Um novo modelo de desenvolvimento baseado na pequena empresa
Apesar de a taxa de desemprego na Europa estar próxima a 7%, na Alemanha ela é muito mais baixa e não atinge nem 3% dos trabalhadores. Uma das principais razões para isso está no fato de a economia alemã ser fortemente baseada na pequena empresa. Para se ter uma ideia, as pequenas empresas na Alemanha respondem por 68% do PIB daquele país. No Brasil, elas não atingem sequer 30% do nosso Produto Interno Bruto. Durante a pandemia, a prioridade máxima da então primeira-ministra Angela Markel foi a de proteger as pequenas empresas, para que elas não quebrassem. Até uma mesada especial de sobrevivência foi criada com esse fim, e com isso elas passaram muito bem pela pandemia e pela crise subsequente.
O Brasil deveria prestar mais atenção nos países que tem seu foco na pequena empresa, principalmente porque daqui para frente a grande empresa gerará muito menos emprego do que no passado. Isso foi dito por um dos economistas mais importantes do mundo, Dani Rodrick, recentemente em entrevista ao Estadão. Segundo Rodrick, as empresas grandes estão se automatizando maciçamente porque houve um barateamento nos equipamentos e máquinas, como por exemplo os robôs. Só em 2022, foram vendidos meio milhão dessas máquinas. Mas este barateamento ainda não é suficiente para estimular as pequenas empresas a comprar esse tipo de equipamento, por isso seguem contratando seres humanos como trabalhadores.
Os robôs estão chegando ao Brasil, mas em ritmo ainda lento. E há mais de meio ano, cerca de 80% dos novos empregos criados no Brasil vieram da pequena empresa. Ou seja, está na hora de pensarmos em um modelo de desenvolvimento voltado para a pequena empresa, uma vez que ela já é responsável pela quase totalidade dos empregos que precisamos. Mas, ao contrário de praticamente todos os países desenvolvidos, não fazemos nada pelas pequenas empresas. Eventualmente, cria-se uma linha de crédito, raramente subsidiada, ou se concede alguma isenção fiscal como o Simples. E só. Nada de políticas públicas.
Apenas para dar um exemplo de como políticas públicas são importantes, basta comparar as exportações italianas com as brasileiras. Enquanto na Itália, 53% das exportações saem da pequena empresa, no Brasil elas não atingem nem 1%. A razão para a astronômica diferença está no fato de que a Itália criou mecanismos que estimulam as pequenas empresas a se unirem em consórcios com o objetivo de exportar.
No Brasil, raramente uma pequena empresa consegue inovar, enquanto em Israel, essa é a principal razão para o país ser considerado um dos mais inovadores do mundo. Como? As universidades israelenses são obrigadas a manter incubadoras de pequenas empresas que possam trabalhar em conjunto com as áreas de pesquisa existentes, principalmente nas faculdades de engenharia e medicina.
Ajudar a pequena empresa a exportar ou a inovar são exemplos de atuações governamentais muito comuns no exterior, feitas por meio de políticas públicas apropriadas. Infelizmente, esse tipo de ação praticamente inexiste no Brasil.
Nosso país conta hoje com cerca de 8,5 milhões de desempregados. Além disso, 10 milhões de jovens aproximadamente chegam ao mercado de trabalho todos os anos em busca de emprego. Ou seja, é enorme o número de novos empregos que precisamos gerar todos os anos. Não há saída melhor para atender a esta demanda gigantesca que estimular o empreendedorismo. Mas o empreendedorismo pressupõe pequenas empresas, e esta é a principal razão para que o país passe a dar mais atenção para este segmento.
(*) Paulo Feldmann é professor da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) da USP.