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Interior

Informado por reportagem, promotor cobra explicação sobre baleado em cela

Em ofício, diretor do presídio escondeu informação sobre disparo e existência de armas nas celas

Helio de Freitas, de Dourados | 17/09/2021 16:28
Agentes do Comando de Operações Penitenciárias em pente-fino no dia 1º, na PED (Foto: Arquivo)
Agentes do Comando de Operações Penitenciárias em pente-fino no dia 1º, na PED (Foto: Arquivo)

A direção da PED (Penitenciária Estadual de Dourados) escondeu do Ministério Público que um preso do raio III foi ferido com tiro no pé esquerdo por colega de cela, no final de agosto deste ano. O caso comprovou presença de armas na PED e foi mostrado com exclusividade pelo Campo Grande News, no dia 1º deste mês.

O promotor Juliano Albuquerque, titular da 8ª Promotoria, só ficou sabendo do episódio por meio da reportagem. No ofício enviado no dia 2 relatando o resultado da vistoria feita pelos agentes penitenciários nas celas do raio III justamente por causa do disparo, o diretor da PED Antonio José dos Santos omitiu o ferimento à bala de um dos internos.

Questionado pelo promotor sobre as informações divulgadas pela reportagem, Antonio José dos Santos não teve como esconder o ocorrido e admitiu o disparo dentro da cela. Entretanto, alegou não ter informado o caso antes, porque o documento enviado ao Ministério Público foi apenas para relatar o resultado do pente-fino.

A história – No dia 1º deste mês, o Campo Grande News divulgou com exclusividade que duas pistolas semiautomáticas (calibres 40 e 9mm), 187 munições e até uma granada tinham sido encontradas em um buraco na cela 24 do raio III.

O pavilhão III é dominado por bandidos rivais da facção PCC (Primeiro Comando da Capital), a chamada “oposição”. As duas organizações estão em guerra pelo controle do tráfico nos bairros de Dourados.

O armamento seria para enfrentar os faccionados do PCC em caso de rebelião. A facção paulista ocupa o raio II da PED. Até agora não foi esclarecido como duas pistolas, farta munição e até uma granada entraram no maior presídio de Mato Grosso do Sul, considerado de segurança máxima.

A reportagem também revelou que o pente-fino, com apoio do Cope (Comando de Operações Penitenciárias), foi determinado após a descoberta de que o preso Ualison Domingos da Silva, 23, tinha sido ferido com tiro no pé.

O ferimento ocorreu no dia 28 de agosto, mas o caso estava sendo abafado pela direção do presídio. Só no dia 1º, durante o pente-fino, o preso foi retirado da cela e levado ao setor de saúde da penitenciária.

Raio-x mostra ferimento de bala no pé esquerdo de preso da PED. (Foto: Reprodução)
Raio-x mostra ferimento de bala no pé esquerdo de preso da PED. (Foto: Reprodução)

Exame de raio-x ao qual a reportagem teve acesso, confirma o ferimento à bala, com entrada na parte superior e saída na parte inferior do pé esquerdo de Ualison da Silva.

O boletim de ocorrência foi registrado no mesmo dia do pente-fino, na 2ª Delegacia de Polícia Civil. O preso disse aos policiais que estava dormindo e “não viu nada”. Contou que escutou o disparo e quando percebeu, estava com o ferimento no pé. Seguindo o código de silêncio dos presídios, Ualison afirmou não ter visto arma na cela, tampouco quem tinha disparado o tiro.

“Esqueceu” – Um dia depois do pente-fino, o diretor Antonio José dos Santos mandou o ofício número 622 ao promotor Juliano Albuquerque informando o material apreendido nas celas do raio III – incluindo as armas, munições, granada, pólvora, maconha, 49 celulares, 224 facas artesanais, frascos de coquetel Molotov e até um roteador de internet.

Como o ferimento a tiro de um detento não foi relatado, no dia 8 de setembro, o promotor enviou ofício ao diretor da PED com prints da reportagem do Campo Grande News, cobrando esclarecimento sobre as razões pelas quais o fato deixou de ser mencionado no ofício nº 622.

Na quarta-feira (15), o diretor do presídio mandou outro ofício ao promotor, alegando não ter mencionado a notícia, porque o ofício anterior (622) tinha sido apenas para relatar a operação do dia 1º de setembro no raio III.

“No dia 31 de agosto do ano corrente, o chefe de segurança recebeu a informação de que na cela 37 do raio III, havia um interno ferido no pé por um projétil de arma de fogo desde a data de 28 de agosto, estando o mesmo impedido de ir ao setor de saúde pelos companheiros de cela. Imediatamente, fora deslocada uma equipe da segurança para averiguação e revista na própria cela, sem êxito em encontrar a suposta arma de fogo”, afirma o diretor.

Ualison Domingos da Silva foi encaminhado ao setor de saúde para atendimento médico e depois, escoltado até a UPA (Unidade de Pronto Atendimento).

“Primeiramente o interno negou tratar-se de ferimento à bala. Porém, após atendimento com o médico desta penitenciária, alegou que estava dormindo, acordou com o barulho e se deparou com a perfuração no pé, mas não presenciou arma de fogo na cela”, explicou Antonio José dos Santos ao promotor.

Ainda no documento, o diretor afirma que todos os procedimentos para a averiguação dos fatos estão sendo feitos. O promotor ainda não se manifestou após a resposta do diretor, mas a tendência é que inicie investigação sobre o caso.

Escândalos – Com 2.700 presos, a Penitenciária Estadual de Dourados é marcada por seguidas denúncias de corrupção interna, facilitação de fugas de traficantes internacionais, uso de mão de obra de preso para interesse particular e até escândalo sexual.

Nesta semana, o Campo Grande News revelou que desde junho deste ano, o Ministério Público investiga denúncia de que empresa contratada pela Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário) por R$ 16,5 milhões por ano, está fornecendo comida podre aos presos e servidores da PED.

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