Sem lockdown, na próxima semana "paciente vai morrer sem UTI" , diz especialista
Júlio Croda defende, inclusive, que o poder Judiciário faça intervenção, caso a prefeitura não tome as medidas necessárias.
As medidas adotadas pela prefeitura de Campo Grande nas últimas duas semanas "não tiveram impacto nenhum em taxa de contágio" do coronavírus, avalia o infectologista e pesquisador da Fiocruz, Júlio Croda. Por isso, ele defende lockdown imediado na cidade.
"Na minha opinião técnica, já na semana que vem vamos ver paciente morrendo por falta de leitos de UTI em Campo Grande", afirma ele, levando em conta o ritmo de contaminações nos últimos 30 dias. "E o que estamos vendo agora é a flexibilização de medidas para as próximas semanas, isso é muito preocupante", avalia. Já são 9.644 infectados na cidade, eram pouco mais de 2.000 no fim de junho.
Desde ontem, mais 8 pessoas morreram oficialmente na Capital em decorrência da covid-19, agora são 119 óbitos oficialmente. Além disso, as UTIs dos dois maiores hospitais da cidade, Regional e Santa Casa, estão com 100% das UTIs lotadas, apesar de ativações recentes de leitos na rede particular, como forma de absorver paciente não-covid.
Segundo Júlio Croda, a Capital também perdeu a capacidade de monitorar os pacientes por 14 dias, tempo de quarentena. Então, não há como saber se pessoas com testes positivos estão em isolamento realmente e também se o quadro se agravou.
O pesquisador lembra que por semana, o número de casos aumenta 25% na cidade. "No contexto do Estado, temos em Campo Grande a pior situação. Temos a segunda maior taxa de contágio entre todas as capitais, só estamos perdendo para Porto Alegre", avisa.
Hoje, pessoas morrem no mesmo dia que dão entrada no hospital, o que indica o atendimento tardio. "A covid gera no corpo trombose e microtrombose. Por isso é importante que as pessoas sejam monitoradas. É importante que as pessoas procurem o serviço de saúde rápido. Que peçam para serem checados por oxímetro, para ver a saturação de oxigênio no sangue", explicou.
O infectologista diz que quando a cidade perde a capacidade de monitorar, não há outra saída além do lockdown, independente das perdas econômicas.
"Sabemos que tem impacto econômico, mas o Estado é o que teve menores perdas até agora. MS só perdeu 3% do PIB (Produto Interno Bruto). Em São Paulo foi 9%. Só o que a gente pede é que (a prefeitura) concentre as medidas nesse mês de agosto, para salvar vidas. Neste momento na Capital, não tem outra solução que não seja lockdown", reforça.
Ele defende, inclusive, que o poder Judiciário faça intervenção, caso o gestor público não tome as medidas necessárias. "Mesmo que comecemos o lockdown hoje, o impacto só vem em duas semanas. Quanto mais adiarmos, por mais tempo vamos viver o caos", prevê.
A secretária-adjunta da SES, Christinne Maymone, lembrou que hoje o Estado ativa mais 6 UTIs em Jardim, na tentativa de desafogar a Capital, mas a quantidade de profissionais limita a possibilidade de ativação de mais leitos de UTI. "Não existe fábrica de recursos humanos que produzam médicos, enfermeiros...", comentou.
A chance de uma pessoa morrer na UTI é de 50%, mas para quem fica a espera de vaga é de 90%, afirma Júlio Croda. "O cenário da Capital é muito preocupante".
Curva em alta - No total, 15 pessoas morreram em Mato Grosso do Sul nas últimas 24 horas. O Estado registrou mais 876 infectados desde ontem. Nesta quinta-feira, o Estado já contabiliza 24.287 infectados pelo coronavírus.
Campo Grande foi novamente campeã em mortes nesta quinta-feira. A Capital confirmou oito mortes desde ontem. Duas mulheres, que tinham comorbidades, de 62 e 60 anos, além de outros seis homens, de 93, 92, 77, 64 e 60 anos, todos com doenças que agravaram o quadro. Apenas um homem que também faleceu, de apenas 38 anos, não estava inserido em qualquer grupo de risco
Em Sidrolândia, uma idosa, de 91 anos, faleceu em decorrência da doença. Corumbá registrou três mortes, de duas mulheres de 77 e 67 anos, e de um homem, de 68 anos, que não possuía comorbidades. Na vizinha Ladário, um mulher de apenas 39 anos também morreu, com o agravante da hipertensão.
Em Anastácio, mulher diabética, de 82, também faleceu de covid-19.
Por fim, Dourados continua registrando mortes pela doença - um homem, de 63 anos, que possuía comorbidades, não resistiu e morreu.
A taxa de letalidade segue em 1.5%. O número de internações no Estado também cresceu bastante desde ontem. Eram 465 pacientes hospitalizados, hoje são 499, com 223 em UTIs.