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Nudes, desinformação e fake news

Por Thaïs de Mendonça Jorge (*) | 23/11/2023 14:41

No início de novembro, 25 alunas de um colégio no Rio de Janeiro foram vítimas de nudes falsificados. As fotomontagens delas foram difundidas nas redes sociais e o alcance só não foi maior porque um aluno - apenas um - denunciou a manipulação. Isto pode ser classificado como fake news?

A expressão “notícias falsas” é um oxímoro, ou seja, uma palavra contradiz a outra. Se é notícia, não pode ser falsa. Se é falsa, não é notícia. “Notícias” significam informações verificáveis de interesse público, e as informações que não atendem a esses padrões não merecem o rótulo de notícias.

A "brincadeira" ou a manipulação da imagem - no colégio carioca, assim como em outras situações recentes envolvendo pessoas famosas - constitui um ato de fraude: uma categoria particular de informação falsa em formas cada vez mais diversas de desinformação, inclusive em formatos de entretenimento como memes visuais.

O termo “informação incorreta” se refere a informações enganosas criadas ou disseminadas sem intenção manipuladora ou maliciosa. Pode ser a minha tia replicando um vídeo do avanço da maré na praia de Copacabana incrementado com imagens do tsunami na Ásia. Tanto a desinformação proposital como a informação incorreta são problemas para a sociedade, porém a desinformação é particularmente perigosa pois é elaborada por pessoas, valendo-se de tecnologia automatizada capaz de chegar aos rincões mais distantes deste planeta.

Trata-se de um terreno perigoso e pantanoso porque as falsas notícias divulgadas costumam ser gratuitas: usuários que não podem pagar por jornalismo de qualidade ou que não têm acesso a meios de comunicação independentes são especialmente vulneráveis à desinformação e informação incorreta.

Dentro desse ecossistema que evolui com rapidez sem que tenhamos controle, o papel dos jornalistas e dos meios de comunicação é relevante. Estamos em meio a uma guerra. Tão sangrenta quanto a da Ucrânia ou a da Faixa de Gaza. Esta guerra também provoca mortes: só no Brasil foram mais de 700 mil as vítimas da pandemia de Covid-19, parte delas devido à desinformação, mentira e ignorância.

A consequência de tudo o que está acontecendo vai além: um descrédito nas instituições e na própria existência fora do digital. Foi talvez por isso, pela naturalização do que é fake - pelo uso do deep fake, da inteligência artificial incorporada ao cotidiano - que os meninos do colégio católico do Rio de Janeiro acharam "normal" a disseminação das imagens de suas colegas.

A desinformação e a informação incorreta são diferentes do jornalismo de qualidade, que cumpre com a ética e normas profissionais. Ao mesmo tempo, esse fenômeno também é diferentes dos casos de jornalismo ruim. O mau jornalismo inclui, por exemplo, erros contínuos sem correção, derivados de pesquisa e verificação malfeitas ou displicentes.

Aqui se inclui a sensacionalização, que exagera para causar impacto, o jornalismo de superlativos, o apelo às chamadas "emoções baratas", item que chegou à internet como gênero: o clickbait ou caça-clique.

Há a necessidade de um jornalismo sério e ético como antídoto à desordem da informação e o efeito indireto da degradação de notícias, o que atinge a credibilidade dos jornalistas e das notícias. Com as campanhas de políticos e autoridades contra os conteúdos da mídia, a consequência nefasta é que o público venha a descrer de todo tipo de conteúdo – incluindo o jornalismo - ou que acredite apenas em informações veiculadas pelas redes sociais e que se assemelhe aos seus sentimentos.

O jornalismo precisa se antecipar na denúncia da desinformação. Assim como a academia, precisamos ser proativos para revelar tipos de desinformação, máquinas de desinformação e os meandros delas. Precisamos estudá-las, conhecê-las para poder dominá-las. Isto, somado à educação formal qualificada e à alfabetização midiática, ao capacitar o público a distinguir o que é notícia e desinformação, pode prevenir males maiores.

(*) Thaïs de Mendonça Jorge é professora do Departamento de Jornalismo (FAC) e foi Secretária de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB).

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