Advogada acusada de ligação criminosa com líder do PCC é absolvida
Ela foi inocentada por falta de provas, mas TJ mudou sentença e decidiu que profissional agiu dentro da lei
Por maioria de votos, a 2ª Câmara Criminal do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) absolveu a advogada Raianni Caroline Almeida Passos, denunciada pelo Ministério Público acusada de “patrocínio infiel” por, supostamente, atuar em audiência de custódia a serviço de um dos líderes da facção PCC (Primeiro Comando da Capital) em Mato Grosso do Sul.
RESUMO
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A advogada Raianni Caroline Almeida Passos foi absolvida pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) da acusação de "patrocínio infiel". Ela havia sido acusada de repassar informações a um líder do PCC durante uma audiência de custódia. A decisão do TJMS, por maioria, reconheceu a atipicidade da conduta da advogada, que já havia sido absolvida em primeira instância por falta de provas. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/MS) interveio no caso, defendendo a imunidade profissional da advocacia. A decisão reforça que a orientação jurídica não configura crime de patrocínio infiel.
Com atuação em Dourados, Raianni já havia sido absolvida em primeira instância por falta de provas, mas seu advogado, Lucas Arguelho Rocha, recorreu ao TJMS para mudar a sentença.
A OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil, Secional de Mato Grosso do Sul), também interveio na qualidade de assistente, em defesa do exercício profissional e da imunidade da advocacia. No dia 28 de janeiro deste ano, foi publicada a decisão final da 2ª Câmara Criminal, atestando que Raianni Caroline Almeida Passos teve atuação estritamente profissional.
O caso – Na época secretária-adjunta da Comissão da Advocacia Criminal da OAB e presidente da Comissão de Direitos Humanos da 4ª Subseção em Dourados, Raianni Carolina foi denunciada pelo crime previsto no artigo 355 do Código Penal (“trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando interesse, cujo patrocínio, em juízo, lhe é confiado”). A pena prevista é detenção de seis meses a três anos, além de multa.
A denúncia foi feita no dia 3 de abril de 2023 mês pelo promotor de Justiça Maurício Mecelis Cabral, da comarca de Nova Alvorada do Sul. A advogada teria infringido a lei ao passar informações de processo criminal ao preso Matheus Maciel Fialho, na época recolhido no Estabelecimento Penal “Jair Ferreira de Carvalho”, em Campo Grande.
O caso envolvia o latrocínio (roubo seguido de morte) contra o professor Luciano Soares, ocorrido no dia 17 de janeiro de 2023 em Nova Alvorada do Sul. Seis pessoas foram presas pelo crime, todas pertencentes à facção criminosa.
Segundo o MP, Raianni Passos foi contratada como defensora de três acusados e os acompanhou na audiência de custódia, no dia 20 de janeiro, em Nova Alvorada do Sul.
“Ao invés de cumprir com seu dever profissional de defender os interesses de seus clientes, a ré Raianni constituiu-se nos autos com o único fim de repassar informações a Matheus Maciel Fialho, encaminhando-lhe cópia dos arquivos de mídia com os interrogatórios dos custodiados e garantindo, assim, que nenhum deles mencionaria seu nome nas investigações”, afirmava trecho da denúncia.
Segundo a investigação policial, Matheus Maciel Fialho estaria preocupado em saber se os presos iriam envolvê-lo no latrocínio, pois tinha sido o responsável em determinar abrigo a três envolvidos no crime, vindos do Paraná. Na época, a advogada disse que provaria sua inocência.
Ação improcedente - No dia 19 de março de 2024, o juiz Juliano Luiz Pereira, da comarca de Nova Alvorada do Sul, julgou a ação improcedente por falta de provas do suposto crime de “patrocínio infiel” por parte da advogada.
Tanto o MP quanto Raianni Carolina recorreram. A Promotoria pediu a condenação dela. Já a defesa da advogada pediu que ela fosse absolvida pela “atipicidade da conduta”. O corregedor-geral da OAB/MS, Luiz Renê Gonçalves do Amaral, também apresentou recurso para defender o exercício da profissional.
“O que se verifica é a tentativa ministerial de criminalizar o exercício profissional da advocacia criminal ao inferir, sem qualquer apoio fático nos autos, que a advogada legalmente constituída e com procuração juntada posteriormente aos interrogatórios extrajudiciais dos flagranteados, teria influído na qualidade dos referidos relatos para beneficiar terceira pessoa”, diz o recurso assinado pelo corregedor-geral.
Decisão do TJMS - Por unanimidade, a 2ª Câmara Criminal rejeitou o recurso do Ministério Público. Já por 2 votos a 1, os desembargadores decidiram alterar a absolvição da condição de “insuficiência de provas” para “atipicidade da conduta”.
“Além de inexistir provas no processo de quem teria sido a pessoa que supostamente repassava informações dos autos a um dos corréus, também não restou comprovado, segundo a própria sentença de primeiro grau, que tivesse havido, por parte da apelante [Raianni Carolina], traição na qualidade de advogada ou prejuízo a interesses cujos patrocínios em juízo lhes foram confiados. Ademais, deve ser reconhecida a atipicidade de sua conduta”, afirmou o relator, desembargador Ruy Celso Barbosa Florence.
O voto do relator foi acompanhado pelo desembargador José Ale Ahmad Netto. Já o desembargador Luiz Gonzaga Mendes Marques votou por negar o recurso do MP e também o da advogada, mantendo a sentença inicial, mas foi voto vencido.
“É preciso afirmar que a colega foi absolvida em primeira instância, todavia, após intervenção justa e firme da OAB/MS em defesa do exercício profissional, o TJMS reformou a capitulação para determinar a absolvição pela atipicidade da conduta, ou seja, a colega agiu estritamente dentro dos ditames éticos e profissionais. A decisão do TJMS reforça que a advocacia merece respeito acima de tudo, e mais, importante dizer que a advocacia jamais tolerará qualquer espécie de violação ou criminalização da atuação profissional”, afirmou o advogado Lucas Arguelho Rocha.
Em nota oficial divulgada nesta terça-feira (4) em sua página na internet, a OAB/MS afirma que, na qualidade de assistente, defendeu o exercício profissional e principalmente a imunidade da advocacia no caso da advogada Raianni Carolina.
“A OAB/MS, desde sua primeira manifestação, sustentou que a orientação jurídica a clientes não pode conformar o tipo penal previsto no art. 355 do CP, seja porque há incidência na espécie de regra de imunidade profissional (art. 23, III, do CP), seja porque não há enquadramento típico na atuação ainda na fase pré-processual”, afirma a nota.
Conforme a entidade, a rejeição da denúncia por ausência de provas de autoria “consagrava o entendimento de que qualquer advogado poderia ser denunciado pela prática do crime de patrocínio fiel naquelas condições narradas pelo MP”.
A OAB continua: “significando importante vitória para a advocacia, o TJMS alterou o fundamento absolutório para reconhecer que o advogado, na orientação de clientes na fase extrajudicial, não pratica o crime de patrocínio infiel, reafirmando a imunidade profissional, rejeitando a denúncia nos termos do art. 386, III, do CP”.
“Sempre acreditei nesse resultado, porém, não tenho palavras para expressar meu sentimento de gratidão. Quero externar meus sinceros agradecimentos ao nosso presidente Bitto Pereira e também ao corregedor-geral Luiz Renê. A OAB/MS teve papel fundamental e só demonstra o trabalho incansável pela defesa das nossas prerrogativas e exercício da advocacia”, comentou a advogada.
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