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Meio Ambiente

Investigada, fazenda perdeu pouco em queima científica e 85% com "fogo vizinho"

Queima feita por pesquisadores foi controlada 20 dias antes de novas chamas afetarem quase toda a propriedade

Por Cassia Modena | 04/07/2024 12:05
Treinamento para participantes de pesquisa que tenta entender efeitos do fogo na fauna e flora do Pantanal (Foto: Divulgação/Alicce Rodrigues/Nefal)
Treinamento para participantes de pesquisa que tenta entender efeitos do fogo na fauna e flora do Pantanal (Foto: Divulgação/Alicce Rodrigues/Nefal)

Em 10 de maio deste ano, início do período de seca para o Pantanal, pesquisadores da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) começavam mais uma queima autorizada para fins científicos, quando o fogo saiu do controle. As chamas se espalharam rapidamente pela vegetação da Fazenda Campo Enepê, em Corumbá.

Foi a primeira vez em três anos de pesquisa que algo assim acontece, afirmou o professor Geraldo Damasceno, que coordena o Nefal (Núcleo de Estudos do Fogo em Áreas Úmidas) da universidade para entender efeitos do fogo no bioma. "Naquele dia, a direção dos ventos mudou", conta.

No relatório enviado ao Imasul (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul) no mês seguinte, ele detalhou que os aceiros (corredores sem vegetação) da fazenda não conseguiram deter o fogo, como era previsto.

Exemplo de como é feita a queima prescrita científica pelo núcleo de pesquisa da UFMS (Foto: Divulgação/Alexandre Pereira/Nefal)
Exemplo de como é feita a queima prescrita científica pelo núcleo de pesquisa da UFMS (Foto: Divulgação/Alexandre Pereira/Nefal)

O professor explica que todas as queimadas são feitas em áreas emprestadas por proprietários e acompanhadas por equipe do Corpo de Bombeiros e do PrevFogo do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente). Quando o incidente começou, teve que pedir reforço.

"As equipes permaneceram combatendo durante a madrugada do dia 11 de maio até a situação se tornar menos crítica. Esse fogo foi combatido durante os dias 12 e 13 de maio com auxílio de aeronave e com o apoio de equipe em terra e, dessa forma, no fim da tarde do dia 13, decretou-se fogo extinto", diz em trecho do relatório.

Em 31 de maio, o fogo reapareceu. "Provavelmente ocorreu por conta de alguma árvore que tenha ficado incandescente ou por presença de turfeira (material orgânico) no local", sugere Damasceno também no relatório. O Corpo de Bombeiros informou ao núcleo que o trabalho chegou ao fim em 5 de junho.

"Fogo vizinho" - A área afetada somente na Enepê foi de 163,15 hectares. Como se diz no Pantanal, o professor Geraldo descreve que o fogo acabou "pulando" para outra propriedade, a Retiro da Onça, onde atingiu mais 24,35 hectares. A queima científica afetou 138,8 hectares.

A perda de quase a mesma quantidade de hectares (161) na primeira fazenda é investigada pelo Ministério Público Estadual. O proprietário, Rubens Vedovato de Albres, reforça que a atividade científica foi autorizada pelo Imasul e diz não entender o motivo de inquérito ser aberto em relação a isso.

A área afetada na Fazenda Enepê somente pelo fogo que começou em maio (Foto: Reprodução/MPMS)
A área afetada na Fazenda Enepê somente pelo fogo que começou em maio (Foto: Reprodução/MPMS)

O prejuízo para as duas fazendas não foi nada perto do que viria depois. O fazendeiro afirma que, após 20 dias, "cerca de 85% da Enepê foi varrida pelo fogo". Ele e Damasceno frisam que não se trata de nada relacionado à pesquisa do Nefal.

Rubens esclarece que as novas chamas vieram de outra direção, de fazendas vizinhas, e atingiram proporções muito maiores do que o incidente com a queima científica.

"Um fogo 'inconsolável' parecido com um lança-chamas que veio desde lá do Paraguai-Mirim e foi 'caminhando' por fazendas vizinhas até chegar à minha. Não sei qual a origem. Nós, fazendeiros, não temos interesse, não somos loucos de colocar fogo na época de seca para ter esse prejuízo enorme que eu tive", relata.


Foram perdidos aproximadamente 2,5 mil hectares de vegetação da Enepê. As cercas foram destruídas, postes foram queimados e agora falta pasto para o gado, que teve que ser deslocado porque estava passando fome, continua Albres.

Sob investigação - Rubens é um dos 11 investigados que deverá prestar contas ao Ministério Público sobre a área queimada vista na regressão de imagens de satélites. Ao todo, eles vão responder pela perda de mais de 400 mil hectares.

O que responderá pela maior área (33,2 mil hectares) incendiada é Luiz Gustavo Battaglin Maciel, advogado que ficou conhecido por ser um dos defensores contratados pelo narcotraficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar. Ele é dono da Fazenda Astúrias, também em Corumbá.

À reportagem, justificou ontem que foi vítima do fogo e não o culpado, por meio dos advogados Jail Benites de Azambuja e Sérgio Henrique Resende Lanzone. Eles representarão o colega de profissão no dia em que tiver que prestar esclarecimentos ao Ministério Público Estadual.

“A defesa de Luiz Gustavo Battaglin Maciel vem esclarecer, a propósito de inquérito civil instaurado pela 2ª Promotoria de Justiça de Corumbá (MS), que não consta, no mencionado inquérito, pelo que a defesa teve acesso até este momento, qualquer acusação ou suspeita de que tenha ocorrido irregularidade jurídico-ambiental na Fazenda Astúrias, em Corumbá/MS, tratando de averiguação preliminar”, dizem em nota.

Outro nome na lista é a Fazenda Santa, que pertence à família do ex-presidente do Banco Itaú, Candido Bracher. Em 2020 e 2021, a propriedade também registrou grandes incêndios, conforme publicou a agência Repórter Brasil. No ano mais recente, a administradora, Teresa Bracher, afirmou ao portal que o fogo começou fora da fazenda, que tem quase toda a área destinada à preservação ambiental. O Campo Grande News tenta falar com ela e com os outros nove fazendeiros investigados.

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