Quatro em cada 10 conhecem mulher que já foi estuprada
É um dado representativo, verificado na mesma semana da polêmica sobre a audiência na qual a influencer Mariana Ferrer
Perto de 40% das pessoas que responderam à enquete desta sexta-feira (6) do Campo Grande News disseram conhecer pelo menos uma vítima de estupro que não denunciou o crime. Isso significa quatro pessoas a cada 10.
É um dado representativo, verificado na mesma semana da polêmica sobre a audiência na qual a influencer Mariana Ferrer, de Santa Catarina, foi humilhada pelo advogado do homem acusado de estuprá-la, dois anos atrás. Ele acabou inocentado por falta de provas da alegação da vítima: de que estava dopada e ainda assim houve relação sexual.
A cena de Mariana tendo de ouvir impropérios e acusações sobre seu comportamento foram repetidas à exaustão. Para quem lida com o tema, o fato tem o aspecto de trazer os casos de estupro de vulnerável ao debate, e isso é importante, mas também pode representar efeito pedagógico negativo.
“Uma pessoa que esteja nessa situação, sofrendo essa situação e vê uma cena dessas, a pessoa pode se fechar”, analisa a subdefensora pública de Mato Grosso do Sul, Patrícia Cozzolino.
Para ela, o cerne mais importante disso tudo é que durante ato processual, a pessoa não deveria ser constrangida, nunca. O verdadeiro objetivo, lembra, é esclarecer os fatos, dando a cada parte seu direito legal de manifestar-se com dignidade.
Ainda mais quanto esse constrangimento é relativo ao gênero, sexualidade, ou liberdade para levar a vida. “Postar foto na internet, ou a vida sexual pregressa, isso não pode ser motivo de achaque”, observa.
A Defensoria atua como assistente de mulheres vítimas de violência de gênero, atendidas na Casa da Mulher Brasileira, em Campo Grande.
No interior, onde não há essa estrutura, a defensora recomenda às vítimas que sempre procurem uma delegacia especializada. Nas cidades onde não existe isso, ela orienta as mulheres a buscarem a Defensoria Pública caso se sintam inseguras para denunciar um caso de violência sexual.
A delegada Bárbara Camargo Alves, da Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) de Campo Grande, afirma que o episódio teve efeito pedagógico "muito ruim", mas o estímulo ao debate sobre o assunto foi o aspecto importante da polêmica.
"Acho difícil a gente falar em 'pontos positivos' de casos em que a vítima é revitimizada pelos agentes públicos de uma forma tão desumana, então acredito que o episódio teve efeito pedagógico muito ruim. Muitas mulheres, que já não acreditam na justiça para crimes sexuais, ao olhar o que aconteceu naquela audiência, acaba sendo mais desencorajada a procurar ajuda e registrar ocorrência. Porém, a gente não pode negar que esse assunto tem que ser mais falado a nível de sociedade civil e toda essa polêmica trouxe o assunto para a mesa de debate da sociedade e esse é um importante caminho para que possamos atingir uma mudança".