Juiz mantém pena de barões da coca: milionários sem conta no banco
Operação da PF apreendeu 805 quilos de cocaína, mais de 2 milhões de dólares, imóveis, carros de luxo e joias
A 3ª Vara da Justiça Federal de Campo Grande negou provimento a recurso da defesa dos irmãos Odacir Santos Corrêa e Odir Fernando Santos Côrrea, alvos da operação Nevada, e manteve na íntegra a sentença de condenação por tráfico transnacional, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Na decisão, é destacada a contradição entre a vida de milionários e nenhuma movimentação na economia formal: eles não tinham conta bancária ou aplicação financeira em nenhuma instituição, nem em nome próprio nem em nome da pessoa jurídica de sua propriedade.
Realizada em 2016 pela PF (Polícia Federal), a operação Nevada apreendeu 805 quilos de cocaína, mais de 2 milhões de dólares, dezenas de milhares de reais pertencentes aos condenados, vários imóveis, carros de luxo (como automóveis Land Rover e BMW), joias e outros bens de origem desconhecida. À época, chamou a atenção uma mansão na rua Serra Nevada, em Campo Grande, inclusive com estátua de figuras gregas no jardim.
A condenação de 14 pessoas veio em dezembro, numa decisão do juiz federal Bruno Cezar da Cunha Teixeira, titular da 3ª Vara Federal de Campo Grande, especializada em crimes de lavagem de dinheiro, ocultação de bens e valores e crimes contra o SFN (Sistema Financeiro Nacional).
No entanto, a defesa de Odacir, Odir e Gustavo da Silva Gonçalves apresentou embargos de declaração apontando contradição, omissão e obscuridade na decisão. Os questionamentos incluem se há provas da lavagem de dinheiro, de associação criminosa, uso de “maleta” pela PF para escuta sem passar por operadoras e sobre a negativa de reabrir a instrução processual devido à declaração de Jedeão de Oliveira, ex-diretor de secretaria da 3ª Vara.
Funcionário de confiança do juiz federal Odilon de Oliveira, que comandou por anos a 3ª Vara da Justiça Federal de Campo Grande, Jedeão registrou documento em cartório onde cita ter sido informado de que Odilon cobrou R$ 1 milhão para liberar presos da operação Nevada. A denúncia foi negada pelo juiz aposentado.
Lavagem de capitais – Conforme a decisão, divulgada na última sexta-feira, a origem ilícita do dinheiro, como proveito direto da prática do tráfico de drogas como meio de vida, ficou demonstrada no tópico que trata da associação para o tráfico de droga. Conforme admitidos pelos próprios réus, eles não tinham conta bancária ou aplicação financeira em nenhuma instituição.
“Não há notícia de multimilionários brasileiros - que desenvolvam atividade lícita - que não tenham uma única conta bancária, investimento ou mesmo cartão de crédito ou de débito. A tese de que tenham pessoalmente transportado milhões de reais e dólares de procedência lícita em viagens de carro, conforme alegado, foi tida como insubsistente à luz do sólido conjunto probatório”, aponta a decisão.
Ganha destaque a ausência de qualquer negociação telefônica que trate do comércio agropecuário, apontada como atividade formal dos irmãos.
Sobre o uso da maleta para escuta, a decisão cita que a defesa não detalha quando a PF teria se valido desse recurso. “A defesa não comprovou a existência desse aparelho, se realmente tem a capacidade arguida, se a Superintendência da Polícia Federal do Mato Grosso do Sul detinha algum destes aparelhos ou se utilizou algum desses aparelhos durante as específicas investigações”, diz a Justiça Federal.
Ostentação – A descoberta do grupo aconteceu devido a reclamações de moradores das proximidades da mansão na rua Serra Nevada. Na ocasião, policiais federais constataram intensa movimentação de automóveis de luxo pertencentes a empresas fantasmas e reiteradas reuniões de pessoas envolvidas com o tráfico de entorpecentes.
O grupo atuava em núcleos e enviava grandes quantidades de cocaína boliviana para a cidade de São Paulo.
Na internalização da droga no País, fardos de cocaína boliviana eram arremessados de aviões na área rural dos municípios de Bodoquena, Bonito e Porto Murtinho. Depois disso, a droga era carregada em carroceria de veículos ou enterrada em local adequado para posterior carregamento e envio para a cidade de São Paulo. Odacir Fernando Santos Corrêa foi condenado a 51 anos; Odacir Santos Corrêa, 14 anos; e Gustavo da Silva Gonçalves a 12 anos.