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Capital

Mãe passa sete dias de resguardo, volta e encontra casa demolida

Caso ocorreu em abril, mas até agora mulher está sem a posse do local onde viveu por 22 anos

Por Lucia Morel | 01/12/2023 18:49
Filhos menores de idade da mulher vítima de demolição sobre os escombros da antiga casa. (Foto: Reprodução)
Filhos menores de idade da mulher vítima de demolição sobre os escombros da antiga casa. (Foto: Reprodução)

Mãe de oito filhos, mulher de 44 anos ganhou o caçula em abril deste ano. Para poder dar à luz o bebê, passou sete dias, entre 4 e 11 de abril deste ano, fora de casa: primeiro, na Santa Casa para ganhar a criança e depois, na casa da amiga que cuidou dos três mais velhos enquanto ela ficou internada. Quando voltou para sua moradia própria, no bairro Buriti, a casa estava demolida.

Desesperada, fez fotos no local, identificou uma vizinha como autora do delito e registrou boletim de ocorrência. Ocorre que o terreno onde ela vive há 22 anos (o nome não será revelado para não identificar os filhos) é um comodato, ou seja, área invadida por ela todo esse tempo. Outros invasores também ocupavam o espaço, mas em outras casas.

Por sorte, a mulher havia começado processo de regularização junto à Amhasf (Agência Municipal de Habitação e Assuntos Fundiários), o que garantiu a ela a reintegração de posse. Na agência, ela foi orientada a procurar a Defensoria Pública que em junho deste ano acionou a Justiça para que ela pudesse reaver a área e quem sabe, construir nova casa e encerrar a regularização do terreno.

A Defensoria, por sua vez, reforçou na petição que “além de ter a sua casa demolida, todos os seus pertences e objetos pessoais foram extraviados. Descobriu que a pessoa responsável pela invasão, esbulho e demolição da casa foi a primeira requerida, que era sua vizinha de muro”.

Casa demolida em comodato que vítima tenta regularizar na Agência de Habitação. (Foto: Reprodução)
Casa demolida em comodato que vítima tenta regularizar na Agência de Habitação. (Foto: Reprodução)

Também ressaltou na época que “tais prejuízos são evidentes. Inclusive, de acordo com o documento emitido pela Emha, a autora está na iminência de perder todo o seu processo de regularização, eis que o pré-requisito é estar morando no imóvel”.

Decisão judicial da 9ª Vara Cível, Maurício Petrauski, decidiu pela reintegração de posse em 15 de junho, justificando que a “ocupação do imóvel pode ensejar a construção de alguma obra, que deverá ser reputada de má-fé, com aumento desnecessário da litigiosidade, notadamente em vista da demolição da residência da Autora”.

Ainda sem casa – Apesar da decisão, que foi favorável à mulher em primeiro e segundo graus, a mãe de oito filhos ainda não conseguiu voltar para casa. Novo pedido da Defensoria informou o problema, relatando que, em 20 de junho, oficial de justiça intimou a vizinha que demoliu a moradia, mas que até agosto a reintegração não havia sido efetivada.

A reportagem do Campo Grande News foi até lá procurando pela mulher, mas quem atendeu foi outra pessoa, dizendo que ninguém com o nome procurado pela reportagem morava lá. Muro e casa com aparência de recém-construídos ocupam o lote.

Amiga dela que atendeu ligação contou um pouco da história. Ela não quis ter o nome divulgado, mas informou que sua amiga vive uma situação muito difícil e mesmo tendo conseguido reaver o imóvel em duas instâncias, a antiga vizinha “não arreda o pé de lá”. Os filhos dela têm 22, 20, 18, 15, 11, 8, 5 e seis meses de idade.

Atualmente, a mulher vive em apartamento popular não quitado no bairro Tijuca, que pertencia ao primeiro marido, que morreu. Entretanto, por não ter pagado as parcelas e não estar em seu nome, ela pode perder o imóvel a qualquer momento.

Outro problema relatado é que nem mesmo um celular a mulher que teve a casa demolida pode ter. Um dos oito filhos, de 18 anos, é usuário de drogas e acaba furtando tudo que há em casa para poder comprar drogas.

A pessoa que demoliu comprou um salão que tinha ali de outra pessoa. A (minha amiga) avisou que o terreno era dela e que não tinha como comprar nada ali, mas a pessoa ficou lá mesmo assim e acabou demolindo a outra casa”, contou.

Outro lado – A autora da demolição também se apresentou à Justiça e disse que havia contrato registrado em cartório que provava que a mãe de oito filhos e a ex-sogra dela haviam vendido um imóvel no terreno a ela. Na época, em 2020, muro foi erguido para separar as duas casas, mas em 2021, filho da vítima de demolição teria danificado o muro, gerando “animosidade” entre as famílias.

Foi feito acordo “de boca” para que a autora da demolição comprasse, por R$ 15 mil, a casa da vítima e que esta, depois, teria pedido R$ 50 mil pelo negócio. Alegou ainda que investiu no imóvel e fez melhorias e teve gastos. Pediu ainda que a decisão judicial delimitasse que parte do terreno seria de cada uma, já que “esse mesmo lote possui 4 moradias, além do imóvel da autora, a qual requereu reintegração do lote inteiro, usando de má-fé ou não passando a informação correta”, relatou.

Para o desembargador e relator do processo em segundo grau, Luiz Tadeu Barbosa Silva, da 4ª Câmara Cível, os argumentos não foram acolhidos, porque “apesar de a recorrente alegar que teria ajustado com a autora que compraria a parte do imóvel que a esta pertence, certo é que não há nenhum documento que corrobore esta versão dos fatos, tampouco que a recorrida tivesse alterado o valor inicialmente pactuado”.

Muro construído pela vizinha que demoliu a casa da outra. (Foto: Reprodução)
Muro construído pela vizinha que demoliu a casa da outra. (Foto: Reprodução)

Assim, “inexiste, ainda, qualquer elemento que leve a crer que as obras iniciadas no terreno objeto do litígio pela ré agravante contariam com a autorização da agravada. Por todo o exposto, nota-se ser pertinente a concessão de liminar de reintegração de posse para aquele que logra êxito em demonstrar que se encontrava no exercício da posse do bem e a perdeu, tal como ocorreu no caso concreto”, definiu em 11 de julho.

Prefeitura – O município de Campo Grande não respondeu à reportagem até o fechamento deste material, mas se posicionou no processo informando que o direito da vítima é mais “plausível” porque de fato existe procedimento administrativo de regularização fundiária junto à Amhasf. Entretanto, pediu a tutela possessória do imóvel para “afastar novas invasões no imóvel objeto deste processo” e para ser colocado como parte na ação.

O juiz deliberou os pedidos municipais e por ter a prefeitura aderido como parte, o processo precisa ser redistribuído a uma das Varas de Fazenda Pública e Registros Públicos. A determinação é de 26 de outubro.

O Campo Grande News não conseguiu contato com a vítima, apenas com a amiga, que disse que falará com ela neste fim de semana para verificar se ela libera a publicação de seu nome no material.

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