Existirá um apocalipse climático?
As palavras mudam. Um carro até pouco tempo tinha cavalos na frente. Um piloto era um marinheiro. Uma avó era uma mulher de quarenta anos. Mas não há palavras que tenham mudado tanto como a "apocalipse". É pura confusão. No original grego significava "revelação", mas também significava "ocultamento". O mais estranho é que deveriam ser antônimos, mas viraram sinônimos. Esses gregos.......
O fim do mundo.
O autor do livro que leva esse nome a usou para dizer que suas histórias revelavam muito. Mas o poder desse livro foi tão grande que a palavra ficou presa em seu novo sentido: fim do mundo. Esse senhor desconhecido foi um dos grandes escritores da história. Aceitamos que se chamava João. Era um cristão que o imperador Domiciano exilou na ilha grega de Patmos, mais ou menos oitenta anos depois de Cristo. Não sabemos mais nada.
A caverna de João.
O turismo grego diz que João viveu em uma caverna. Está perto de um caminho muito sinuoso. Quando o ônibus dos turistas passa perto, o guia grita : "apokalipsi", "apokalipsi". Os passageiros olham nervosos. Depois riem. A cova tem uma janela pequena e triangular voltada para o mar. Um mar bravio, com frequentes tempestades que talvez o inspiraram. O apocalipse de João conta o que acontecerá quando Deus se cansar deste mundo podre. Os relatos são tremendos, filme de terror. Monstros, chamas e catástrofes. Todas as armas da cólera divina.
O apocalipse nuclear.
Era uma ficção esplêndida. Só que ninguém acreditava que fosse uma ficção. Aquele texto foi muito mais que um texto por dois mil anos. Durante esse longo tempo, os homens e as mulheres esperaram que aquela revelação se realizasse. Nunca aconteceu. E nem tinha como acontecer. Até que inventaram a bomba nuclear. Pela primeira vez, a destruição era humanamente possível. Uma ameaça certa. Mas, ao contrário das palavras de João, uma guerra nuclear não abriria a porta para algo melhor, para o julgamento dos humanos. Seria apenas e tão somente a destruição de todos.
E o apocalipse climático?
Se não bastasse o apocalipse nuclear, criamos a possibilidade do climático. Vivemos em estado apocalíptico. É uma sensação tão estendida, tão mal entendida, de que todos se vão para o cara... (perdoem o palavrão, mas é preciso usar frases fortes). Creio que os apocalipses, como os vírus, não são tontos. Sabem que se nos matarem, os primeiros prejudicados serão eles: desaparecerão. Os apocalipses necessitam de nós. Mas temos de ir trabalhando, passo a passo, para que o climático se comporte como o nuclear: fique guardado em alguma cova, em algum silo.