Carne de búfalo misturada à de boi; você pode ter comido sem saber
Segundo Associção e frigorifícos, a prática acontece quando búfalos são abatidos e a carne vai para comercialização, como forma de driblar a resistência do consumidor
Você já pensou que pode ter experimentado carne de búfalo como bife do almoço ou no churrasco de domingo sem nem saber? Segundo a Associação de Criadores de Búfalo de MS e proprietários de frigoríficos, isso já aconteceu com boa parte dos consumidores de carne bovina.
“Com certeza a dona de casa e a maioria das pessoas já comeu um bife de búfalo e nunca descobriu”, afirma o presidente da Associação, Antônio Rozario Migliorini.
De acordo com a Associação e frigoríficos ouvidos pela reportagem, búfalos são abatidos e a carne é misturada com bovina para a comercialização. Com isso, o consumidor acha que está comprando bife bovino, mas leva para casa outro produto.
Comprador de carne de um grande frigorífico do Estado, Renato de Oliveira, explica que a mistura tem o objetivo de driblar a resistência dos consumidores com a espécie bubalina.
“Tem que misturar com a bovina porque senão ninguém quer comprar”, frisa.
Apesar de admitir a prática, ele ressalta que o procedimento é raro. “É raro comprarmos búfalo, até porque o abate é mais difícil e não tem comércio. Quando compramos é de algum produtor que é cliente antigo e tem búfalo para vender”, diz.
O presidente da Associação garante que é quase impossível identificar a diferença das duas carnes a olho nu e que o gosto é o mesmo. “É o mesmo sabor, não tem diferença. Depois que abate vira tudo carne”, diz. Ele afirma que já vendeu búfalos para pelo menos dois frigoríficos do Estado e os animais foram batidos e comercializados como carne bovina.
De acordo com o Ministério da Agricultura, a prática caracteriza crime, já que o abate dos animais deve ser separado e existem determinações e rotulagem especificas para cada espécie. Ainda segundo a fiscalização, o consumidor é enganado na hora da compra.
Carne light - Mas o produtor rebate dizendo que não há prejuízo para consumidor, justificando que o cliente acaba adquirindo um produto melhor pelo preço mais barato.
“Você não está enganando, é vender algo melhor pelo mesmo preço. A carne bubaína é a única com selo light”, frisa.
De acordo dados da Associação sobre a carne, a partir de pesquisas nacionais, o produto tem 40% menos colesterol e 10% a mais de proteína que a carne bovina. Além disso, a Secretaria de Agricultura do Estado do Pará, maior produtor de búfalos do país, emitiu certificado de light para a carne, considerando suas características.
Já a mussarela do búfalo, produto mais popular da espécie, é conhecida pelos mesmos benefícios e admirada, também, pelo sabor. “Além dos benefícios, é procurada pelo paladar. É uma mussarela mais macia, adocicada”, diz o proprietário do único laticínio do Estado especializado na produção de mussarela de búfalo, André Caleffe.
E você? - Na rua, consumidores não se espantam com a possibilidade de já ter provado a carne bubalina sem saber e alguns admitem acreditar que nem saberiam diferenciar os produtos.
“Pra mim tanto faz, fui criado comendo carne de porco e, eu acho que carne de búfalo deve ser igual carne de vaca”, diz o pipoqueiro Jorcelino do Carmo, de 60 anos.
Mas a ideia de comer uma carne sem saber a sua procedência também assusta. “Não comeria carne de búfalo, sou enjoada e nem carne de vaca de qualquer lugar eu como, tem de ser muito limpo”, Roseli Flávia, diz 50 anos.
Sobre a resistência em consumir a carne de búfalo, os consumidores dizem que o que falta é a cultura em comer carne bubalina. A maioria também desconhece os benefícios da carne.
“Nunca experimentei, mas se provar e for boa, não vejo problema nenhum. Se o queijo é bom, a carne deve ser também”, diz o comerciante Paulo Pereira, de 50 anos.
Mas na hora de optar entre as espécies para a compra, o preço acaba sendo fator decisivo para a preferência.
“Tem de ver o preço, o que importa é o preço da carne. Se não for cara, como, sim”, diz o taxista Alexsandro Monteiro, de 32 anos.
A reportagem não encontrou a carne bubalina para ser comprada em Campo Grande, oficialmente. Mas de acordo com a Associação, o preço do produtor em São Paulo varia, mas não difere muito da bovina. Já no Rio Grande do Sul, onde a procura dos consumidores é maior, o preço pode chegar a 20% a mais.
Já André Caleffe diz que o preço da mussarela é, em média, R$ 10 mais caro que outros tipos do produto.
O produtor ressalta que falta divulgação sobre o produto para incentivar o consumo da espécie. “Quando o consumidor souber da importância da carne ele chegar no local para comprar e procurar pelo produto. Aí sim os frigoríficos terão interesse no animal”, diz.
Ele frisa que aumentando a procura, a oferta por parte do produtor também vai crescer e, com isso, o preço vai diminuir.
Fiscalização-Ministério da Agricultura, Decon (Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes Contra as Relações de Consumo) e Seprotur (Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agrário, da Produção e Turismo) afirmam nunca terem constatado esse tipo de irregularidade no Estado.
No entanto, os órgãos afirmam que se o frigorífico for flagrado realizando o procedimento ilegal, a as punições previstas incluem apreensão da mercadoria, multa e até prisão dos responsáveis.
O delegado da Decon, Adriano Garcia Geraldo, esclarece que havendo denúncia sobre a prática irregular, os órgãos de fiscalização e Polícia Civil podem realizar vistoria e, constatando a irregularidade, os responsáveis são punidos.
Ele frisa que o procedimento é uma forma de enganar o consumidor e não interessa se o produto é melhor ou pior, pois o cliente tem o direito de saber o que está comprando e optar.
Pelo crime contra relações de consumo, a pena é de 2 a 5 anos de prisão.