Você comeria "carne" de laboratório?
Têm sido um meio de ano movimentado para a biotecnologia de alimentos. A FDA - agência dos EUA que aprova alimentos e medicamentos - produziu manchetes quando aprovou o denominado "Impossible Burger" baseado em vegetais. Essa é uma moda que ainda não chegou ao Brasil que utiliza vegetais misturados a um ingrediente derivado de levedura geneticamente modificada para que tenha gosto de carne bovina. Por outro lado, a União Europeia gerou controvérsia ao impor restrições pesadas a organismos geneticamente modificados. As duas notícias não são boas para os fazendeiros brasileiros, ainda que não tenham produzido maiores impactos para este lado do Equador.
Mas poucos ficaram sabendo sobre uma reunião pública organizada pela FDA sobre "carne de laboratório cultivada" - carnes que não vêm diretamente de animais, mas sim de culturas de células. Esse tipo de carne será cada vez mais importantes à medida que se aproxima a data de sua entrada no mercado. Mas as pesquisas sugerem que os consumidores podem ter problemas para aceitá-las prontamente. Você comeria esse tipo de carne?
As carnes de laboratório desapareceram na imprensa, mas estão quase prontas.
Essa biotecnologia emergente chamou muita atenção em 2013 quando promoveram uma degustação ao vivo de uma carne de laboratório. Desde então sua produção ficou fora do radar, mas pesquisadores e empresas vêm correndo para reduzir seu preço e, dizem eles, estão a beira de um produto acessível e saboroso.
A produção de carne cultivada com células envolve a recuperação de células-tronco musculares adultas de um animal vivo e sua colocação em um líquido rico em nutrientes. Os proponentes alegam que estão prestes a conseguir muitos hambúrgueres sem matar animais. O resultado é um produto que têm aparência e gosto de carne porque é feito de células de bovinos, em vez de produtos à base de plantas que não têm tecido animal, mas tentam ter um aspecto e sabor semelhante.Essa carne evitaria os impactos ambientais e questões éticas que dizem respeito ao abate de animais.
A encrenca do nome da carne de laboratório.
Antes da carne cultivada entrar no mercado, os reguladores precisam decidir como ela poderá ser chamada. Os nomes que estão em debate são: "carne limpa", "carne in vitro", "carne artificial" e "carne alternativa". A associação dos pecuaristas dos EUA - US Cattlemens Association luta contra a utilização do termo "carne". Diz que isso confundirá os consumidores uma vez que competirão com a carne tradicional de animais criados em fazendas. A indústria da carne norte americana prefere o que talvez seja um termo menos apetitoso como "tecido de cultura".
O Good Food Institute, organização sem fins lucrativos que promove alternativas aos produtos animais, favorece o termo "carne limpa", alegando que a linguagem evoca uma imagem positiva com os consumidores e pode aumentar sua aceitação. A União dos Consumidores contrapõe que o público quer saber como o produto foi fabricado, exigindo uma distinção mais visível da carne de fazenda. Já a American Meat Association, uma organização que cuida da ciência e ligada aos fazendeiros, teme que o termo "carne" possa sugerir de forma imprecisa que a proteína cultivada em laboratório é tão segura e nutritiva quanto a carne tradicional.
No entanto, todos os interessados no assunto - fazendeiros, industriais, cientistas, meio ambientalistas, defensores de animais - estão negligenciando um fator muito mais importante na viabilidade da carne de laboratório: a opinião dos consumidores.
Todo mundo nos EUA já têm opinião sobre a carne de laboratório.
A Universidade de Michigan (EUA) realizou uma pesquisa com 2.100 pessoas em 2018. A pergunta formulada foi: "Qual seria a probabilidade de você comprar alimentos com aparência e sabor idênticos ao da carne, mas baseados em ingredientes produzidos artificialmente?"
Descobriram que apenas um terço dos norte americanos compraria a carne de laboratório. Outros dois terços seriam cautelosos. Quarenta e oito por cento disseram que dificilmente comprariam esse produto. Quando divididos por renda, os mais ricos tinham quase o dobro de probabilidade de comprar carne de laboratório (47%) do que aqueles com menores salários (26%).
Uma diferença mais marcante - e preocupante para os fazendeiros - foi observada quanto à idade dos participantes da pesquisa. As pessoas de 18 a 29 anos foram quase cinco vezes mais propensas (51%) para aceitar a carne de laboratório em comparação com que têm 55 anos ou mais (apenas 11%). E os formados em faculdade tinham maior probabilidade de comprar carne de laboratório (44%) em comparação com os não graduados (24%). Também descobriram que 43% dos homens aceitam bem a carne de laboratório e apenas 24% das mulheres aceitam essa carne. A última referência diz respeito à ideologia. O mesmo estudo descobriu que os entrevistados liberais são mais propensos a comer carne cultivada do que suas contrapartes mais conservadoras.