O sobá é a primeira fast-food do mundo
Ao contrário do que muitos imaginam, os sanduíches do Mac Donalds não são a primeira fast-food da história. O primeiro prato com essa característica - ser servido rapidamente - é um velho conhecido do campo-grandense: o sobá. Sua criação remonta aos anos 1.700 na cidade de Edo, no Japão. Essa cidade chegou a atrair mais de um milhão de pessoas, tornando-a a cidade mais populosa do mundo na época. Esse movimento de pessoas literalmente transformou a cidade e causou um dos problemas pelo qual Tóquio é conhecida até hoje: a alta densidade populacional e a falta de espaço em boa parte das moradias. Para suportar a expansão demográfica, foram construídas inúmeras habitações populares, conhecidas como "nagayas", que tinham, em média, pouco menos de 20 metros quadrados de área útil. O suficiente para se deitar e dormir após o trabalho.
Por serem tão pequenas, era pouco confortável e pouco seguro cozinhar dentro delas, e os moradores da cidade passavam a maior parte do dia fora de suas casas. Foi nesse cenário que surgiram as primeiras "yatai", barracas móveis em que se vendiam vários tipos de alimentos como o sushi, enguias grelhadas e tempuras de frutos do mar e legumes. As refeições eram razoavelmente rápidas e muito práticas.
Entra em cena o macarrão na alimentação japonesa.
Foram os templos zen-budistas que introduziram o macarrão no Japão. E ele se encaixava perfeitamente nos pratos que por lá existiam. Assim, o macarrão deixou os templos - em muitos era uma comida ritual, sagrada - para ganhar as ruas. O problema era que o prato preparado pelos monges era feito à base de trigo, proveniente da China e insuficiente para atender à demanda dos grandes centro consumidores japoneses.
A questão foi resolvida com a inovação dos cozinheiros japoneses, que resolveram se arriscar e experimentar uma espécie de trigo muito cultivada nas terras do Japão: o sarraceno. Eles criaram uma mistura entre as duas farinhas, na proporção de uma parte de trigo comum para quatro partes de trigo sarraceno. O resultado foi uma farinha mais difícil de se misturar com a água e que ficava menos viscosa. Isso tornava um tanto mais trabalhosa a tarefa de fazer a massa. Assim nasceu o sobá, o macarrão japonês.
O sobá e a evolução do mercado.
A aceitação do sobá pelos habitantes no início do século XVIII foi tão grande que provocou também uma evolução no mercado de venda de alimentos na rua. Depois das yatai, as barracas em que eram vendidos diversos tipos de alimentos, os comerciantes desenvolveram um novo modelo, mais simples, chamado de "bote-uri" ou " furi-uri", cuja principal característica era a mobilidade. Os ambulantes carregavam as cestas para onde houvesse mais movimento, indo, literalmente, atrás dos clientes. É esse mesmo modelo que os japoneses que chegaram com a linha férrea em Campo Grande adotaram. Muitos deles usavam sinos, colocados estrategicamente, que anunciavam a chegada do sobá e atraiam a atenção dos consumidores. Os donos das bote-uri vendiam apenas sobá no Japão.
A velocidade para servir o sobá conquistou a população japonesa. O masterchef japonês.
Do momento em que fazia o pedido até que consumisse o prato o comprador não gastava mais do que cinco minutos. Por isso, os historiadores dizem que o sobá foi o primeiro fast-food da história, ideal para o ritmo de vida frenético que os japoneses experimentavam.
O sobá virou mania no Japão do século XVIII. Surgiram restaurantes especializados e também os primeiros rankings de lugares onde era possível saborear os melhores. O guia Michelin é considerado o melhor ranking do mundo ocidental. Não passa de uma cópia dos guias de sobá japoneses. Bem assim como os melhores cozinheiros, as competições de cozinheiros.
Até mesmo templos budistas passaram a vender o prato, que se tornou popular entre os exigentes e rígidos samurais. No início era rejeitado por essa elite guerreira. Mas quando os ricos começaram a criar louças especiais para desfrutar do sobá, os guerreiros seguiram a onda.
Os templos zen-budistas proibiram o sobá.
A febre em torno do sobá era tanta que alguns templos zen-budistas, os mesmos que haviam sido responsáveis pela chegada do macarrão no Japão, resolveram dar um passo atrás e proibir o preparo e consumo de sobá em suas dependências. O argumento era que desconcentrava os monges. Ainda hoje, avisos de restrição ao macarrão, entalhados em placas de pedra, podem ser vistos em alguns templos budistas no Japão.
Quase três séculos depois, mesmo com o intenso processo de urbanização e ocidentalização do país, a cultura do sobá continua forte. As barracas continuam como uma tradição do dia a dia. No cardápio, o yakissoba, macarrão frito misturado com carne e vegetais, um "primo" do antigo sobá, é um dos pratos mais populares entre os japoneses.