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Capital

Para quem vive com 1 salário, carroça é transporte e casa acomoda 11 pessoas

Em casa de apenas 1 cômodo, idosa vive com filho, nora e 8 crianças

Liana Feitosa | 21/07/2022 13:41
Parte da família de dona Miria em carroça por ruas do bairro Jd. Noroeste. (Foto: Marcos Maluf)
Parte da família de dona Miria em carroça por ruas do bairro Jd. Noroeste. (Foto: Marcos Maluf)

É possível manter uma família ganhando um salário mínimo? A resposta que o brasileiro conhece bem é realidade para a aposentada Miria Aparecida Catirce de Almeida, prestes a completar 70 anos. Na pele dela é visível o trabalho de sol a sol, desde que “se entende por gente”. Em apenas 1 cômodo na Rua Queluz, no Jardim Noroeste, ela mora com um filho, a nora e 8 netos. São 11 pessoas que sobrevivem tendo como principal recurso financeiro a aposentadoria dela, o mínimo de R$ 1.212.

Quando a reportagem encontrou dona Miria, por volta de 11h30 desta quinta-feira (21), ela havia acabado de sair do mercado, após fazer algumas compras. Contabilizamos 3 sacolas acomodadas na carroça que é meio de transporte da família, em um pequeno espaço disputado por ela com outros dois adultos e duas crianças. Nos pacotes, poucos legumes, iogurte, farinha, arroz e alguns biscoitos.

O filho de dona Miria faz diárias de todo tipo de serviço braçal que aparece, como na construção civil, mas não tem renda fixa e usa todo recurso que consegue para manter os 8 filhos. Ele é um dos mais de 80 mil cidadãos que estão na fila de espera para receber Auxílio Brasil no Estado, sem sucesso.

Já dona Miria, além da aposentadoria, tenta se manter com o pouco dinheiro que consegue juntando recicláveis, trabalho esse que ela só consegue executar graças à ajuda da Samanta, a égua de pouco mais de 6 anos que é mantida com muito carinho pela idosa e responsável por puxar a carroça.

Mas a parceira é mais uma boca no orçamento familiar. O gasto mensal com Samanta varia de R$ 70 a R$ 100, é a média de preço do saco de milho que alimenta o animal.

Dona Miria mostra a casa dela, de um cômodo, onde moram 11 pessoas. (Foto: Marcos Maluf)
Dona Miria mostra a casa dela, de um cômodo, onde moram 11 pessoas. (Foto: Marcos Maluf)

Apesar da pobreza, dona Miria garante que pode até faltar comida para ela mesma, mas, para a égua, não. “Ela é minha companheira, minhas pernas e braços, não posso deixar ela ficar com fome”, compartilha ao Campo Grande News.

Subsistência - A peça de alvenaria onde mora a família é um empréstimo de décadas do proprietário do local e, ali, dona Miria mora há 30 anos. Antes, o casebre era de madeira e lona. “O primeiro barraco levantado aqui do Noroeste foi o meu”, garante dona Miria. A solidariedade dá a ela o teto, mesmo precário, e também alimentos; quando não consegue comprar alimentos, não deixa de ser ajudada por vizinhos. “Eu vou andando por aí com a minha carroça e aí uma pessoa me dá um pacote de arroz, outra me dá um pacote de feijão, alguém me dá um litro de óleo, e assim vai. Eu aceito tudo de muito bom grado. Eu não tenho vergonha, não. Eu sou agradecida de ganhar coisas de quem me ajuda”, conta a idosa.

De manhã, antes de conseguir ir até o mercado, ninguém da casa havia comido nada. “A gente não consegue fazer as refeições, não. Inclusive uma mistura às vezes nem sobra e até sem panela eu fiquei para cozinhar porque semana passada entraram na minha casa quando não tinha ninguém e levaram embora várias das poucas coisas que eu tinha. Até a porta do meu guarda-roupa levaram”, detalha Miria.

Aposentada mostra deterioração por anos de uso de carroça usada por ela para trabalhar. (Foto: Marcos Maluf)
Aposentada mostra deterioração por anos de uso de carroça usada por ela para trabalhar. (Foto: Marcos Maluf)

Sonhos - Ela não sabe o que é ter férias, momento de lazer ou descanso. Sonhos como viagens de avião ou até mesmo de carro nunca estiveram nos planos dela. “Não tem nem como sonhar com isso”, relata. Para ela, todo tempo disponível é para cuidar da família, catar recicláveis e buscar maneiras de subsistir.

Perguntei também à dona Miria se no aniversário dos netos, no dela ou do filho, é possível fazer “um bolinho” para comemorar. “Nunca, minha filha. A gente não tem nem dinheiro para o gás direito, não dá para fazer bolinho”, compartilha.

Hoje, a aposentada tem três sonhos: conseguir uma carroça nova, que custa cerca de R$ 5 mil, segundo ela; ajudar o filho a comprar um lote no bairro para poder acomodar os netos e custa R$ 2.500; e conseguir roupas usadas para que a nora possa vender na frente de casa e, assim, conseguir ajudar na renda familiar. O contato da dona Miria, um celular antigo e analógico, é (67) 99204-3618, portanto, não tem WhatsApp, mas pode ser a ferramenta de contato para quem deseja ajudá-la.

Geladeira vazia é sina de família que vive com apenas R$ 1.200 por mês. (Foto: Marcos Maluf)
Geladeira vazia é sina de família que vive com apenas R$ 1.200 por mês. (Foto: Marcos Maluf)


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