Após suspeita, diagnóstico de idosa que morreu com vírus demorou 9 dias
Houve demora na notificação, admitem integrantes da cadeia de atendimento, mas não mudaria tratamento
Embora a merendeira Eleuzi Silva Nascimento, de 64 anos, tivesse enfisema pulmonar, assim que ela deu entrada no Hospital da Cassems de Nova Andradina, no dia 16 de março, o alerta para o contágio com o coronavírus foi aceso. O teste, porém, não foi feito logo no início. Só 9 dias depois, a paciente foi diagnosticada com o a Covid-19 .
Nada mudaria o tratamento e talvez nem o resultado final - a morte da idosa -, dizem especialistas. Mas, a forma como lidar com a doente - que precisava de cuidados, mas também era transmissora da doença - poderia ser diferente. Tanto é que profissionais de saúde do hospital também contraíram o novo vírus.
O secretário de Saúde, Geraldo Resende, é enfático: “não adianta procurar culpados, nada devolverá a vida àquela senhora”.
Mariana Croda, médica infectologista da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) e integrante do COE (Comitê de Operações de Emergência) da SES (Secretaria de Estado de Saúde), complementa, explicando que sem a existência de um medicamento para tratar a paciente, ter o resultado do exame antes ou depois, não mudaria o quadro. “Essa é a evolução, de manhã o paciente está bem e à tarde, está entubado. Isso é coronavírus e a gente vai ter de aprender a lidar com esse tipo de paciente”.
Detalhes – De acordo com a Cassems, que administra os dois hospitais pelos quais Eleuzi passou, no dia 16 mesmo, a SES foi informada da suspeita. Os médicos desconfiaram porque havia o relato de que a paciente teve contato com as irmãs, recém-chegadas da Bélgica, país europeu. Mais tarde, uma das irmãs testou positivo para o vírus.
Em 17 de março, porém, a Vigilância Epidemiológica informou que a paciente “não preenchia os critérios de notificação vigentes”. Ainda não havia sido declarada a transmissão comunitária no Brasil – quando é impossível saber onde a pessoa teve contato com o vírus, confirmando, portanto, a circulação do mesmo naquela localidade.
Eleuzi ficou internada até o dia 23, apresentou melhora e teve alta. Ainda conforme os registros da Cassems, no dia 24, ela teve piora e voltou ao hospital. Só aí exames foram feitos. Não se sabe com quem ela teve contato com alguém neste intervalo.
Mariana Croda explica que os critérios para a realização dos testes são estabelecidos pelo Ministério da Saúde e que naquele momento, anterior à segunda internação, a paciente não se enquadrava. A idosa já tinha tido crises de falta de ar por causa do enfisema pulmonar. “Esse foi o fator confundidor”.
Cuidado sempre - A orientação para profissionais e unidades de saúde, porém, é tratar qualquer caso do tipo como potencial paciente de Covid-19 e tomar todas as precauções.
“Infelizmente será assim daqui para frente. Vamos ter muitos, a gente não quer, mas é uma doença com letalidade alta, uma doença ingrata”.
Piora – Consta nas anotações da Cassems, que no dia 25, Eleuzi, com insuficiência respiratória aguda, precisou ser transferida para o hospital de Dourados.
Em Nova Andradina não há leito de UTI (Unidade de Tratamento Intensivo). Até então, a paciente estava numa vaga semi-intensiva, de acordo com a entidade que administra o hospital, já usando respirador mecânico, diferente do que a SES havia divulgado mais cedo.
Veja como foi a chegada da paciente no Hospital da Cassems de Dourados:
O óbito da merendeira foi declarado às 12h30 de hoje, mas a causa exata da morte não foi divulgada.
Despedida - O corpo de Eleuzi saiu de Dourados no fim da tarde e será enterrado em Batayporã, cidade onde ela vivia e parte da família mora, sem velório, como medida para evitar mais contágios.
O Campo Grande News apurou que ela deixa duas filhas, uma delas mora na Bélgica, onde a tias estiveram, e a outra vive em Cuiabá, mas já estava no Estado para cuidar da mãe.
Exames – Geraldo Resende fez questão de dizer que Mato Grosso do Sul é um dos estados que mais rápido testa pacientes com suspeita de coronavírus. “O que eu posso dizer é que a hora que chega, em 48 horas estamos entregando o resultado. A equipe do Lacen [Laboratório Central de MS] tem trabalhando dia e noite, com muito sacrifício e muita devoção. Enquanto muitos laboratórios pelo País, têm 1 mil exames de suspeitos na fila, nós temos aqui somente 38. Está havendo compromisso”.