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Capital

A agonia da espera por radioterapia faz Sandra ver vida "escapar pelos dedos"

Paciente tem câncer em estágio avançado e espera radioterapia pelo SUS (Sistema Único de Saúde)

Natália Olliver | 20/03/2023 19:15
Sandra sofre com câncer que atinge os ossos e reduz mobilidade das pernas (Foto: Marcos Maluf)
Sandra sofre com câncer que atinge os ossos e reduz mobilidade das pernas (Foto: Marcos Maluf)

Na corrida contra o tempo, cada segundo de espera aumenta o sentimento de angústia para Sandra Aparecida Mariano, de 52 anos. A mulher luta contra tumores malignos nas pernas, fígado e baço há quase dois anos e fica com a sensação de que a vida está  "escapando pelos dedos" enquanto aguarda pelo início da radioterapia. Uma espera que segundo ela, começou em janeiro.

À reportagem, Sandra relata que a consulta marcada para o dia 23 de fevereiro no HU (Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian) foi cancelada sem justificativa e até agora não houve remarcação. Ela precisa começar a radioterapia para diminuir o tamanho dos tumores nas pernas e conseguir uma nova operação, a terceira de Sandra.

Devido ao câncer em estágio avançado (metástase), o médico responsável pelo caso ofereceu a radioterapia, em caráter de urgência, como uma última alternativa na luta contra a doença, já que o corpo de Sandra não responde mais às sessões de quimioterapia.

Ela tem dois tipos de câncer. Um na perna direita, que está localizado no fêmur e segundo o relato dos médicos, não há risco de se espalhar. O outro é na perna esquerda. Esse tumor recebe o nome de sarcoma de partes moles e atinge o quadríceps e parte posterior da coxa.

Faz três meses que definho dentro de casa, sem tomar nada, sem nenhum tipo de tratamento. Liga na Sesau e fala que agenda não foi aberta. Estou aqui esperando para morrer. Não tenho mais vida. Eu só queria o tratamento. Eu quero viver, não desisti”, desabafa Sandra.

O sarcoma foi descoberto em outubro de 2021. Ele apareceu como um caroço pequeno na coxa do tamanho de uma azeitona. Após alguns meses ela realizou um ultrassom que constatou o tumor maligno. “Achei que era caroço de gordura”.

Sandra realizou duas cirurgias para retirada do sarcoma (Foto: Macos Maluf)
Sandra realizou duas cirurgias para retirada do sarcoma (Foto: Macos Maluf)

O resultado não revelou apenas o sarcoma na perna esquerda, mas que as duas estavam comprometidas, cada uma com um tipo diferente de câncer. “O médico disse que um raio caiu duas vezes no mesmo lugar”, conta.

Vida - Sandra diz que antes da doença trabalhou por 10 anos como leiloeira e entrou com pedido de aposentadoria devido à situação grave de saúde. Ainda teve que enfrentar a perda de um dos filhos, há cinco anos. Ele tinha 21 anos e faleceu vítima de uma doença inflamatória, multissistêmica chamada sarcoidose, que ataca o organismo. Sandra é mãe de mais um filho, de 31 anos, e tem uma neta, Júlia Vitória, de 5.

Para Sandra eles são o motivo da esperança e da vontade em continuar viva. Por conta do estado de saúde, a avó lamenta não poder ver a neta, tampouco brincar com ela.

“Meu filho que faleceu me deixou uma neta e não tenho força pra brincar com ela, pra acompanhar. Ainda tenho meu filho mais velho. Não tem motivo maior do que esse pra uma mãe querer viver. Eu quero viver com a minha família, viver um pouco mais. Quero ter a chance de provar que milagre existe, porque a minha cura eu sei que só um milagre”.

Ela conta que faz tudo o que pode para se manter bem, como tomar sol, vitaminas e remédios que ajudam a manter a imunidade alta, assim como se alimentar bem. “Se você me falar pra comer telha que vou melhorar eu como. Estou esperando todo dia essa radioterapia”.

Sem tratamento, Sandra comenta do medo em descobrir novos tumores e que não fez mais nenhuma tomografia desde janeiro.

Um pouco tenho medo de fazer. No fundo tenho medo de descobrir mais. Então prefiro sofrer com as que eu tenho. Prefiro lutar com as que eu tenho".

Vaquinha - "Tenho medo do meu corpo não aguentar esperar". Por não conseguir agenda para realizar a radioterapia, amigos se juntaram e fizeram uma vaquinha virtual para ajudar Sandra e realizar o procedimento no particular. Até o momento foram arrecadados R$ 2.500 dos R$ 15 mil estipulados. “Não tem pra onde correr. Cada sessão de é de R$ 2 a R$ 3 mil. Queremos pelo menos começar”, diz. Quem puder ajudar pode contribuir por esse link.

Dificuldade - O marido, Everton Alex de Oliveira, de 46 anos, é caminhoneiro e destina boa parte do salário para compra de medicamentos da esposa e chamadas de carros de aplicativo para que ela possa ir e voltar do hospital, além dos exames particulares. O motorista ressaltou que a profissão exige que ele fique longe de casa alguns dias, o que dificulta a rotina de Sandra.

Everton precisa vender itens pessoais para ajudar esposa a pagar a radioterapia (Foto: Marcos Maluf)
Everton precisa vender itens pessoais para ajudar esposa a pagar a radioterapia (Foto: Marcos Maluf)

“Não é fácil, eu tenho que viajar, não posso parar de trabalhar. Meu trabalho eu fico uns 3 dias fora, é uma sorte e meu patrão tem me deixado mais em casa pra eu ficar mais em casa com ela. A gente se sente impotente!”. O casal está junto há 27 anos.

De acordo com Sandra, 70% das ressonâncias feitas foram pagas de maneira particular porque o Hospital Regional, onde recebeu atendimento médico, não tinha contraste.

Respostas - A Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) informou que aguarda a abertura da agenda de abril no HC (Hospital do Câncer Alfredo Abrão), referência no tratamento, para que seja iniciado o agendamento de Sandra.

A pasta também informou que os cancelamentos de consultas, exames ou realização de procedimentos no final do mês de fevereiro são reflexo da paralisação do corpo técnico do HC. “Em reunião, ficou acordado que o próprio hospital absorveria os pacientes que estavam referenciados para o local e tiveram o atendimento prejudicado”.

A Sesau finalizou dizendo que no pedido para início do tratamento de Sandra, lançado no Sisreg (Sistema Nacional de Regulação), não há nenhuma orientação sobre a necessidade de urgência, estando, assim, enquadrado como um procedimento ambulatorial. ”O município cumpre prontamente a Lei 12.732 de 2012, que garante o início do tratamento do paciente com câncer em até 60 dias após o diagnóstico”.

A primeira solicitação médica foi feita no dia 6 de janeiro para início das sessões no dia 23 de fevereiro, essa foi cancelada. Após isso, Sandra conseguiu um novo pedido no Hospital Regional, datado do dia 8 de março, mas que segue sem data para realização.

O HU, local onde Sandra faria o tratamento, informou que não sabe o motivo do cancelamento da consulta, mas afirma que foi feita pelo Sisreg. Já o Hospital do Câncer respondeu que a agenda de abril já está aberta e a paciente está em tratamento no Hospital Regional, portanto, é ele quem deve esclarecer o problema, uma vez que ela nunca foi encaminhada ao HC.

O hospital explicou que é um dos prestadores de radioterapia pelo SUS, assim como o HU, e lembrou que os pacientes são regulados para o HC para realizar as radioterapias através do Sisreg. O HRMS (Hospital Regional de Mato Grosso do Sul) disse que não oferece o serviço de radioterapia, apenas encaminha os pacientes que precisam do atendimento. E que no caso havia encaminhado Sandra para o HU.

Casal que está junto há 27 anos mostra os pedidos médicos e exames de Sandra (Foto: Marcos Maluf)
Casal que está junto há 27 anos mostra os pedidos médicos e exames de Sandra (Foto: Marcos Maluf)


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