'Recrutamento' mantém fria guerra entre facções em presídios de MS
Investigações apontam que PCC e Comando brigam pela adesão de sul-mato-grossenses que ainda permanecem neutros nos presídios antes de iniciarem aqui conflito que deixou mais de 130 mortos
Relatório de investigação da Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública) aponta que PCC (Primeiro Comando da Capital) e Comando Vermelho querem base nativa de Mato Grosso do Sul estabelecida antes de iniciarem assassinatos de rivais em presídios sul-mato-grossenses.
Conversas entre líderes de facções criminosas presos em Mato Grosso do Sul, grampeadas pelo setor de inteligência da Sejusp, revelam que tanto os paulistas do PCC como os cariocas do Comando Vermelho ainda não teriam iniciado a prometida guerra entre ambos por buscarem primeiramente aumentar o número de adeptos locais.
Os áudios são mantidos em sigilo, mas o conteúdo das investigações foi passado ao Campo Grande News por um agente penitenciário que prefere não se identificar.
A apuração preliminar aponta que criminosos locais estão sendo convidados a se filiarem a uma das duas facções criminosas com a promessa de dinheiros, armas e benefícios. O objetivo é simples: descobrir novas rotas e caminhos para a entrada de drogas e armas do Paraguai e Bolívia principalmente para os estados da Região Sudeste.
“Desde o assassinato do Rafaat (Jorge Toumani, líder do tráfico na fronteira com o Paraguai, em junho de 2016), a fronteira está sem um chefe único. Muita gente de fora veio ao Estado de olho no mercado que se abriu”, disse um policial que participa das investigações.
Dados da Agepen (Agência Estadual de Administração Penitenciária) mostram que dos quase 16 mil detentos internos atualmente em Mato Grosso do Sul, quase a metade, cerca de 7 mil deles, foi presa por tráfico de drogas. Desse grupo, aproximadamente 4,5 mil seriam de outros estados e até estrangeiros.
“Estamos assumindo o custo dessas prisões relacionadas ao tráfico, que vêm pela fronteira e seria responsabilidade do Governo Federal”, disse o secretário estadual da Justiça e Segurança Pública, José Carlos Barbosa, no início desta semana.
O Estado recebe atualmente R$ 1,8 milhão através do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) para custear despesas com presos ligados ao tráfico de drogas.
Estouro – Agentes penitenciários que atuam na Penitenciária de Segurança Máxima de Campo Grande revelam que os presos estão basicamente divididos em três grupos: aliados do PCC, do Comando e os locais neutros. A medida foi tomada depois que Junior César Franco Pietro, 41, foi executado dentro do local, no dia 13. Os paulistas seriam os autores, irritados por ele não se ‘batizar’ à sua facção e ainda manter conversas com os cariocas.
Estimativa informal mostra que 40% dos quase 16 mil detentos do Estado são filiados ou simpatizantes do PCC. O número já foi maior, mas os paulistas ganharam antipatia justamente pelas constantes ameaças de morte e atrativos oferecidos pelos cariocas e seus aliados (facções como a Família do Norte).
Um exemplo é em Dourados (a 233 km de Campo Grande), onde assim como fizeram com os agentes, membros do Comando estariam oferecendo dinheiro para quem assassinasse os rivais. No local, a penitenciária Estadual, cerca de 600 aliados dos paulistas estariam encurralados por 1.300 opositores.
Mas não é a única vantagem carioca. Enquanto os líderes do PCC estão presos e agem internamente para conquistar filiados, a Polícia Civil descobriu, por exemplo, que o mato-grossense Fausto Xavier de Figueiredo, 36 anos, já identificado como o autor de mensagens em áudio prometendo explodir veículos de transferências de presos do bando rival e fora das grades desde o fim do ano passado, vem conquistando adeptos no corpo a corpo.
“Desde que ainda estava no Mato Grosso ele representava uma liderança rival à exercida pelo PCC. Quando a guerra entre facções estourou, era questão de tempo até se alinhar com o Comando e virar líder”, disse o policial à reportagem. Seria Figueiredo também quem arranjaria a infra-estrutura necessária para as famílias dos líderes da quadrilha e seus aliados que estão presos no presídio federal de Segurança Máxima da cidade.
“Falta para elas (facções) ter um respaldo maior interno. Um número maior de gente daqui, de Campo Grande e dos grandes centros do interior, que ofereça abrigo, armas, o que for necessário. O PCC caiu muito, mas o avanço dos rivais não é algo assustador, ainda. Quando assustar, a guerra começa”, decretou um agente penitenciário.
Desde o início da guerra entre as facções, iniciada justamente pela morte de Rafaat e o tratamento ‘linha dura’ do PCC, com execuções e cobranças de mensalidade, mais de 130 pessoas foram mortas em rebeliões ocorridas em todo o Brasil. No Mato Grosso do Sul foram quatro vítimas fatais nas prisões até aqui.
Por questões de segurança, Sejusp e Agepen dizem que não comentam sobre briga de facções e que monitoram os presídios em tempo real para evitarem rebeliões, com equipes a postos para agir. O Estado, até a conclusão desta reportagem, não havia definido se aceitava a ajuda oferecida pelo Governo Federal das Forças Armadas atuando nas prisões.