Morte sem dor? A pandemia mudou essa percepção
A morte, em todas as culturas, está codificadas em rituais mais ou menos complexos, onde as pessoas se consolam. Em alguns lugares, de forma muito radical, como entre os Toraja da Indonésia, levam para passear seus falecidos, os deixam secar ao sol e, anos depois, tiram fotografias com eles. Nos países ocidentais, o velório é um ritual de despedida essencial. Por medo do vírus, foi proibido. Uma linha vermelha que deveríamos ter pensado muito em cruzar.
Eliminamos um dos rituais mais sagrados.
Nossos parentes e amigos não morreram sozinhos porque médicos e enfermeiros fizeram um trabalho espetacular, pagando um enorme preço. Mas saltamos uma das coisas mais sagradas que temos na sociedade. Não pela falta de funerais. As cifras das vítimas e a falta de imagens de nossos falecidos, produziu um efeito de anestesia. Que repercussão terá em nossas mentes?
Vulnerabilidade e fragilidade.
A pandemia escancarou nossas vulnerabilidades e fragilidades. Estão presentes em nossos empregos, na capacidade da ciência, em nossas organizações políticas e sociais. Ainda que a fé quase religiosa na ciência foi recuperada em parte com as vacinas, permanece a sensação de que a medicina não nos protege de tudo.
Muito racional... até que a morte se aproxime.
A escritora francesa Simone de Beauvoir dedicou um livro à morte de sua mãe. "Uma morte muito doce" reflete sobre como sempre tinha pensado que o falecimento de pessoas idosas fazia parte da vida. Ela não entendia a dor de seus amigos quando os país faleciam. Todavia, diz Beauvoir, todas suas teorias caíram por terra quando sua mãe morreu. A pandemia obrigou milhares de famílias a passar por essa experiência brutal. Não há uma morte natural. Não há uma morte aceitável. Toda morte é acidental. Uma violência inusitada.