Tome decisões baseadas em fatos, não opiniões. Vacine-se!
Claro que, com mais dados, outras associações podem surgir e até invalidar o que antes foi visto nos diversos estudos epidemiológicos. É assim a ciência. Nas discussões científicas, seja em congressos ou via redes sociais, o contraditório é bem-vindo e ajuda a impulsionar a ciência na direção da verdade, contanto que os dois lados da discussão sejam permeáveis à argumentação com dados. Enquanto os dados continuam confirmando esta associação, é melhor manter o uso de filtro solar.
Em breve, a pandemia de covid-19 completará seu segundo aniversário. A carência de dados no início da pandemia fez as discussões perderem rigor científico. Sabíamos pouco sobre o vírus, como ele se propagava e o que era importante para contê-lo. A maioria dos argumentos não era suportada por dados robustos, populacionais. A angústia legítima da sociedade em saber o que fazer, aliada à imprensa que disputava por notícias, fez com que muitos confundissem opiniões com fatos. Opiniões são argumentos pouco eficazes na ciência. William Edwards Deming, um famoso estatístico, costumava ilustrar essa ideia com uma frase célebre: “In God we trust, all others must bring data” (Em Deus nós confiamos, todos os outros devem trazer dados).
Dentre os debates mais acalorados sobre como lidar com a pandemia, o debate sobre a necessidade de vacinação é, talvez, o mais importante. Justamente elas, que já salvaram mais vidas no passado do que usar filtro solar. As vacinas contra covid-19 foram desenvolvidas e testadas em tempo recorde, e isso naturalmente desperta ansiedade e dúvidas quanto à sua segurança e eficácia. Já está bastante claro que as vacinas contra covid-19, assim como as outras vacinas aprovadas para uso humano, são muito seguras. A frequência de efeitos adversos graves em vacinados é extremamente baixa. Quanto à eficácia, os testes clínicos mostraram alta proteção contra morte por covid-19 entre os vacinados. Entretanto, talvez na sua opinião os dados publicados por estes testes não foram convincentes, e é por isso que você decidiu não se vacinar até agora. Tomara que uma quantidade muito maior de dados, dessa vez em populações de dezenas de países, possa te ajudar a mudar de ideia. Depois de quase dois anos de pandemia, podemos argumentar com dados, não opiniões, e eles devem servir para tomarmos decisões mais racionais.
Será que há menos mortes por covid-19 nos países mais vacinados do que nos países onde faltam vacinas, ou que parte grande da população não se vacinou? Para responder a essa pergunta, usamos os dados do site Our World in Data, que reúne informação de casos e mortes por covid-19 e de vacinação em mais de 200 países. Usamos essa quantidade impressionante de dados para comparar o número de mortes por covid-19 por milhão de habitantes com a porcentagem da população totalmente vacinada em vários países. Focamos apenas nos 85 países onde o vírus circulou recentemente, causando mais de 500 casos de covid-19 por milhão de habitantes, ou seja, onde o vírus poderia causar mortes.
Nossa hipótese era que nos países com maior índice de vacinação ocorreram menos mortes por covid-19. Foi exatamente o que observamos (veja na figura a seguir). Há uma clara relação inversa entre número de mortes por milhão de habitantes e a taxa de vacinação. Ou seja, quanto maior a fração da população vacinada, menor o número de mortes. São dados com um número amostral grande, em países onde o vírus circulou no período analisado, mostrando que as vacinas estão salvando vidas. Não é mais uma questão de opinião. A vacinação é a única salvação, o único jeito de superarmos de vez essa crise. Se você ainda não se vacinou, reflita sobre esses dados.
No gráfico, cada bolinha representa um país. As bolinhas mais para a direita representam países com maior número de mortes por milhão de habitantes no período analisado. Quanto mais para a esquerda, menos mortes. As bolinhas mais para cima representam países com maiores taxas de vacinação. Quanto mais para baixo, menos vacinados. A linha representa uma tendência que leva em consideração os dados de todas as bolinhas.
(*) Daniel Bargieri é professor do Instituto de Ciências Biomédicas da USP.
(*) Helder Nakaya é pesquisador sênior do Hospital Israelita Albert Einstein.
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