Fronteira com Paraguai é terra onde crime organizado se mistura à política
Vice de candidata que denunciou atentado político foi preso na Operação Malote em 2017
A fronteira de Mato Grosso do Sul com o Paraguai é considerada terra de ninguém devido à forte presença de organizações criminosas que controlam o tráfico de drogas e de armas e o contrabando.
São comuns as execuções como a ocorrida na tarde de domingo (8) durante evento da campanha eleitoral no centro de Coronel Sapucaia, cidade a 400 km de Campo Grande e separada de Capitán Bado (Paraguai) apenas por uma rua.
Também é comum a estreita ligação do crime organizado com o poder público. Na Linha Internacional, crime e política se misturam. Traficante vira político no mesmo ritmo em que político se envolve com o negócio das drogas.
A incômoda situação não é exclusividade de Coronel Sapucaia. Mas a cidade de 15 mil habitantes, onde três candidatos a prefeito disputam o voto de 11 mil eleitores no pleito eleitoral do próximo domingo, tem um caso emblemático.
O atual presidente da Câmara de Vereadores, João Batista de Andrade (PSD), o “João do Banquinho”, candidato a vice-prefeito na chapa encabeçada pela também vereadora Claudinha Maciel (PSD), foi alvo de operação da Polícia Federal em 2017 por suspeita de ligação com o tráfico internacional de drogas.
Horas após a execução de domingo, Claudinha divulgou vídeo nas redes sociais indicando suspeitar de atentado político, pois, além de Aníbal Ortiz, 45, morto a tiros por dois pistoleiros, duas pessoas da campanha e o marido dela foram feridos pelos disparos.
Hoje (9), o secretário estadual de Justiça e Segurança Pública Antonio Carlos Videira afirmou que o crime está ligado ao tráfico de drogas e descartou motivação política. Claudinha e João do Banquinho disputam os votos com o atual prefeito Rudi Paetzold (MDB), candidato à reeleição, e com o servidor público Patrick Pereira (DEM).
Operação Malote - Eleito vereador com 327 votos em 2016, João Batista de Andrade, 36 anos, foi um dos oito presos no dia 28 de abril de 2017 na Operação Malote, desencadeada pela Polícia Federal no Paraná, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Rio de Janeiro.
Natural de Cianorte (PR), João do Banquinho, como é conhecido na cidade, era vendedor e representante comercial antes de entrar para a política. Além dele, a PF prendeu outras sete pessoas em Mato Grosso do Sul, entre elas o policial militar Ivanildo Gomes da Silva.
Cinco veículos seminovos de alto padrão foram apreendidos naquele dia e confiscadas casas de luxo e uma fazenda, com mil cabeças de gado.
O chefe da quadrilha, Adriano Augustin Calonga Lechuga, conseguiu fugir da operação naquele dia, mas foi preso em janeiro de 2018 no Paraguai e entregue à polícia brasileira.
Segundo a PF, os integrantes da quadrilha da qual João do Banquinho faria parte levavam vida de ostentação, com patrimônio superior a R$ 40 milhões.
O processo com 29 réus, entre eles João do Banquinho, Adriano Calonga Lechuga, o irmão dele Fabio Calonga Lechuga e o PM Ivanildo Gomes da Silva ainda tramita na Justiça Federal no Paraná. O Campo Grande News ainda não conseguiu falar com o candidato a vice-prefeito.
Outros casos – O presidente da Câmara de Coronel Sapucaia não é o único político daquela região de Mato Grosso do Sul enrolado com a Justiça por suposta ligação com o crime organizado.
O caso mais conhecido é do atual prefeito de Aral Moreira Alexandrino Arévalo Garcia (PSDB). Preso pela Polícia Federal em fevereiro de 2016 na Operação Materello quando era vereador, Alexandrino foi condenado a sete anos de prisão, recorreu ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) e conseguiu reduzir a pena para 4 anos e 8 meses.
Neste ano, o prefeito conseguiu liminar do ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), para suspender a condenação.
Entretanto, a candidatura dele foi indeferida no mês passado pela Justiça Eleitoral por contas rejeitadas pelo TCU (Tribunal de Contas da União) em 2013, quando era presidente da Câmara.
Alexandrino Garcia recorreu da impugnação e continua em campanha. Ele tem três adversários na eleição do próximo domingo: Angélica Marques (PSD), Renato Marques Brandão (MDB) e Silvana Cordeiro (Patriota).
PCC – Na mesma cidade de Alexandrino Garcia, outro candidato é investigado por ligação com o crime organizado. Apontado como membro da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), Rafael Santana de Souza, 32, o “Rafael Chupim”, faz campanha para a Câmara de Vereadores, monitorado por tornozeleira eletrônica.
Filiado ao MDB, ele foi preso no dia 25 de junho deste ano durante operação da Polícia Federal que apreendeu 503 quilos de maconha em Ponta Porã. No mês seguinte saiu em liberdade provisória sob monitoramento eletrônico.
O processo cita fortes indícios da participação de Rafael Chupim no tráfico de drogas por estar em casa contígua ao imóvel onde foram encontrados integrantes do PCC ligados a Elton Leonel Rumich da Silva, o “Galã”, um dos líderes da facção na fronteira. Rafael negou envolvimento com o tráfico de drogas e disse estar na casa porque mantinha relacionamento com garota de programa.
Detalhe que chama a atenção na campanha de Rafael Chupim nas redes sociais é a hashtag “EuSou15%”. O 15 é o número do partido dele, o Movimento Democrático Brasileiro, mas também poderia ser referência ao “1533”, código pelo qual o PCC é conhecido.
“Não tenho nada a ver com essa facção, não sei o que é isso. Sou trabalhador. A cidade me conhece, pode puxar minha ficha, sempre trabalhei com agronegócio, sou classificador de grãos”, disse Rafael Chupim ao porto Uol.
A candidatura de Rafael Chupim foi deferida pela juíza eleitoral Sabrina Rocha Margarido João no dia 19 de outubro. O depoimento dele no processo da meia tonelada de maconha está marcado para sexta-feira (13), dois dias antes da eleição.