Fora do pacote de bondades, protesto de IPVA em cartório cresce 47% na pandemia
"Em vez de ir atrás de ladrão, ficam atrás de quem trabalha. Tenho 61 anos e uma família para cuidar", diz diarista
Enquanto quem foi multado por infração ambiental ou por ludibriar o consumidor ganhou refis de presente de Natal, o aumento de 47% em protestos de cartórios por débito no IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores) em Mato Grosso do Sul no ano da pandemia mostra o impacto nas finanças de quem não conseguiu benesses da administração pública.
Para regularizar a situação da motocicleta que usa para ir de casa em casa fazer faxina, uma diarista de 61 anos, que pediu para não ter o nome divulgado, precisou emprestar R$ 310 do sobrinho.
“Consegui pagar depois de um ano. Sorte que não passei em blitz. Em vez de ir atrás de ladrão, ficam atrás de quem trabalha. Tenho 61 anos e uma família para cuidar”, diz a diarista. Que depois de regularizar o documento da moto segue a sina de fugir das blitze por não ter CNH (Carteira Nacional de Habilitação).
“Estou sem trabalho agora, imagina pagar o IPVA”, afirma leitor que participou de enquete do Campo Grande News sobre a regularidade no pagamento do imposto.
De acordo com dados da PGE (Procuradoria-Geral do Estado), foram 79.891 títulos de cobrança de IPVA protestados em cartório em 2020. No ano de 2019, o total alcançou 53.651.
Passado o período de pagamento dos boletos do imposto lançado pela Sefaz (Secretaria Estadual de Fazenda), o débito já pode ser repassado para a procuradoria. Com o protesto em cartório, a pessoa fica com restrição no CPF (Cadastro de Pessoa Física), mais conhecido como “nome sujo”.
Segundo a procuradoria, houve aumento dos protestos porque o setor manteve o mesmo ritmo de trabalho na pandemia e foi formalizada ampliação de parceria com os cartórios e o Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil.
Protesto em cartório - No mês de maio, o deputado estadual Jamilson Name (sem partido) apresentou o projeto de lei para suspender por 90 dias o lançamento de restrição e o envio de débitos ao protesto em cartório pelo não pagamento do IPVA.
“No que diz respeito ao recolhimento de tributos, é patente e notório que diversos contribuintes sofrem, nos dias de isolamento social, com a medida e com a vedação ou diminuição da atividade econômica, razão pela qual passam a encontrar dificuldade no recolhimento de tributos”, informou o parlamentar na justificativa da proposta.
O projeto não prosperou na CCJR (Comissão de Constituição, Justiça e Redação), que em junho arquivou a proposta. A comissão é responsável por avaliar a constitucionalidade, legalidade e adequação regimental da proposta.
Com projeção de arrecadar R$ 890 milhões, o governo do Estado distribuiu 1,1 milhão de carnês do IPVA em 2021. O imposto é a segunda maior fonte de arrecadação tributária, atrás somente do ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
Segundo a Sefaz (Secretaria Estadual de Fazenda), não há previsão de refis para pagamento de IPVA atrasado. Neste ano, até o dia 29 de janeiro, a arrecadação foi de R$ 405 milhões. No ano passado, foram arrecadados R$ 320,3 milhões para a Receita Estadual e outros R$ 400,4 milhões repassados aos municípios
Sem IPVA, sem licenciamento – Quem não consegue pagar o imposto fica impedido de fazer licenciamento do veículo, que é obrigatório. Sem esse documento o carro vai apreendido, por exemplo, ao passar por blitz, e é recolhido ao pátio do Detran (Departamento Estadual de Trânsito).
Conforme o departamento, quase metade da frota de veículos de MS estava com o licenciamento em atraso em dezembro de 2020. Segundo tabela encaminhada à reportagem, a proporção era de 1,6 milhão de veículos e 969 mil licenciamentos em dezembro. Ou seja, 58% em dia. Mas em 2019, o cenário era pior, com apenas 51% dos veículos com o licenciamento pago em dia.
“O que resulta no recolhimento do veículo é a falta do licenciamento”, afirma o comandante do BPMTran (Batalhão de Polícia Militar de Trânsito), Waldomiro Vargas Júnior. No ano passado, 2.185 veículos foram recolhidos pelo batalhão em Campo Grande com o licenciamento vencido.
Enquete do Campo Grande News questionou se os leitores costumam deixar o pagamento do IPVA para depois? Dos participantes, 66% afirmam que pagam à vista, enquanto os demais atrasam a quitação do débito.
Refis da Pandemia – Com expectativa de recuperar R$ 750 milhões, o Refis da Pandemia (Programa de Recuperação de Créditos Fiscais) tem prazo de adesão e pagamento até o próximo dia 26.
O programa prevê até 95% de descontos das multas e dos juros, em dívidas de ICMS vencidas até 31 de julho de 2020. Ainda oferece opções de até 60 parcelas para pagamentos destes débitos.
Na mesma lei estão as formas “excepcionais” para empresas pagarem multas do Procon-MS, com desconto de 90% do valor no pagamento em parcela única, redução de 70% de 2 até 20 parcelas mensais e 50% (desconto) de 21 a 60 parcelas.
Ainda entraram nesta matéria parcelamento de multas da Iagro (Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal), Imasul (Instituto de Meio Ambiente de MS) e ITCD (Imposto sobre a Transmissão “Causa Mortis” e Doação de quaisquer bens ou direitos). (Matéria alterada às 11h40 para acréscimo de dados da Sefaz)