Como a linguagem afeta o envelhecimento
Quando Ferreira Gullar morreu, o país perdeu uma de suas vozes poéticas mais influentes. Até 2016, ano de seu falecimento, era considerado o maior poeta do país. Até seus últimos dias, continuou a escrever e mudar de opinião... como se fosse um jovenzinho. Um de seus mais afamados discursos foi feito em 2014, quando já tinha 84 anos e ostentava toda a lucidez, criticava o socialismo que havia aderido na juventude, com toda a sua histórica leveza de pensamento. Mas Gullar não foi o único idoso a permanecer prolífico até a idade avançada. Herman Wouk foi o campeão. Tinha 97 anos quando publicou seu romance final, "O Legislador".
Tais feitos literários destacam um ponto importante: a idade não diminui nossa capacidade de falar, escrever e aprender novos vocabulários. Nossa visão pode diminuir. Nossa lembrança pode vacilar. Mas nossa capacidade de produzir e compreender a linguagem é bem preservada até os últimos dias.
Para aqueles que podem temer a perda da capacidade de linguagem à medida que envelhecem, há muitas boas notícias a serem relatadas.
Habilidades linguísticas são como o vinho: melhoram com a idade.
Alguns aspectos de nossas habilidades linguísticas, como o conhecimento do significado da palavras, melhoram na metade e no final de nosso tempo na terra. Um estudo descobriu que os idosos que vivem em uma comunidade de aposentados, próximo a Chicago, tinham um tamanho médio de vocabulário superior a 21.000 palavras. Os mesmo pesquisadores compararam com uma amostra de universitários e descobriram que seus vocabulários médios eram de tão somente 16.000 palavras.
Em outro estudo realizado com falantes de hebraico, descobriu que pessoas com idade média de 75 anos tinham um vocabulário muito mais rico que jovens e adultos de 40 anos.
Como um canário em uma mina de carvão.
É bem conhecida a antiga prática de levar um canário para as minas de carvão. Eles têm a capacidade de prevenir desastres. Começam a cantar loucamente quando uma queda de pedras na mina está para ocorrer. Assim também funciona nossa capacidade de absorção do vocabulário. Podem sinalizar um comprometimento mental futuro décadas antes que tais problemas se manifestem.
As freiras comprovam a importância do vocabulário.
Em 1996, o epidemiologista David Sonwdon e uma vasta equipe, estudaram mulheres que se tornaram freiras. Descobriram que a complexidade gramatical dos ensaios escritos por elas quando ingressaram em suas respectivas ordens religiosas poderia prever quais irmãs desenvolveriam demência muitas décadas depois. Essa é considerada a melhor pesquisa de todos os tempos sobre a relação vocabulário e envelhecimento pois centenas de freiras doaram seus cérebros, para essa pesquisa, no pós mortem. Isso permitiu diagnósticos conclusivos de demência. Não resta dúvida, a ciência explica e prevê a demência pela capacidade das pessoas de adquirirem e conservarem vocabulários.
Não largue esse livro. Melhor que a saúde física, só a mental.
A leitura e a escrita impedem o nosso declínio cognitivo, nossa capacidade de entendimento do mundo que nos cerca. Manter um diário, por exemplo, demonstrou reduzir substancialmente o risco de desenvolver várias formas de demência, incluindo o mal de Alzheimer.
A leitura de ficção, entretanto, está associada a uma vida útil mais longa. Um estudo de larga escala, realizado pela Universidade de Yale, descobriu que as pessoas que leem livros por 30 minutos diariamente vivem, em média, quase dois anos a mais que os não-leitores. Não largue esse livro. Ele "lubrifica" suas "rodas cognitivas".