Trânsito: sinalização da Capital não é suficiente para transformar condutores
Por ignorância ou falta de educação, motoristas descumprem leis
A sinalização de trânsito de Campo Grande precisa ser estudada (não é uma ironia). Afinal, o órgão que executa e "tem por finalidade o planejamento, a coordenação da operação e a fiscalização do sistema viário do município", a Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito), dispõe de poucos recursos estatísticos, como uma base de dados capaz de integrar, de forma concisa, as informações sobre o tráfego. Medidas, ancoradas em critérios técnicos, são muitas vezes questionadas por condutores, que por ignorância ou falta de educação mesmo, fogem ao regramento.
O conjunto de sinais e dispositivos colocados na via pública com o objetivo de garantir sua utilização adequada, possibilitando fluidez, previsto no CTB (Código de Trânsito Brasileiro), são fundamentais à segurança de condutores e pedestres. Por indicação de leitores, o Campo Grande News percorreu a cidade, nos pontos de maior incidência, para ver de perto os principais aspectos que influenciam na mobilidade urbana. A falta de sinalizações ou o motivo do uso delas estão entre as queixas mais contundentes. São essas mesmas reclamações que aparentemente ditam o ritmo das decisões, às vezes, tardias, tomadas pelo poder público.
"Lembro muito bem que aqui não tinha semáforo e era bastante complicado cruzar para o outro lado. Sempre acontecia acidentes, como o de um rapaz que faleceu após uma batida de moto", lembra Renato Trevisan, 31 anos, analista de sistemas, referindo-se a um acidente fatal na intersecção entre a Rua Luiz Dodero e Avenida Eduardo Elias Zahran.
A vítima, Elzo Ricardo Bernardo de Souza Junior, de 25 anos, morreu em colisão envolvendo duas motocicletas no dia 30 de maio de 2019. Devido à grande repercussão do caso, três meses após o acidente, a Agetran instalou semáforo no cruzamento.
Será que a instalação antecipada salvaria a vida do motociclista? É aí que surge outra indagação: se foi instalado o semáforo pouco tempo depois de ter tido um estudo sobre o tráfego, por que não anteciparam o problema? A pergunta foi feita ao chefe da Divisão de Operação e Coordenação e Fiscalização de Trânsito da Agetran, Carlos Gomes Guarini, que respondeu com outro questionamento. “Já percebeu que um acidente de trânsito sempre vem acompanhado de uma infração? Realmente, é uma questão de comportamento, pois se os condutores respeitassem as leis de trânsito, não haveria isso”, pontua.
Mesmo com as alterações de sinalização, o trânsito no local ainda é bastante complicado em horários de pico e o condutor não está isento de culpa. Durante nossa presença, inúmeras infrações foram constatadas. “A Avenida Eduardo Elias Zahran foi criada para ser anel viário, mas com o crescimento populacional, a via ficou no meio da cidade. Aqui, o correto seria trafegar em sentido único, mas como envolveria muitas questões burocráticas como desapropriações prediais, por exemplo, mantém-se o atual modelo. Com vias mais estreitas, o risco de acidentes é maior, por isso, a importância de uma boa sinalização”, alerta o engenheiro especialista em segurança viária, Flávio Salomão Cândia, 56 anos.
Ele explica que sinalização não deve dar ‘brechas’ ao condutor que está habituado a driblar as regras sem sentimento de culpa. “Isso é uma questão cultural, muitos dos condutores não tiveram uma boa formação. Por isso, quanto mais a sinalização interferir para redução de riscos, melhor. Por exemplo, quando o motorista está parado no sinal vermelho e visualiza que o sinal oposto está fechando ele já arranca e elimina o tempo de travessia do pedestre. Neste caso, a fixação do semáforo fora do alcance da visão do condutor, quando possível, seria uma boa alternativa. Portanto, sinalização é também atuar para mudança de comportamentos”.
Comportamento que insiste em acontecer na Avenida Bandeirantes depois que a Rua Campinas virou via de mão única devido às obras de corredores de ônibus na região. Consecutivos acidentes foram registrados na interseção. As alterações parecem ter confundido ainda mais quem transita pelas vias. Para quem está na Bandeirantes, é proibido fazer a conversão à esquerda, mas para quem vem pela Avenida Constantino, a conversão é permitida, ou seja, a Campinas tem aproximadamente dez metros de sentido único. “Na verdade, acho que ficou mais confuso e os acidentes continuam”, relata Kelly Almeida, 31 anos, auxiliar administrativa.
Onde elas estão? Ou não – Os tipos de sinalização são bastante variados e dividem-se em categorias. Além dos luminosos, sonoros, dispositivos auxiliares e gestos, os sinais verticais e horizontais são os mais conhecidos e também afetados. Não é difícil identificar, num giro pela cidade, locais que faltam algum tipo de sinalização ou estão em mau estado de conservação.
Já visualizou uma placa com os dizeres: nunca feche o cruzamento? Pois bem, essa é a sinalização suspensa, mas no solo, o alerta chama-se área de conflito. Esse espaço é uma proteção aos motoristas, que devem parar antes do fechamento do semáforo. Mas e quando não tem?
Everton Guielebo, 31 anos, motorista profissional, teve que utilizar o espaço de um posto de combustíveis localizado entre as ruas Engenheiro Roberto Mange e João Rosa Pires, por não conseguir cruzar para a Afonso Pena. “Tem que refazer a pintura no chão novamente, porque havia, mas apagou.
A Brilhante é outro ponto bastante criticado pelos motoristas, que não conseguem prosseguir quando chegam no cruzamento com a Salgado Filho. “Embora não haja sinalização, para uma pessoa que passou por um processo de educação ao se habilitar, não precisaria entrar nesta questão. É evidente que não se deve fechar um cruzamento, mas como não tem nada que o impeça, ignoram”, disse Salomão.
Vertical – A sinalização vertical é uma categoria que engloba sinais colocados nas laterais ou acima das vias, por meio de placas que transmitem orientações aos usuários. Na Avenida Noroeste, na travessa com a Rua Imperial, sentido bairro-Centro, a visão sobre o semáforo é obstruída por galhos de árvores. Assim como na Av. das Bandeiras com a Rua Manoel Viêira de Souza.
Motos – Criadas em 2015, as áreas de espera para motos, para evitar riscos, espalhadas em cruzamentos com semáforos pelas principais vias da Capital, também não passam despercebidas aos olhos dos usuários. A primeira a receber a sinalização foi a Avenida Ernesto Geisel com a Fernando Correa, mas atualmente, não há sinalização alguma. Segundo Guarini, “a sinalização será retomada com o avanço das obras na via”.
O que dizem os órgãos de trânsito – Questionado sobre dados estatísticos, como acidentes por exemplo, tenente coronel Wellington Klimpel, Comandante do BPMTran, disse que o batalhão “trabalha com Business Intelligence, o qual é o modulo do SIGO (Sistema Integrado de Gestão Operacional) dedicado a extração de dados de maneira rápida e intuitiva, permitindo o cruzamento de dados e utilização de filtros diversos, trazendo através de elaboração de cenários, a aderência de extração de dados frente às necessidades. Todos os dados que compõem um Boletim de Ocorrência de trânsito são transformados em gráficos e tabelas, visando um assessoramento para tomada de decisão”. E que há ações conjuntas entre BPMTran e Agetran, pois ambos compõem o GGIT (Gabinete de Gestão Integrada de Trânsito). “Periodicamente, estão interagindo pelo trânsito de Campo Grande, estudando formas de minimizar os sinistros de trânsito”, informou. Quanto aos estudos sobre tráfego, ele informou que fica sob responsabilidade da Agetran.
De acordo com Carlos Guarini, referente às ações de fiscalização, a Agetran também utiliza informações geradas pelo grupo de trabalho composto entre os órgãos. Para os outros assuntos, o Campo Grande News entrou em contato com o Diretor de Trânsito Sidinei Oshiro, mas até o fechamento desta reportagem, mas não houve retorno.