Manutenção zero: fios ficam anos arrebentados pelas ruas e são risco na cidade
Além da poluição visual, vira e mexe caminhões se enroscam em fiação caída e acabam com serviços essenciais na vizinhança
O emaranhado de fios no alto dos postes já é parte do cenário urbano de Campo Grande. Além da poluição visual, vira e mexe "é notícia", com caminhões que se enroscam na fiação e vão arrastando tudo que surge pela frente, deixando a vizinhança sem energia, internet e telefone.
O investimento é pesado para tornar a fiação subterrânea, como ocorre na Rua 14 de Julho, mas o que se percebe é que nem a manutenção é feita para livrar a paisagem do aspecto deteriorado e a população de risco de ficar sem serviços essenciais.
Ontem, por exemplo, um caminhão danificou a rede elétrica da Rua Yokoama, no Bairro Vila Palmira, em Campo Grande. O incidente foi registrado pelas câmeras de segurança da loja de Rafael William, de 27 anos. “Levou toda a fiação da rua”, conta o comerciante.
O veículo se prendeu em fios enroscados em um árvore que caiu produzindo estouros, clarão e muitas faíscas. Veja o vídeo:
E o problema é crônico. Imagem capturada em maio de 2019 pela Google, na rua das Pérolas, no Jardim Petrópolis, continua praticamente a mesma um ano e sete meses depois. É como se os cabos, e o descaso com manutenção, fossem parte intencional da urbanização.
Há uma década morando na Rua Dardanellos, vizinha da imagem que parece congelada, o mecânico Marco Antônio Cordeirom de 40 anos, reclama que cabo solto é característica da região, assim como da cidade.
Tem cabo aqui em cima que eu nem sei de onde é, uns em outras partes da rua são piores porque ficam mais baixos, mas mesmo mais alto continua feio. Moro há dez anos aqui e sempre foi assim, meio abandonado com fiação, diz Marco Antônio Cordeirom.
Apontando para as esquinas e ruas laterais, Marco explica que não tem nem mesmo esperança de pedir por melhorias. “Esses que parecem de internet ficam aí sempre. A gente não tem nem ideia de como denunciar, se acostuma e acaba nem reparando mais, só na hora que dá problema”, conta.
Os problemas imaginados pelo mecânico se referem aos fios que ficam no alcance de crianças e adolescentes, “tem fio que chega perto do chão, é perigoso porque eles podem passar perto e arrebentar”, A cena também é ilustrada na rua Dardanellos, um pouco antes de chegar na avenida Murilo Rolim Júnior.
Entre seis cabos cortados e que ficam pendurados em poste na rua das Açucenas, um deles está a poucos centímetros do chão. Professora, Ellen Rosa Bernardes, de 37 anos, conta que nunca viu manutenção de cabos em três anos morando próximo ao local.
Sorte que ninguém se machucou até então, mas a gente se preocupa porque eles ficam bem baixos, nunca dá para saber o que vai acontecer.
Para Ellen, soluções para o problema estético deveriam ser produzidas, já que é presente em tantos lugares. “Acho que varia de bairro para bairro, tem uns que são melhores, mas no geral você encontra pelo menos um poste com fio solto”.
Na Vila Silvia Regina, a reclamação se repete com demora para ajustar fiação e eliminar as “pontas soltas”. Empresária de 40 anos, que preferiu não se identificar, relatou que cabos estão espalhados por calçada há meses rua Pindaíba. Ainda conectados em poste, a fiação se estende por árvore e chão.
Seguindo a ideia de que os emaranhados de fios são comuns, Julio Cesar Medina, de 46 anos, confirma que no Jardim Imá a situação é a mesma. Indicando fiações arrebentadas na rua Brasília, ele conta que não vê mudança de cenário.
Faz parte das ruas já. É muito raro você ver uma equipe de telefonia vindo aqui, ninguém em específico mexe para arrumar de vez, comenta Julio Cesar Medina
Assunto em alta - Trabalhando na região central de Campo Grande, Márcio Vinicius Amorim, de 42 anos, diz que o problema não existe apenas nos bairros mais distantes. “Você vê que aqui perto da Afonso Pena tem fiação cortada que ninguém mexe. No Centro é a mesma coisa, o pessoal até arruma mas continua feio”, diz.
Para Márcio, o principal problema acaba chamando atenção pela alta quantidade de casos. “Você conversa com as pessoas e vê isso. Aqui é até mais cuidado, mas continua tendo, continua estragando as ruas”.
Outros tipos de cabos também compõem o cenário de preocupação com manutenção. Na rua da Paz, esquina com a rua Goiás, fiação conectada ao semáforo está rompida há pelo menos três meses. Foi necessário amarrar o cabeamento devido ao seu tamanho.
No último sábado, o Campo Grande News divulgou resultado de enquete questionando qual defeito da Capital é pior na opinião dos campo-grandenses. Entre asfalto remendado, fiação baixa e emaranhada e calçadas destruídas, 25,5% dos votos foram para a fiação.
Casos que vão além da “feiura” são noticiados demonstrando que o assunto é realmente sério e antigo. Um motociclista ganhou causa, neste ano, em sentença da 10ª Vara Cível de Campo Grande por acidente ter sido causado pelo rompimento de cabos.
Ele relatou no processo que, em 2014, foi surpreendido por fiação na rua 25 de Dezembro, esquina com a Dom Aquino. Ele foi “estrangulado” pelos cabos e acabou caindo, ficando inconsciente. Duas companhias de telecomunicações foram responsabilizadas a pagar R$ 885,06 por danos materiais e R$ 12 mil em danos morais.
Mais recente, um motociclista sofreu acidente na rua Barnabé Honório da Silva, no Jardim Pênfigo, em agosto deste ano. De acordo com testemunhas, ele não viu a fiação solta e acabou perdendo controle e se enroscando nos cabos.
Outro lado - Os postes são compartilhados, por concessionárias de energia, empresas telefônicas e de internet. Na região com semáforos, a prefeitura também é responsável pelos fios.
A Energisa esclarece que o cabeamento de telecomunicações é responsabilidade das operadoras de telecomunicações, que compartilham dos mesmos postes da Energisa." Caso situações de risco sejam identificadas, a operadora detentora dos cabos deve ser informada".
Sobre as cenas registradas pelo Campo Grande News, a concessionária diz que "a Energisa está realizando inspeções nos locais indicados e fará a notificação formal às operadoras responsáveis para que façam a manutenção em seu sistema"
A reportagem também procurou a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), que é reguladora das operadoras de telefonia, mas não recebeu resposta até a finalização da matéria.
Questionada no fim desta segunda-feira sobre a manutenção, a Agetran também não enviou respostas até o momento.