O mistério genético dos cítricos
A nova laranja de laboratório
Apreciados em todo o mundo por seu sabor, os cítricos foram durante séculos uns dos cultivos de maior valor econômico. Surgidos na Ásia, foram domesticados há pelo menos 3.300 anos, ainda que no princípio eram tão ácidos que os humanos não conseguiam comer. Também por séculos não sabíamos quando, como e onde apareceram os cítricos doces. Um recente estudo resolveu a misteriosa origem dos cítricos doces e também deram a pista para que um laboratório inglês comece a criar uma laranja mais saborosa e, ao mesmo tempo, mais saudável.
Córsega ou China?
A hipótese mais aceita até agora era que a transformação dos cítricos em frutos comestíveis acontecera há poucos séculos. A ilha de Córsega era a candidata ao título de "local de origem dos cítricos comestíveis". Em grande medida porque foi lá que surgiu a cidra corsa, também conhecida como cidra doce. Todavia, uma pesquisa realizada pelo "John Innes Centre", da Inglaterra, baseada na análise genética de múltipla variedades, descobriram que os cítricos doces são resultantes da mutação de um único gene surgido na China.
A grande viagem dos cítricos.
A complexidade dos cítricos e sua intrigante evolução se deve a compatibilidade sexual entre as distintas espécies, que gerou centenas de variedades. Os três originais foram os pomelos, as tangerinas e as cidras. A laranja doce é um intricado híbrido de tangerina e pomelo que surgiu em algum lugar da China e desapareceu.
Inicialmente, os cítricos foram cultivado e vendidos por suas propriedades curativas e medicinais, sua intensa fragrância e seus ornamentos florais. A cidra, o primeiro cítrico que se difundiu, conseguia viajar por longo tempo e duras condições climáticas devido a seu grosso epicárpio, a parte branca da casca. Ela era empregada na medicina chinesa e na hindu como anti-inflamatório e analgésico e para melhorar a digestão.
Graças aos botânicos que acompanharam Alexandre Magno em suas campanhas, no século IV a.C., sabemos que a cidra era cultivada nessa época em quase todo o Oriente Médio. Graças à diáspora dos judeus, no tempo do Império Romano, a cidra se estabeleceu em toda a região mediterrânea. Os primeiros limões aparecem em Roma no século I d.C. . A laranja, a lima e o pomelo, foram para a Europa no século X d.C., junto com a expansão muçulmana iniciada na Espanha.
A laranja bem brasileira.
Quando os portugueses trouxeram da Espanha as plantas cítricas tinham como objetivo criar um abastecimento de vitamina C, ou melhor, mesmo não conhecendo essa vitamina, sabiam do valor dos cítricos para combater o escorbuto, doença que eliminava as tripulações das naus e caravelas. A adaptação da laranja no solo brasileiro foi tão incrível que, logo a seguir, as novas levas de portugueses acreditavam que era uma laranja brasileira a que comiam. A primeira laranja brasileira tinha forte sotaque nordestino, surgiu na Bahia, por volta de 1800, em um pomar do Bairro da Cabula em Salvador. Era uma laranja doméstica, típica de quintais. Foi à partir dessa laranja baiana, e de sua propagação através de mudas enxertadas que a citricultura tornou-se um ramo da agricultura brasileira.
A nova laranja vem aí.
Aclarado o mistério genético da origem dos cítricos, essa pesquisa inglesa abriu as janelas para o conhecimento e criação de novas variedades. É bem possível que ainda neste ano acabem de criar uma nova variedade de laranja que combine as propriedades da laranja comum com os benefícios para a saúde da laranja sanguínea. Essa variedade sanguínea é o único cítrico que acumula antocianinas - pigmentos vermelhos, azuis e púrpuras - com numerosas propriedades saudáveis. O grande obstáculo para o cultivo dessa laranja sanguínea é que só ocorre em ambientes frios. A nova variedade que estão construindo na Inglaterra além de unir laranja comum com sanguínea, também promete resolver o problema da temperatura.