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Capital

"Vai sobrar o quê?": moradores se preocupam com estrutura ferroviária da Capital

Houve pelo menos três desabamentos nas estruturas em menos de dois anos; o último foi ontem (7)

Por Cassia Modena e Idaicy Solano | 08/04/2024 10:58
Como era a antiga estação de trem de Campo Grande, quando estrutura estava inteira e trilhos ainda aguarrados à terra (Foto: Marcos Maluf)
Como era a antiga estação de trem de Campo Grande, quando estrutura estava inteira e trilhos ainda aguarrados à terra (Foto: Marcos Maluf)

"Vai sobrar o quê?", pergunta Suki Ozaka, que é moradora e conselheira da região urbana do Centro de Campo Grande, sobre os prédios que compõem a antiga ferroviária da Capital.

Foi por água abaixo, neste domingo (7), mais uma parte do teto do abrigo comprido onde eram guardadas as locomotivas.

Chuva e ventania que atingiram a região causaram o desabamento. Ali ao lado, moradores da Vila dos Ferroviários e quem estava na Feira Central, por volta das 12h30, levaram um susto ao ouvir o barulho.

Madeiras ao chão após o último desabamento (Foto: Marcos Maluf)
Madeiras ao chão após o último desabamento (Foto: Marcos Maluf)

Suki lamenta parte da memória da cidade estar desabando junto e lembra que o Complexo Ferroviário estava ativo há quase 20 anos.

Com o episódio de ontem, ela conta três desabamentos nos prédios em menos de três dos últimos anos. O primeiro deles foi em novembro de 2022. Isso sem falar em outros possivelmente ocorridos anteriormente.

Nesta segunda (8), representantes da Defesa Civil do Município, da Sectur (Secretaria Municipal de Cultura e Turismo) e do Iphan/MS (Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), foram até o local para interditar o galpão afetado e os demais.

A Defesa Civil visitou os moradores do entorno e os alertou para não entrarem espaço. Além disso, se analisa a proposta de cercar a área com tapumes.

"A qualquer hora" - Filhas de dois ex-ferroviários, Lucimara dos Santos e Eva Dias de Paula têm lembranças e fotos da época em que o trem passava por ali. Elas ainda moram na vila construída para os trabalhadores da ferrovia morarem.

A primeira, hoje aos 54 anos, sempre passa a pé ao lado das estruturas e também na rua que fica atrás do estacionamento da Feira Central, para ter acesso à Rua 14 de Julho.

Lucimara, 54, é filha de ex-ferroviário e passa sempre por lá (Foto: Marcos Maluf)
Lucimara, 54, é filha de ex-ferroviário e passa sempre por lá (Foto: Marcos Maluf)
Ela fazendo o caminho de sempre, ao lado dos imóveis da antiga ferrovia, para chegar à Rua 14 de Julho (Foto: Marcos Maluf)
Ela fazendo o caminho de sempre, ao lado dos imóveis da antiga ferrovia, para chegar à Rua 14 de Julho (Foto: Marcos Maluf)

Dia desses, conta ter pensado: "a qualquer hora isso aqui pode cair". Por isso, até procurava manter distância dos prédios da ferroviária abandonada.

Ela ouviu o barulho do último desabamento. "Comentei com minha mãe que era prédio da ferroviária caindo, ela achava que não. Agora vejo que foi o teto", relata. Lucimara mora na região desde os 16 anos.

Já Eva, aos 50, denuncia ter testemunhado furto de madeira, parafuso e trilhos do trem que ficavam próximos em outras ocasiões. "Teve gente que levou o trilho para construir muro e não gastar comprando ferro", diz.

Eva, também filha de ex-ferroviário, diz que dá tristeza ver o abandono (Foto: Marcos Maluf)
Eva, também filha de ex-ferroviário, diz que dá tristeza ver o abandono (Foto: Marcos Maluf)

"É triste, lamentável. Isso aqui é de cortar o coração em quatro pedaços. Minha revolta enquanto filha de ferroviário é essa. Bate saudade de a gente ver o trem passar no trilho", afirma Eva.

Denúncias - Suki afirma já ter feito cerca de dez denúncias relacionadas ao complexo ferroviário como conselheira.

"Fora o abandono dessa estrutura e o perigo de alguém se machucar, o conselho denunciou a 'minicracolândia' que estava se formando aqui e invasão para moradia", detalha.

Quanto à presença de usuários e pessoas vendendo drogas no local, ela afirma que "já foi resolvido". Já em relação à ocupação irregular, lembra que uma pessoa saiu da área por conta própria, após ter passado perto de se machucar durante um dos desabamentos.

Teto de outro imóvel do Complexo Ferroviário quase não existe mais (Foto: Marcos Maluf)
Teto de outro imóvel do Complexo Ferroviário quase não existe mais (Foto: Marcos Maluf)
Conhecido como rotunda, prédio arredondado onde se guardavam trens também foi isolado por fita (Foto: Marcos Maluf)
Conhecido como rotunda, prédio arredondado onde se guardavam trens também foi isolado por fita (Foto: Marcos Maluf)

Presidente do vizinho Bairro Cabreúva, Eduardo Cabral chama atenção para outros problemas. "Você anda no barro, não tem calçada e você ainda corre o risco de ser assaltado", fala.

Área bonita - A conselheira recorda que, até pouco tempo, o espaço ganhou vida com ensaios pré-casamento que usavam o cenário da arquitetura diferenciada da rotunda, onde eram guardados os trens no passado. No mesmo local, teve gravação de videoclipe do Michel Teló, ela destaca.

"É uma área bonita, só que agora está abandonada e feia", diz Suki.

Ela relembra os projetos públicos de revitalização do espaço que não avançaram durante os governos anteriores e cobra atenção ao complexo. "A gente fala, fala, faz denúncia para o poder público dar um jeito, mas estão esperando cair tudo", desabafa.

Patrimônio - Pela importância histórica, o Complexo Ferroviário de Campo Grande é patrimônio tombado nas esferas municipal, estadual e federal.

Este ano, proposta da Prefeitura de Campo Grande para reestruturar o complexo e transformá-lo em espaço cultural foi contemplada para receber R$ 800 mil em recursos do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) Seleções do Governo Federal.

O investimento servirá para dar andamento à parte executiva da reestruturação, relacionada à contratação de projetos de arquitetura e engenharia, segundo explicou o superintendente do Iphan/MS (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), João Santos. O Lado B deu detalhes da proposta, aqui. O projeto está em andamento e será discutido em reunião marcada para hoje (8) à tarde.

A reportagem questionou ontem a assessoria de imprensa do Município sobre a falta de manutenção do complexo que perdeu mais uma parte, mas não obteve resposta.

Hoje, em novo contato, a Sectur reforçou que o projeto arquitetônico de reforma do complexo ferroviário está em fase de construção e informou que ele "verificará a possibilidade de reaproveitamento das estruturas do local".

Matéria editada às 11h47 para acrescentar retorno da prefeitura.

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