O relato de quem viu de perto as cenas da tragédia que matou jovens no RS
“Nunca, jamais vi algo assim na minha vida. Era cena de filme de guerra”. A declaração é da estudante de Economia, Rafaela Goetterms, 19 anos. Gaúcha, a universitária mora há dois anos em Santa Maria e na madrugada de hoje viu o que tentou descrever. O incêndio na boate Kiss que matou três amigos dela e ainda deixa mais quatro desaparecidos.
A jovem estava na casa de colegas próximo à boate quando viu as notícias da tragédia pelas redes sociais, postadas por quem conseguiu sair da festa quando o incêndio começou. “Cheguei lá era 3h30. Bombeiros, polícia e ambulâncias estavam lá e a maioria das pessoas já tinha saído de dentro”, relata.
A primeira impressão dela e dos amigos foi desesperadora. “Choque eu acho. Não dá para decifrar. Era gente correndo e chorando para todo lado. Gente machucada subindo a rua, sirenes de carros de Polícia”, descreve.
Rafaela foi até o local porque sabia de amigos que tinham ido à festa, mas em meio à confusão do incêndio e socorro às vítimas, ela não conseguiu ver ou falar com nenhum deles. A estudante ficou até às 6h da manhã acompanhando o resgate dos corpos em frente à boate. “Vim embora quando vi gente morta, era demais para mim”.
A jovem contou ao Campo Grande News que costuma frequentar a boate, mas que neste sábado não foi porque está no período de provas. Sobre a estrutura do local, ela relata que só existem seguranças e extintores. “O ruim mesmo é que só tem uma porta para sair de dentro. Tem duas rotas, mas que levam para a mesma porta de saída”, declarou.
O clima na cidade é de comoção geral. Rafaela conta que toda população está arrasada e procurando conhecidos vivos. A tragédia chocou quem trabalha com notícias. Ao Campo Grande News, o jornalista há mais de três décadas, Vicente Pascotini, 53 anos tenta repassar o sentimento da cobertura feita desde a madrugada.
“É um clima de comoção. Uma situação completamente inesperada, incontrolável, inenarrável”. Sobre a estrutura da cidade para uma tragédia como essa, Vicente comenta que Santa Maria não está preparada e que inclusive se está falando em um velório coletivo dos 232 corpos.
“Eu tenho três filhos na idade desses jovens e pelo menos um poderia estar lá. Só não foi porque estava cansado. Eu nunca vi nada parecido. Os jornalistas que sempre estão fazendo a cobertura de fora, hoje nós todos estamos dentro da notícia. Porque todos nós perdemos amigos, parentes ou filhos de amigos”.
Por telefone a professora Roseli Khol, que mora em Coxim, em Mato Grosso do Sul, mas está na cidade gaúcha para visitar a mãe, conversou com o Campo Grande News.
O clima em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, é “desesperador”, tentou traduzir. Roseli disse que não se fala em outro assunto na cidade e que a dor das famílias é muito grande, com tantas mortes de jovens. “Era uma festa de universitários e terminou nesta tragédia”.
Em Campo Grande o drama afetou também que tem parentes na cidade. A jornalista Aline Kraemer contou do horror que foi ver as notícias pela TV. Com uma prima que estuda Medicina Veterinária em Santa Maria, a jornalista se desesperou quando soube do incêndio.
“Vamos ver a Cris, se está tudo ok, eu disse para minha mãe. Ela é estudante da universidade federal. Aí ela falou para a gente que não estava na cidade. Mas se eu tivesse visto que a festa era de Veterinária, eu teria apavorado ainda mais”, contou.
Santa Maria, com 262 mil habitantes, é a quinta maior cidade do Rio Grande do Sul. A última contagem dos bombeiros revela ao menos 232 mortos no incêndio. O Governo do Estado do Rio Grande do Sul decretou sete dias de luto oficial e a Prefeitura de Santa Maria, 30 dias.