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Onde estão os seus minutos de sabedoria?

Cristina Ayoub Riche (*) | 28/09/2020 12:53

A pandemia do coronavírus tirou o mundo inteiro dos eixos, vivemos uma crise humanitária e civilizatória. No Brasil, avançamos para mais um mês de enfrentamento à doença, praticando um isolamento social desorganizado, com efeitos sociais e econômicos graves, número de mortes acima do esperado e um estado contínuo de luto, de inquietude ou de medo da morte.

Vivemos um momento de saúde mental coletiva fragilizada. Alguns estão tensos, outros estão amedrontados e paralisados, há os que não se questionam e deixam a vida os levarem para onde for, outros estão à procura de conhecimento e sabedoria para enfrentarem seus medos e frustrações.

Responder a esses novos desafios exige serenidade, mesmo que o futuro seja incerto. Nesse sentido, é importante termos nossos momentos particulares de busca de respostas e reflexões para seguirmos em frente. Buscar a resposta na literatura e na filosofia pode ser uma oportunidade de trabalharmos nosso corpo e espírito.

Muita gente deve lembrar de um livrinho chamado "Minutos de sabedoria", de autoria de Carlos Torres Pastorino. Lançada em 1960, a publicação de bolso é um best-seller hoje encontrado em qualquer loja virtual. Lembro de, ainda adolescente, ter recebido como presente de meu pai. O livro aconselhava que todo dia o leitor escolhesse uma folha ao acaso e se inspirasse naquela sabedoria para viver o dia, para refletir sobre as ações e buscar melhorar como pessoa.

Com ele, comecei a me dar conta que abrir ao acaso as suas folhinhas e me deter a uma leitura reflexiva sobre qualquer tema que ali aparecia, estava me ajudando a aprimorar o meu olhar sobre a vida, a buscar compreender melhor os outros e o mundo que me cerca. "O momento presente é o criador de seu amanhã. Sua felicidade está baseada em seus pensamentos de hoje", dizia um trecho.

O teólogo Leonardo Boff escreveu sobre a semelhança entre as vidas de dois pensadores que viveram no Século 13: São Francisco de Assis, na Itália, e Jalâl ad-Dîn Rûmî, no atual Afeganistão. Na relação com Deus, ambos praticavam um amor ao próximo sem limites. Eles são verdadeiros exemplos para aplicarmos hoje na nossa relação com os outros, principalmente, quando observamos que, na pandemia, as nossas práticas de prevenção são atos de amor ao próximo. Usar máscara, lavar as mãos e praticar o afastamento social salvam vidas.

O mito grego de Sísifo conta a história de um homem que fora castigado pelos deuses porque os desafiou com sua inteligência, e a ele foi imposto o castigo de cotidianamente carregar uma pedra ao cume da montanha e com ela retornar, num eterno subir e descer.

Essa história é emblemática porque traz a reflexão sobre a nossa disponibilidade em sempre recomeçar, renascer, reconstruir. Esta não é a primeira vez que passamos por uma crise e, certamente, não será a última. Por isso, precisamos lidar com o desafio de criar pontes com as pessoas, com o meio ambiente, com o mundo, unir os extremos. E você, ao lidar com tudo isso, onde estão os seus minutos de sabedoria?

(*) Cristina Ayoub Riche é professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

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