Perto de casa e dos sonhos, curso técnico abre as portas para o emprego
No Cidade Morena, escolhido para receber a sala móvel do Senai, são 230 vagas para começo imediato
Aos 50 anos, Risonalda dos Santos fez do curso técnico o trampolim para um recomeço. O sorriso vem antes da resposta sobre a nova profissão. “Vou ser costureira”, conta.
O desejo de dominar as máquinas de costura é vocação de família. “Minha mãe é costureira, minha irmã é costureira”. Mas a mudança tomou forma no curso oferecido, perto de casa, no bairro Cidade Morena, em Campo Grande, pelo Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial).
Faxineira, ela trabalhava durante o dia e à noite foi se dedicar ao aprendizado do novo ofício. Após dois meses, com curso concluído, pediu uma oportunidade na empresa Puket, onde já trabalhava e localizada nas imediações da sala de aula. Aprovada no teste, trocou de profissão. “Minha irmãs ficam ligando para saber quando vou começar. Não vejo a hora”, diz.
Na sala móvel, chegou a vez de Janiele, Jenifer, Rosenil e Rosana sonharem. Movidas pela vontade de entrar no mercado de trabalho, dedicam-se ao curso de costura eclética, ponto de partida para o domínio da costura industrial.
Um anúncio, ouvido na rua, foi a senha para que Janiele de Souza Ataíde, 23, se inscrevesse no curso, ministrado na rua Ferminópolis. “Era uma oportunidade”, diz a jovem. Com um filho de 9 anos, ela se desdobra entre o curso técnico e a retomada dos estudos. “Tinha parado e comecei de novo”, relata.
Tamanho empenho é em nome de uma vida melhor para o filho e coloca a aluna em grupo seleto de trabalhadores. Conforme o Mapa Estratégico da Indústria (2013-2022), apenas 6,6% dos estudantes brasileiros cursam a educação profissional concomitantemente ao ensino médio regular.
“Se Deus quiser, consigo um emprego. Se Deus quiser eu chego lá”. Em frente à maquina de costura, onde se esmera nos primeiros passos da costura industrial, Jeniffer Marinho de Proença, 24, espera, em breve, trocar o status da profissão de dona de casa para costureira.
Quando conseguir, a renda da família vai dobrar. Ao salário de R$ 800 do marido, que trabalha como porteiro, vai se somar a remuneração de costureira, cujo piso salarial é R$ 830.
Para ir ao curso, contou pontos o fato de ser perto de casa. E para que ela não perca nenhuma aula, o casal decidiu apertar um pouco o orçamento. Por mês, pagam R$ 100 para uma babá cuidar dos filhos de 9 e 6 anos enquanto Jeniffer frequenta o curso.
Para Rosenil da Silva Paula Leite, 34, o anúncio de um curso gratuito no bairro Cidade Morena chegou na hora providencial. “Nem acreditei quando fiquei sabendo”, conta. Determinada a aprender, já cogitava pagar R$ 1.500 por um curso de costura eclética. “Esse é só o primeiro. Vou fazer um atrás do outro. Tudo depende da vontade da gente. Vontade de aprender e trabalhar”, ensina.
Ao lado da irmã Rosenil, Rosana da Silva Paula, de 37 anos, relata que procurou curso de costura por toda a cidade. “Ia ter que passar no cartão. Nem sabia como ia pagar. Fiquei sabendo do curso do Senai e já fiz a inscrição no começo de janeiro”.
O curso de costura industrial eclética tem dois meses de duração, com quatro horas de aula por dia. Na sala móvel do Cidade Morena, foram abertas duas turmas, das 13h às 17h e das 18h30 às 22h30.
“São donas de casa, arrimo de família, empregadas domésticas. Querem trabalhar na indústria ou montar o próprio negocio”, afirma a instrutora Maria Dolores Mariano Benedito sobre o perfil das alunas. Maria já teve confecção, mas migrou para o ensino. “Gosto de ensinar, tenho o dom, a vocação”, diz, com um olho na entrevista e o outro no desempenho das alunas.
Enquanto o curso acontece, as confecções no entorno esperam retirar o quadro de “procura-se” dos portões. “Costureira e homem são as maiores dificuldades”. A constatação é da gerente-administrativa da Puket, Lassara Lessonier. A empresa, a poucas quadras da sala móvel do Senai, é onde também trabalha Risonalda, a mais nova funcionária a assumir uma máquina de costura.
No quadro de costureiras, o déficit é de dez vagas. “São 40 e precisávamos de mais dez”. No local, as meias, que vem pré-prontas de São Paulo, passam por acabamento e finalização. A unidade de Campo Grande também é centro de distribuição para todo o Brasil. As meias também são exportadas para cinco países da Europa.
Enfrentamento – Presidente do Sindivest/MS (Sindicato Intermunicipal das Indústrias do Vestuário, Tecelagem e Fiação de Mato Grosso do Sul), José Francisco Veloso afirma que na região do Cidade Morena, escolhida para receber a sala móvel do Senai, são 230 vagas para começo imediato. No entorno, cinco indústrias produzem meias, lingerie e uniforme esportivo.
“É um enfrentamento para qualificar as pessoas, gerando emprego e renda. A dificuldade hoje é chegar a quem quer trabalhar. Fazemos divulgação na imprensa, nos bairros. E a sala móvel foi um avanço”, diz, ao avaliar a parceria entre o sindicato e a Fiems (Federação das Industrias de Mato Grosso do Sul) na busca por mão de obra. Segundo ele, o custo operacional por aluno no curso técnico é de R$ 1.200.
“Também tem uma função social. A maioria dos trabalhadores é mulher, com mais de 35 anos, chefe de família”, ressalta. Em expansão, alavancado por incentivos fiscais do governo do Estado válidos até 2028, o setor de confecção e têxtil emprega 12 mil pessoas em Mato Grosso do Sul, sendo cinco mil trabalhadores em Campo Grande.
Ir onde o trabalhador está – Com nove mil novas vagas disponíveis no Estado para 2014/2015, a indústria decidiu no ano passado ir onde a mão de obra está. “A gente sabe das dificuldades da população. Em bairros longe do Centro, as pessoas teriam dificuldade de se deslocar”, afirma o diretor regional do Senai, Jesner Escandolhero.
Daí, surgiu a ideia de espalhar conhecimento por 24 salas móveis em Campo Grande. “Isso facilitou o acesso da população e ampliou a capacidade para oferta dos cursos. É uma sala de aula normal, toda climatizada, forrada, com piso”, explica sobre a estrutura dos locais de ensino. No ano passado, o setor da indústria voltado para a educação registrou 71 mil matriculas. Para 2014, a oferta é de 81 mil vagas.
De acordo com as oportunidades de trabalho da região, é escolhido o tipo de curso, como mecânica de motores, curso de costura, panificação. “São vários estudos que nos indicam a demanda por profissional. O tipo de indústrias próximas”.
Multifuncional, as salas têm dimensões para 20 ou 40 alunos. No material de divulgação, foto e telefone dos agentes de qualificação das seis regiões urbanas da Capital também auxiliam no papel de aproximar a oportunidade e potenciais interessados.
Em todo o Estado, as salas itinerantes disponibilizaram 19.470 vagas gratuitas. “Superou as expectativas. Chega com infraestrutura no bairro ou nas cidades do interior. No primeiro contato, ficam maravilhados”.
Para quem decide vencer o imobilismo e se enveredar pelo caminho do conhecimento, o maior atrativo é conseguir um emprego, e o melhor, perto de casa. “São cursos relativamente rápidos e permitem o melhor ingresso no mercado de trabalho. Você começa bem”, avalia.
O cenário favorável foi retratado em número. O Mapa Estratégico da Indústria mostra que unir curso ao estudo tradicional resulta em condição financeira mais confortável, pois, em média, profissionais com ensino técnico de nível médio tem salários 12% maior do que os que cursam ensino regular. Em 2022, a meta nacional é chegar a 4,3 milhões de matrículas do ensino técnico profissionalizante.
Conforme levantamento do Ibope, encomendada pela CNI (Confederação Nacional da Indústria), 90% dos entrevistados acreditam que pessoas com formação em curso técnico têm mais oportunidades no mercado de trabalho. Já 53% apontaram o ingresso mais rápido no mercado de trabalho como uma das três principais razões para fazer um curso profissional.