“Disputava lixo com cachorro”, conta Lima, recuperado após 23 anos usando drogas
Rosuel Pinto de Lima, hoje com 55 anos, se recuperou das drogas e agora coordena tratamentos em reabilitação
“Eu brigava com pombo e cachorro para poder comer o lixo”. Rosuel Pinto de Lima, de 55 anos, conta que passou quase metade da vida nas ruas e, devido à dependência química, precisava disputar por restos de comida na região do Mercadão Municipal. Após 23 anos usando drogas, Lima se recuperou e hoje, coordena tratamentos em comunidade terapêutica.
Entre árvores e ruas de terra na Chácara dos Poderes, a cerca de 30 minutos da região central de Campo Grande, Lima se tornou um dos responsáveis pelo atendimento disponibilizado no Esquadrão da Vida. “Eu usei droga e morei na rua por 23 anos. Vivi assim até o dia em que encontrei o pastor Samir e o Esquadrão”, diz.
Voltando no tempo, Lima explica que começou a se drogar aos 18 anos, no Maranhão. “Eu amanhecia preso todo dia por causa de droga, todo dia meu pai tinha que me tirar. Um dia um sargento me falou um monte de coisa sobre eu decepcionar minha família, aí peguei minha mochila e sumi no mundo”.
Desde então, o coordenador passou a viajar e em 1994, chegou a Campo Grande. “Sempre morando na rua, eu ficava ali perto do Mercadão. Conhecia todo mundo ali até o começo de 2005, cuidava o carro de todo mundo e aquilo ali era o dinheiro do meu consumo com bebida e droga”, explica.
Eu comia lixo do Mercadão, brigava com os pombos e com cachorro para conseguir pegar, porque na hora que joga o lixo ali, os cachorros e os pombos vão em cima. Então, era uma luta para pegar o alimento. Eu pegava as marmitas do lixo do Camelódromo também, passava e pegava, porque já não tinha mais vergonha de nada, Lima conta.
A vida nas ruas foi interrompida em janeiro de 2005, quando Lima se preparava para um furto. “Eu já tinha fumado tudo, era umas 11h e duas pessoas estavam descendo aquela rua do Mercadão de moto, quando caíram. Eu pensei que os dois estavam presos no chão, então, era só chegar e furtar. Quando estava indo, o pastor veio e perguntou de onde eu tinha saído”.
Até aquele momento, Lima conta que não tinha ideia do que era uma casa de recuperação. “Ele me perguntou se eu queria ajuda, mas como já estava mal de bebida, falei que ia e pensei em roubar ele no caminho. Acabei indo para o Esquadrão, me deram uma cama, um sabonete e tomei banho. Fazia tanto tempo que eu não dormia em uma cama e decidi não ir embora”, disse.
Luta danada - Sem nunca ter procurado por ajuda, o coordenador narra que a maior dificuldade foi deixar a mistura de cigarro com pasta base. “Foi muito sofrimento, eu cheguei a desistir uma vez, mas voltei. Com seis meses, me mandaram para cá, que hoje é a sede, fiz um curso de capacitação e comecei a trabalhar com a vida dos outros”.
Já sendo coordenador de tratamento, Lima explica que decidiu estudar sobre a dependência química para si mesmo e, como consequência, aprendeu que para ajudar no tratamento alheio, precisava aplicar sua experiência. “Quem ajuda essas pessoas, precisa entender cada acolhido. É preciso muita paciência para lidar com essas pessoas e fazer com que enxerguem a vida de um jeito diferente”.
Reforçando que seu próprio tratamento segue todos os dias, o antigo morador de rua explica que a busca por ajuda em si mesmo é constante. “O tratamento segue todos os dias. Aqui no Esquadrão, é a preparação para você viver lá fora, lá que é o problema. Então, essas pessoas precisam retomar os sonhos, precisam lutar pelos projetos que perderam”.
Ajuda disponível - Fundador do Esquadrão da Vida, Samir Zayed, de 58 anos, explica que a comunidade terapêutica disponibiliza tratamentos 100% gratuitos. “Antes, as pessoas pagavam o que podiam, era simbólico. Hoje, temos condições de oferecer o tratamento gratuito, temos convênio com a prefeitura e o governo federal”, disse.
No local, pessoas que buscam por tratamento são atendidas e passam por tratamento que varia entre nove meses e um ano. “Aqui, temos psicólogos, assistência social, jurídica e religiosa. A pessoa volta a ter uma rotina, passa por estágios do tratamento e, por fim, é reinserida na sociedade”, Samir explica.
Destacando que várias bases são abordadas durante o tratamento, Samir diz que a educação também é trabalhada. “Os acolhidos têm acesso às aulas do EJA (Educação de Jovens e Adultos) e todas as tardes, assistem palestras. Eles fazem cursos profissionalizantes para que consigam criar um currículo e procurar emprego ao saírem”.
Para entrar em contato com a comunidade terapêutica, os interessados devem se dirigir até a unidade central do Esquadrão da Vida. O escritório fica localizado na Rua Amazonas, número 20, no Monte Castelo. Dúvidas podem ser tiradas através do contato (67) 3027-5005.