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Capital

Pais e especialistas enfrentam escolas: “pior momento para voltar”

Na batalha entre a saúde e interesse financeiro, deve prevalecer isolamento que salva vidas

Aline dos Santos | 25/06/2020 12:38
Escolas particulares tinham previsão de retorno em primeiro de julho, mas quadro do novo coronavírus se agravou em Campo Grande. (Foto: Paulo Francis)
Escolas particulares tinham previsão de retorno em primeiro de julho, mas quadro do novo coronavírus se agravou em Campo Grande. (Foto: Paulo Francis)

O levante das escolas particulares contra a decisão da prefeitura de Campo Grande em suspender a volta às aulas, marcada até então para primeiro de julho, acontece no pior momento.

A Capital vive hoje o período de maior transmissibilidade do novo coronavírus desde março, quando a cidade confirmou os primeiros casos de covid-19. Nessa batalha entre a saúde e interesse financeiro, especialistas defendem que o isolamento social é a melhor maneira para salvar vidas.

“É o pior momento para voltar às aulas. Temos a maior transmissibilidade da doença, inclusive com a ocupação de leitos nos hospitais chegando próximo da ocupação total. Agora é preciso evitar aglomerações. Estamos vivendo os momentos mais críticos”, afirma o infectologista Rodrigo Nascimento Coelho, do HR (Hospital Regional) Rosa Pedrossian, referência para tratamento da covid-19 em Campo Grande.

Segundo o médico, é hora de a população entender que se todos resolverem quebrar as medidas de distanciamento e de proteção, não haverá leitos, material hospitalar e profissionais para atender a todos os pacientes.

Campo Grande registra 1.554 casos de novo coronavírus. A gravidade do momento também é alertada pela infectologista Mariana Croda, da Faculdade de Medicina da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) e do comitê de operações de emergência do Estado.

“A gente está vivendo a ascensão da curva. As escolas foram fechadas em época com indicadores muito menores. Agora, a taxa de ocupação de leitos aumentou muito. Estamos falando de Campo Grande, mas há municípios que nem caso tem e não tiveram as aulas retomadas”, afirma a infectologista.

A infectologista Mariana Croda alerta que assistimos à ascensão da curva de novos casos de covid-19. (Foto: Chico Ribeiro/Governo MS)
A infectologista Mariana Croda alerta que assistimos à ascensão da curva de novos casos de covid-19. (Foto: Chico Ribeiro/Governo MS)

A especialista ressalta que Campo Grande ainda é referência em caso de internação para outros 33 municípios de Mato Grosso do Sul. “Se não conseguir frear a curva é provável que colapse o sistema de saúde. E se medidas mais restritivas forem tomadas imediatamente, só vão refletir duas semanas depois”, afirma Mariana Croda, numa leitura perturbadora do atual panorama do coronavírus.

Em geral, as crianças registram baixa letalidade e complicações pela doença. “Todavia, elas podem ser veículos de transmissão para a população de risco. Essa é a nossa preocupação”, diz a infectologista.

Medo pelas crianças – Os pais e responsáveis avaliam que não é o momento de voltar, principalmente por saberem que as crianças não conseguirão manter o protocolo de distanciamento social. Há mais de cem dias longe dos amigos, eles avaliam que será impossível conter os abraços e beijos no reencontro.

“Por enquanto, meus filhos de 7 e 11 anos não voltam para a escola. A mais velha pode até se lembrar do distanciamento. Mas para o de 7 anos será impossível não dar abraço, dividir lápis, borracha. Fora que o vírus tem todo um raio de contaminação e a escola não vai conseguir fazer esse controle”, diz Michelle Alexandrina, 38 anos, que é empresária, dona de casa e trabalhou como enfermeira por 12 anos.

“Foram sete anos em hospital, pronto-socorro. A gente sabe da gravidade dos problemas respiratórios. Isso é sério e não uma gripezinha”, afirma Michelle.

Ellen (à direita) conta que explicou o perigo para a enteada de 7 anos: "Nessa hora, criança entende mais do que o adulto". (Foto: Marcos Maluf)
Ellen (à direita) conta que explicou o perigo para a enteada de 7 anos: "Nessa hora, criança entende mais do que o adulto". (Foto: Marcos Maluf)

Segundo a atendente Ellen Cristian Silva, 27 anos, madrasta de uma aluna de 7 anos, o retorno só deve acontecer quando tiver redução do número de casos e mortes pela covid-19.

“Não acho que é o momento de voltar. Isso foi consenso na família. Mesmo que o retorno fosse autorizado, ela não iria para a escola. E acredito que muitos pais pensem igual a mim. Conversamos com ela e explicamos o momento. Ficou um pouco triste, mas entendeu. Nessa hora, criança entende mais do que o adulto”, afirma Ellen.

A advogada Ana Cristina Bandeira, 49 anos, é taxativa. “Não deixaria meus filhos voltarem de jeito nenhum. Moro com uma mãe idosa, que é do grupo de risco, minha filha é asmática e meu marido também. Sei que nem todo mundo pode fazer isolamento, mas é um momento de sacrifício”, diz Ana, que tem um casal de filhos de 6 anos.

Entre o emprego e a saúde – Um professor que há 15 anos leciona na rede particular relata que se vê no dilema entre assegurar o emprego e o medo de ser infectado, levando a doença para outras pessoas.

“Se olharmos os números, não é hora de reabrir. Mas se olharmos do ponto de vista financeiro, não tem jeito, todo mundo é refém e terá que se arriscar para manter o emprego. Tenho medo de ser infectado e infectar outras pessoas”, diz o docente, e 41 anos, que pediu para não ter o nome divulgado por temer retaliação da empresa.

Presidente da Comissão de Enfrentamento à Covid-19 da  Câmara Municipal de Campo Grande, o vereador  Lívio Leite (PSDB),  que é médico, defendeu que não é o momento do retorno das escolas particulares.

“Nós estamos vendo Campo Grande com um aumento crescente de casos e de óbitos. Então, nós teremos um mês de julho difícil, complicado para todos nós”, alerta o parlamentar.

Critérios – Em reunião no dia 5 de junho, no MP/MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), foram definidas regras para que alunos de escolas particulares retomassem as aulas presenciais em primeiro de julho.  O número de casos confirmados deveria ser inferior à média do mês de maio e a taxa de ocupação de leitos não poderia ser superior a 50%.

 No entanto, junho termina com alta de casos e leitos cheios, inclusive com ativação de hospital de campanha, montando em frente ao HR.

Segundo a presidente do Sinep (Sindicato das Escolas Particulares de Mato Grosso do Sul), Maria da Glória Paim, o cenário mudou e exige cautela.  "Agora tudo mudou. O quadro que estamos vivendo é outro”, afirmou ao Campo Grande News.

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