Brimos, a conexão esfiha-feijoada, pouco e mal contada
Não há muitos estudos sobre a imigração sírio-libanesa para o Brasil. Apesar da influência desses povos na formação do Brasil, os historiadores privilegiaram os italianos, portugueses, alemães e espanhóis, que ficaram marcados pela industrialização. Mas há um problema de contingência histórica: o Líbano não existia como Estado quando essas pessoas migraram para o Brasil, razão pela qual vieram com passaportes otomanos. Esse o motivo de serem chamados de "turcos", o centro otomano era a Turquia. "Turcos", era uma alcunha pejorativa que ainda sobrevive.
Os únicos que não vieram subvencionados por um governo.
A história de minha família começa em uma pequena cidade amuralhada denominada Montagnana di Padova. Em procissão, saíram em direção à "Merica", um lugar distante que chamamos América. Tomaram um navio a vapor em Genova, pago pelo governo italiano. Essa é a mesma história de espanhóis, suecos, alemães...... uma plêiade de europeus que vieram "fazer a América", receber uma terrinha, enriquecer e voltar a seus países de origem. Mas essa não é a história dos brimos. Eles vieram com seus próprios recursos, sem promessa alguma de serem bem recebidos pelo governo brasileiro. Nunca ganharam nem um "obrigado". Também tudo é mais difícil para eles, nos documentos daquele período, é difícil saber com exatidão quem saiu dos territórios que hoje conhecemos como Líbano e Síria, embaralhando as estatísticas. É por isso que é inevitável falar em sírio-libanês, com hífen, unindo esses dois povos.
À margem da história oficial brasileira.
Eles também foram os únicos povos que não passaram pela famosa Hospedaria dos Imigrantes. Assim, não deixaram um rastro sequer de seus documentos e dados de origem. Com isso, permaneceram à margem da história. Mas há outro obstáculo - comum a todos os imigrantes - que é a língua. Seus documentos estão em árabe, causando enormes dificuldades com uma língua escrita da direita para a esquerda e com uso de consoantes e raras vogais.
Norma Trad conta a odisseia.
Uma raridade. Norma Trad conta, na revista de história "Arca", a chegada dos duzentos brimos em território sul-matogrossense. Diz que esses duzentos primeiros brimos passaram pelo Uruguai e Argentina, antes de chegar a Corumbá. E lá permaneceram o tempo necessário para "um descanso merecido de longa e estafante viagem, para a adaptação aos costumes e idiomas". Ainda mais rara é a lista dessas pessoas que aqui chegaram, enumerada por ela. No mesmo número dessa revista, há uma pequena história de armênios, palestinos e sírios que vieram para Campo Grande.
A pequena biblioteca dos brimos.
Muito estranho. Os brimos não desejam contar suas histórias? A biblioteca desse tema é minúscula. A obra seminal é "Patrícios: sírios e libaneses em São Paulo", de Oswaldo Truzzi. A história oral ficou por conta de "Imigração Árabe no Brasil", de Samira Adel Osman. Um tom mais geral é "Os libaneses", de Murilo Meihy. "Sírios e libaneses" do norte-americano Clark Knowton, é fonte para qualquer estudo serio sobre esses povos. A biblioteca pode ser completada com o único relato escrito de um libanês no "A emigração sírio-libanesa às terras da promissão" de Taufik Duoun.