Carga recorde de maconha expõe "falsa impressão" de fronteira fechada em MS
Diretor do DOF diz que fronteira fechada impede cidadão comum, mas tráfico tem incontáveis trieiros e vicinais à disposição
A apreensão de 33,3 toneladas de maconha em estrada vicinal de Maracaju, distante 141 quilômetros de Campo Grande, expõe realidade que a pandemia não conseguiu frear. “É uma falsa impressão de fechamento da fronteira”, diz o diretor do DOF (Departamento de Operações de Fronteira), tenente-coronel Wagner Ferreira da Silva.
A carga encontrada na carreta bitrem ontem (26) é o terceiro recorde quebrado somente este ano de apreensão de drogas. Os outros dois flagrantes, de 22 e 28 toneladas, foram feitos em operações da PRF (Polícia Rodoviária Federal), uma delas, em conjunto com a PF (Polícia Federal).
O veículo estava em estrada vicina próxima da MS-166, em Maracaju, na região de acesso de Antônio João com a fronteira com Paraguai.
Os dois “batedores”, responsáveis pela fiscalização na estrada, foram presos na operação. O motorista correu para região de matagal e não foi localizado. Ele deixou para trás carreta bitrem acoplada, lotada de pacotes de maconha, sem qualquer carga de milho ou soja, produtos usados para disfarçar o transporte.
Segundo a polícia, seria mais um carregamento feito em consórcio pelos traficantes para abastecer os grandes centros consumidores, como São Paulo e Paraná. A carga foi levada para a sede do DOF, em Dourados.
O diretor do DOF diz que a fronteira fechada decorrente da crise pandêmica da covid-19 impede o trânsito do cidadão comum, mas não é empecilho para o tráfico, que tem à disposição incontáveis estradas vicinais nas fronteiras com Paraguai e Bolívia. “O cidadão não tem noção de como é: nas áreas rurais os limites entre os países é uma estrada”, explicou.
Com o Paraguai, são 730,8 quilômetros de fronteira seca, 1,5 mil quilômetros incluindo ainda o trecho territorial com a Bolívia. “A fronteira é muito permeável, são incontáveis estradas, tem lugar que nem tem estrada, são trieiros, áreas de campo". Em Mato Grosso do Sul, a região agrícola também favorece a passagem das carretas que, mesmo maiores, acessam estradas vicinais abertas para dar vazão à produção.
Demanda - Wagner Silva diz que grandes carregamentos, sem qualquer disfarce, não era flagrante usual. Novamente, essa modalidade pode ser efeito da pandemia da covid-19.
O diretor do DOF diz que a quarentena inicialmente mais rigorosa tirou muita gente das estradas, pessoas que tinham hábito de visitar cidades vizinhas. O menor fluxo impactou na fiscalização e pode ter deixado o narcotráfico mais cauteloso. “Agora, com pouco mais de relaxamento, estão retirando a demanda reprimida em grande escala”.
Segundo ele, outros fatores que podem ter contribuído são aumento do consumo, também reflexo da ansiedade criada com a pandemia e a Operação Hórus, em que há compartilhamento de informações dos governos federal e estadual, resultando investigação mais precisa.
Origem – os dois batedores presos disseram não saber para onde a carga seria levada, o que também pode fazer da estratégia dos traficantes, de dividir funções e informações para evitar vazamento da logística. “O crime organizado trabalha em células, eles podem ter sido contratados para determinado trecho, ainda não sabemos, pode ser de Ponta Porã a Maracaju ou de Maracaju para frente”.
A equipe faz trabalho de perícia esta manhã para levantar dados que possam indicar a origem da droga. O carregamento está avaliado em R$ 50,3 milhões.