Apesar de recorde entre brancos, covid mata mais pardos, índios e pretos em MS
Levantamento do Campo Grande News mostra os números da doença em cada etnia de Mato Grosso do Sul
Apesar de ter infectado mais pessoas autodeclaradas brancas em Mato Grosso do Sul, a covid-19 é quase duas vezes mais letal entre a população parda, e proporcionalmente, também mata mais índios e pretos no Estado.
Os pardos detém maior taxa de mortes conforme levantamento feito pelo Campo Grande News, com base em dados divulgados pela SES (Secretaria Estadual de Saúde) até quinta-feira (27). Nesse grupo, a letalidade atingiu 2,37% na 35ª semana epidemiológica, encerrada ontem.
De acordo com o último censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 47% da população sul-mato-grossense se declara branca, enquanto 43% se considera parda. Mas apenas 1,23% dos brancos faleceram após contrair o coronavírus.
Já entre os índios, a taxa está em 2,11% e entre pretos fica em 1,51%.
O professor e pesquisador pela UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados) Adeir Archanjo da Motta, diz que a distância entre os grupos em relação a fatalidade pode ser maior. Segundo ele, há ainda um cenário de subnotificação da covid-19 entre populações indígenas, já que "muitos morrem de SRAG [Síndrome Respiratória Aguda Grave] não específica, e que já matou mais de 7,4 vezes no Estado". Esse casos acabam não entrando na contagem oficial do coronavírus.
Aqueles que, socialmente, têm mais acesso a recursos financeiros, também têm mais acesso a testes. Com a assistência de saúde e melhores diagnósticos, você consegue saber do que você está adoecendo, e prevenir que o contágio não seja na sua comunidade", explica.
Ele cita que o cenário não é "exclusividade" da covid-19. "Qualquer indicador de saúde vai chegar nas mesmas conclusões. É uma 'desigualdade social da saúde'. Onde você nasce determina quantos anos de vida vai ter e como vai ser sua saúde, como você vai viver, comer e adoecer. Isso não é uma 'prisão fechada', porque podemos mudar nossa realidade, mas o contexto influencia".
No início de agosto, o Estado chegou a ficar em primeira posição no ranking entre unidades federativas brasileiras na média móvel de mortes pela doença, conforme levantamento do consórcio de veículos de imprensa.
População indígena - Em 13 de maio, a SES reportou o primeiro caso da doença em aldeia indígena. Tratava-se de uma funcionária de frigorífico, de 35 anos, moradora de Dourados, a 233 quilômetros de Campo Grande. Em poucos mais de 30 dias depois, um indígena, de 59 anos, faleceu da doença no mesmo município.
O início da transmissão em Dourados já preocupava a Secretaria quanto aos povos indígenas, já que Dourados possui maior população deste grupo em Mato Grosso do Sul com mais de 17,3 mil indígenas.
Se levarmos em conta o mais recente Censo realizado pelo IBGE, cruzando a quantidade de mortes, é dentre os povos nativos de Mato Grosso do Sul que a doença possui maior mortalidade. Dentre os mais de 70 mil indígenas do Estado, que compõe cerca de 3% dos sul-mato-grossenses, já eram 51 mortes até sexta-feira (28).
Mortalidade X letalidade - Dois indicativos aparecem no detalhamento da covid. A mortalidade faz relação com o número total de moradores da etnia em mato Grosso do Sul. A letalidade diz respeito ao percentual que foi contaminado e morreu.
O segundo grupo mais afetado em taxa de mortalidade aqui no Estado é a população autodeclarada amarela. Dentre os quase 30 mil habitantes com origem asiática (cerca de 1,2% da população), 18 faleceram da covid-19.
Apesar disso, o grupo é o que possui menor taxa de letalidade - ou seja, maior quantidade de pessoas resistiram e se recuperaram da doença. Dentre os mais de 3 mil infectados, mais de 1,2 mil moram em Campo Grande.
Em um estado com “surtos epidêmicos”, conforme afirma a médica infectologista Mariana Corda, os epicentros se alteraram de acordo com que as semanas se passaram. Dourados chegou a ser o principal foco da doença - "posto" ocupado atualmente por Campo Grande.
Em Campo Grande e Corumbá, não há surtos específicos. O aumento é dado pela alta transmissão da doença, e a maioria das pessoas não sabe como pegou [coronavírus], ou pegou durante suas atividades habituais”, comenta a infectologista.