enquanto as outras anormalidades nucleares ocorreram em uma média de 22,5 por cada 5.000 células.

Médica veterinária, Maria Eduarda Monteiro Nascimento, durante monitoramento de ninho (Foto: Arquivo pessoal) 
Médica veterinária, Maria Eduarda Monteiro Nascimento, durante monitoramento de ninho (Foto: Arquivo pessoal)

O estudo mostrou que fatores ambientais, como a presença de áreas verdes e a intensidade do tráfego de veículos, foram determinantes na ocorrência de anormalidades nucleares.

"As áreas urbanas, com seu alto nível de poluição e urbanização, representam uma pressão significativa para a fauna local. A pesquisa nos permite afirmar que os filhotes de arara-canindé expostos a essas condições apresentam uma maior frequência de mutações genéticas", explica o artigo científico.

Além de alertar sobre os danos genotóxicos causados pela urbanização, o estudo sublinha a importância das áreas verdes como um recurso vital para a preservação da saúde genética das aves em ambientes urbanos. A pesquisa também sugere a necessidade de monitoramento contínuo dessas populações para entender melhor os impactos a longo prazo da poluição e da perda de habitat.

Momento da coleta de sangue de um dos filhotes de arara-canindé que foi usado na pesquisa (Foto: Arquivo pessoal) 
Momento da coleta de sangue de um dos filhotes de arara-canindé que foi usado na pesquisa (Foto: Arquivo pessoal)

Este é o primeiro estudo a documentar a presença de anormalidades nucleares em filhotes de araras-canindé nascidos em ambientes urbanos. O estudo faz um alerta para a importância da conservação das áreas verdes e da redução da poluição nas cidades, sugerindo que a arara-canindé pode servir como um biomonitor para a qualidade ambiental em áreas urbanas.

"É fundamental realizar mais análises, comparando populações de araras em áreas urbanas e naturais para entender melhor o impacto do ambiente nessas alterações genéticas. Além disso, precisamos investigar os efeitos a longo prazo dessas anormalidades na sobrevivência e na reprodução das aves, bem como identificar quais poluentes específicos estão associados a esses danos. Os resultados deste estudo destacam a importância das áreas verdes urbanas e a necessidade de monitorar e quantificar os danos genotóxicos nas aves", concluiu uma das pesquisadoras, Maria Eduarda.

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