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Multiparentalidade biológica

Laura Affonso da Costa Levy e Melissa Telles Barufi (*) | 04/06/2023 08:30

As técnicas de reprodução humana assistida não são novidades no mundo da ciência, mas estão sendo cada vez mais utilizadas na concretização do sonho da filiação. O avanço da Medicina é tamanho que nos permite a existência de uma multiparentalidade biológica. Assim, se antes estávamos acostumados a trabalhar com a multiparentalidade socioafetiva, por meio da construção de laços de afeto, hoje contamos com a multiplicidade de materiais genéticos na formação do projeto parental.

Existem distintas formas de haver material genético de mais duas pessoas na formação do ser humano, haja vista a existência de gestação por útero em substituição, ou mesmo a realização de transplante de útero, com casos de sucesso nos nascimentos desde 2014. Em tais técnicas, há troca de material genético entre mãe gestacional e bebê, assim como entre o útero transplantado (e sua carga genética) e o bebê.

Porém, situação mais vanguardista é do nascimento de um bebê com DNA de três pessoas, ante a realização da reprodução assistida com uso da técnica de tratamento de doação mitocondrial (MDT).

Para realizar o procedimento, os pesquisadores utilizaram dois óvulos: o da mãe original e o de uma doadora saudável. Eles retiram o núcleo do óvulo da mãe, portanto, sem as mitocôndrias, já que elas não ficam no núcleo, e reservam. Com o óvulo da doadora é feito o mesmo, mas o conteúdo retirado é destruído, sobrando apenas o óvulo com as mitocôndrias saudáveis.

É inserido, então, o núcleo retirado do óvulo da mãe no óvulo da doadora. Esse óvulo, contendo material genético do pai e da mãe originais e mitocôndrias saudáveis da doadora, é implantado no útero da mãe. Como as mitocôndrias possuem seu próprio material genético, o bebê também herdará parte do DNA da doadora.

A técnica tem o objetivo de impedir que o bebê herde algumas doenças genéticas incuráveis, transmitidas pelo DNA mitocondrial. Atualmente, são conhecidos apenas 5 casos que fizeram uso da técnica, sendo que o primeiro bebê a nascer a partir do DNA de três pessoas foi registrado no México, em 2016.

É importante ressaltar, contudo, que a doadora deve permanecer anônima e não existe, no Brasil, legislação que trabalhe com a temática, sendo utilizada a orientação ética e deontológica das Resoluções do CFM para dirimir as questões provenientes da reprodução humana medicamente assistida.

A Resolução em vigor hoje é de nº 2320/2022, que permite a concretização do projeto familiar de distintas formas. Contudo, em breve poderemos estar diante de casos de reconhecimento de multiparentalidade biológica, sendo necessário o aperfeiçoamento profissional do advogado para lidar com a temática.

Sendo a Bioética a ciência que auxilia para orientação e solução de eventuais conflitos éticos e jurídicos sobre o tema, faz-se crucial o estudo de forma transversal ao Direito para que possamos acompanhar os avanços da ciência e garantir os direitos oriundos das novas filiações.

(*) Laura Affonso da Costa Levy é mestre em bioética e advogada familiarista.

(*) Melissa Telles Barufi é advogada familiarista e presidente Instituto Proteger.

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