Terapia ocupacional e o câncer de mama
O câncer é o principal problema de saúde pública no mundo e já está entre as quatro principais causas de morte prematura (antes dos 70 anos de idade) na maioria dos países. A incidência e a mortalidade por câncer vêm aumentando no mundo, em parte pelo envelhecimento, pelo crescimento populacional, como também pela mudança na distribuição e na prevalência dos fatores de risco de câncer, especialmente aos associados ao desenvolvimento socioeconômico (INCA, 2019).
Sem considerar os tumores de pele não melanoma, o câncer de mama feminina ocupa a primeira posição mais frequente em todas as Regiões brasileiras. Para o Brasil, a estimativa para cada ano do triênio 2020-2022 aponta que ocorrerão 625 mil casos novos de câncer (450 mil, excluindo os casos de câncer de pele não melanoma). O cálculo global corrigido para o sub-registro, segundo MATHERS et al. (2003), aponta a ocorrência de 685 mil casos novos. Nas mulheres, exceto o câncer de pele não melanoma, os cânceres de mama representam 29,7%; 9,2% do cólon e reto; 7,4% de colo do útero; 5,6% de pulmão e 5,4% de tireoide. (BRAY et al., 2018). Estimam-se que 66.280 casos novos de câncer de mama, para cada ano do triênio 2020-2022. Independentemente da condição socioeconômica do país, a incidência desse câncer se configura entre as primeiras posições das neoplasias malignas femininas (INCA, 2019).
Não existe somente um fator de risco para câncer de mama, no entanto a idade acima dos 50 anos é considerada o mais importante. Outros fatores que contribuem para o aumento do risco de desenvolver a doença são: fatores genéticos, fatores hereditários, além da menopausa tardia (fatores da história reprodutiva e hormonal), obesidade, sedentarismo e exposições frequentes a radiações ionizantes (fatores ambientais e comportamentais) (INCA, 2019).
O tratamento dependendo da gravidade da neoplasia e diversificam entre opções terapêuticas como: as sessões de radioterapia, quimioterapia, hormonioterapia e a cirurgia, que variam na retirada de partes às intervenções cirúrgicas radicais, com perda total da mama. O tratamento será definido pela equipe médica levando em consideração o diagnóstico, estadiamento, o melhor tratamento para o tipo de câncer e para sujeito (FANGEL, L.M. V, CARDOSO, R.C, 2018).
Os procedimentos terapêuticos e a hospitalização de pacientes oncológicos, acarretam mudanças na organização do cotidiano do indivíduo e de seus familiares, mudanças corporais, e podem acarretar dependência definitiva ou não no desempenho de suas ocupações (FANGEL, L.M. V, CARDOSO, R.C, 2018). Essas mulheres adquirem perdas ocupacionais significativas, sendo de fundamental importância a ação da terapia ocupacional na busca de possibilidades para o enfrentamento da doença e tratamento.
A terapia ocupacional (TO) é um campo do conhecimento e de intervenção em saúde, educação e na esfera social, tendo como foco principal as atividades cotidianas e ocupações, buscando a emancipação e autonomia de pessoas que, por razões ligadas a problemáticas específicas, físicas, sensórias, mentais, psicológicas e/ou sócias, apresentam temporariamente ou definitivamente dificuldade na inserção e participação na vida social (Ribeiro et al, 2018).
O conceito de desempenho ocupacional está associado a capacidade do indivíduo em realizar ocupações selecionadas que ocorrem em um contexto e são influenciadas pela interação entre fatores de clientes, habilidades de desempenho e padrões de desempenho. Ocupações ocorrem ao longo do tempo; têm um propósito, significado e utilidade percebida pelo cliente. A Associação Americana de Terapia Ocupacional (AOTA, 2015), identifica uma ampla gama de ocupações classificadas como atividades de vida diária (AVD), atividades instrumentais de vida diária (AIVD), descanso e sono, educação, trabalho, brincar lazer e participação social (AOTA, 2015).
Neste sentido, a TO visa melhorar o estado funcional, diminuir o risco de queda, melhorar o desempenho na participação de atividades e melhorar a qualidade de vida geral, sendo de grande importância a sua atuação de acordo com as necessidades dos pacientes. As intervenções também podem melhorar a satisfação e a participação nos papéis de vida, no controle da dor e, em geral, a saúde mental, em curto e longo prazo, com resultados eficazes. Intervindo no cotidiano e nas dificuldades relatadas por essas mulheres, a terapia ocupacional trabalha reestruturando essa qualidade de vida, a qual é sabido ser fator fundamental e o que se busca em oncologia (Ribeiro et al, 2018)..
Com base em seu saber técnico científico, o TO traça orientações e adaptações para as atividades de vida diária – AVD, e para as atividades instrumentais de vida diária - AIVDs, orientação e suporte familiar, treinos para mudança de decúbito, estímulo à independência e autonomia, orientações para automassagem e técnicas de conservação de energia (Ribeiro et al, 2018)..
O processo terapêutico ocupacional se inicia por meio da avaliação de demandas e modificações das atividades cotidianas e ocupacionais do sujeito. Com base nos resultados do processo avaliativo o terapeuta ocupacional pode utilizar diversos recursos e estratégias para a reabilitação do declínio funcional de pacientes com câncer. Dentre eles, destacam-se exercícios e atividades funcionais que buscam a melhora da amplitude de movimento do membro acometido mas, também, a adaptação de ambientes e atividades, por meio de tecnologias assistivas de baixo e alto custo, como, por exemplo, o uso de engrossadores de talheres para pacientes que perderam temporariamente ou definitivamente a capacidade de realizar diferentes preensões com as mãos, processo que permite independência ao paciente no momento da alimentação e dos cuidados pessoais (Ribeiro et al, 2018)..
Dentre as intervenções realizadas pela TO, destaca-se: no risco de queda; comprometimento da função cognitiva; fadiga relacionada ao câncer; linfedemas; neuropatia periférica induzida por quimioterapia; retorno ao trabalho, e como mencionadas anteriormente, déficits funcionais e treino de AVD.
Assim, a abordagem do terapeuta ocupacional, inserido na equipe multidisciplinar, considerando sua visão singular do cuidado em saúde, possibilita às mulheres com câncer de mama um retorno precoce às atividades significativas, resgate da autoestima e reorganização de seus papéis ocupacionais.
(*) Yara Helena de Carvalho Paiva é graduada em Terapia Ocupacional (UFMG), mestrado em Psicologia (UnB). Possui especialização em Saúde do Idosos e Preceptoria no SUS (UnB) e experiência em Reabilitação Física e Cognitiva.