Pouca chuva em pontos cruciais dita 3º ano sem pulso das águas no Rio Paraguai
Não existe quantidade suficiente de água para grande cheia em 2021
“Agora penso nas águas do Pantanal, nos nossos rios infantis, que ainda procuram declives para correr” (Manoel de Barros)
Principal curso de água do Pantanal, o Rio Paraguai deve seguir pelo terceiro ano consecutivo com cheia abaixo da média, ou seja sem o pulso das águas capaz de inundar a planície.
Conforme pesquisadores, o prognóstico se explica porque não há chuva farta no Mato Grosso, onde nasce o rio que em 2019 registrou o menor índice em 50 anos. No Mato Grosso do Sul, seria preciso grande volume pluviométrico nas regiões acima de Ladário, onde correm os principais tributários do Rio Paraguai.
Desta forma, apesar de Corumbá, no Pantanal, registrar chuva acima da média em janeiro e o Rio Nioaque ter subido nove metros, resultado de precipitação inédita de 523 milímetros em menos de um mês, toda essa água não traz grande impacto para o principal rio que cruza o Pantanal.
“Janeiro foi um mês com chuva acima da média aqui em Corumbá. Mas nas estações do Mato Grosso, em Cáceres e Cuiabá, todos os rios estão abaixo da média. Como a maior parte [das águas] vem do Pantanal Norte, esse conjunto de informações nos diz que a cheia vai ser abaixo da média. Não existe quantidade suficiente de água para grande cheia”, afirma o biólogo Carlos Padovani, que é pesquisador da Embrapa Pantanal e acompanha as águas do Rio Paraguai desde 2013.
Quando há previsão de grande cheia, o monitoramento resulta em alerta para retirada do gado, a principal atividade econômica, e também aos ribeirinhos. No entanto, neste ano não há previsão de que será necessário abrir caminho para a inundação,
Se inundar, vai ser em área próxima ao rio. Onde tem pouca atividade de gado e as pessoas já tem experiência com essa inundação”, afirma Padovani.
O pesquisador da Embrapa Pantanal explica que os afluentes determinante para a cheia do Rio Paraguai são o Cuiabá, São Lourenço, Piquiri, Itiquira e Correntes. “O Rio Taquari mudou de curso e também está jogando parte de suas águas. Mas não se sabe a quantidade que chega no Paraguai, o que requer estudos”, diz Padovani.
O terceiro ano seguido sem grande inundação no Pantanal não significa que esse será o “novo normal” do Rio Paraguai e nem que o rio está secando. A situação é determinada pelo baixo índice pluviométrico.
“Enquanto tiver chuva e água subterrânea, vai ter rios”, afirma Padovani. Já a profundidade do rio, caminho para exportação de minério e soja, vem diminuindo por conta de processo de assoreamento.
Depois de um 2019 em que vivenciamos o “Pantanal em chamas”, com a fuligem viajando pelo País, também não é possível cravar que uma grande cheia resultaria na recuperação da vegetação.
“A cheia tem o papel de renovação de pastagens. Tem esse lado positivo de fertilizar e é importante que tenha cheia de vez em quando. Mas a queima também libera nutrientes para o solo. Cada uma tem sua características e ciclos naturais”, diz Padovani.
A lição do passado – Na década de 1960, o Pantanal passou quase cinco anos sem grande inundação e as áreas secas começaram a ser ocupadas. Na década seguinte, veio a cheia de 1974, expulsando pessoas e animais. “ É perigoso ocupar áreas porque, de repente, vai ter que sair de lá. O rio não é só a calha dele”.
No retrospecto desde 1900, a maior cheia do Rio Paraguai foi em 14 de julho de 1988, quando chegou a 6,64 metros. As grandes inundações do Pantanal também aconteceram em 1905, 1982 e 1995.
Na série histórica, foram 30 anos de cheia entre 5 metros e 5m50, ocorridas entre maio e junho.
O Serviço Geológico do Brasil tem prognóstico que o pico da cheia em Ladário chegue a 2,86 metros, bem abaixo dos quatros metros que leva a inundação.
“Tem chovido bastante em Corumbá, mas a bacia do Rio Paraguai é muito grande. Outro fator é que no ano passado a seca foi muito severa. Precisava de chuva generalizada em vários locais para ter recuperação mais efetiva”, afirma Marcus Suassuna, pesquisador em geociências. Suassuna também destaca que os cenários se alternam no Pantanal
Nas décadas de 60 e 70, acharam que o rio secou e pronto, que seria o novo normal. Mas em 1974, a chuva veio bastante forte, o rio voltou ao normal e o impacto é bastante significativo, muito marcante”, diz Suassuna.