Com o Jiu-Jitsu, Higa superou acidente e se firmou como campeão
Adilson Higa,44, começou no judô aos cinco. Aos 18 ele conheceu o Jiu Jitsu e pratica a luta até hoje, que tem como filosofia e essência à evolução e induz os praticantes a vencer seus limites. E foi com essa filosofia que ele conseguiu superar o acidente no qual perdeu o braço esquerdo. Depois da recuperação e de volta a disputa de campeonatos, o atleta já soma 90 medalhas e troféus, e conduzirá a tocha olímpica em Campo Grande.
Higa já praticava lutas quando mudou para o Japão aos 23 anos. Foi lá que ele se tornou faixa preta de judô pelo instituto Kodokan. "O vale tudo surgiu no Japão e era uma febre, decidi me aventurar. Durante as lutas senti que faltava elementos e golpes que o jiu-jitsu proporciona, então dei ênfase em me aperfeiçoar nele", explicou.
Ele participou de grandes campeonatos, como o WWE, Prid e o Pan Crase, além de passar de faixa azul para faixa roxa treinando na academia Kimura Nova União, do ex-lutador André Pederneiras. Em 2001, Higa retornou ao Brasil e acabou deixando de priorizar a vida de atleta por questões pessoais.
Em 2009, o lutador, que trabalhava em uma empresa de transportes, voltava do trabalho quando um caminhão invadiu a preferencial e o atropelou. Higa foi parar no eixo do veículo, que arrancou seu braço esquerdo na hora, além de sofrer graves lesões no rosto. Foram 28 dias em coma e mais 54 dias internado, além de ter sofrido 12 paradas cardíacas e ter levado 280 pontos. Ele pesava 115 kg na época do acidente, e saiu do hospital pesando 84 kg.
Entre as diversas fraturas, ele teve um desvio na coluna e inflamação na cervical. Quando saiu do hospital, o médico havia dito que as chances dele voltar a andar era de 30%. “Sem o Jiu Jitsu não teria conseguido enfrentar o acidente”, desabafou.
Seis alunos, preocupados com a recuperação do professor, insistiram que ele voltasse a dar aulas como forma de se recuperar do que havia acontecido. O retorno ocorreu em janeiro de 2010. " Eles me procuraram e disseram que eu precisava ocupar a cabeça, que eles montariam o tatame e eu daria a aula pra eles".
As aulas eram dadas na varanda da casa onde morava. "O momento que eu mais temia chegou, que era entrar no tatame. Estava ensinando um movimento e precisei demostrar para os alunos. Foi aí que pensei: o caminho é aqui", relembrou.
Ele contou que sofreu com várias reações quando voltou a lutar. "Cheguei a desmaiar, vomitei várias vezes, ia ao médico e me chamavam de louco, mas não me importava. Vestia o kimono e me sentia bem com aquilo." Na época, o lutador resolveu cortas 8 dos 12 remédios que tomava para a recuperação. "Deixei só os que eram realmente importates".
Após retirar os pontos, alguns amigos sugeriram que o atleta entrasse em uma competição, algo que na época ele desacreditou. Depois, aceitou a ideia. Em sua volta, venceu duas das três lutas e foi vice-campeão regional. Desde então, Higa participou de 15 campeonatos por ano e conquistou 90 medalhas.
Com a vitória, a repercussão foi tão grande que novos alunos procuraram Higa para ter aulas. "Eram seis alunos, viraram 20, depois viraram 70. Não tinha estrutura para atender". No fim de 2010 o lutador construiu o local onde funciona sua academia atuamente. Depois, o negócio ampliou. Hoje são oito filiais com cerca de 500 alunos que estão em Campo Grande, no interior de Mato Grosso do Sul, no Paraná e até no Paraguai. "O projeto foi pensado para ser uma academia de jiu-jitsu, com teto alto, ventilação", citou.
A academia de Higa não tem como foco treinar atletas para competições, e sim ensinar o Jiu-Jitsu tradicional, que ensina filosofia, história e cronologia da luta. Além das aulas práticas, os alunos recebem material em dvd, apostila, cursos a cada três meses e palestras, além de acompanhamento físico. “Trabalhamos ensinando de uma maneira que qualquer pessoa possa praticar o esporte. Nós somos referência no ensino de crianças, que começam já aos três anos. Tenho aluno de até 63 anos. 5% é a competição, o resto são vários fatores. Eles aprendem coisas que são matérias de faculdade para que eles não se machuquem, e se caso isso aconteça, eles saibam fazer os primeiros socorros necessários”, afirmou.
Desde 2014 a academia de Higa é credenciada na CBPJJ (Confederação Brasileira Paradesportiva de Jiu-Jitsu). Em 2015 o lutador fez os cursos de aperfeiçoamento para habilitação e hoje ensina dois atletas deficientes. "Isso é importante porque, assim como as pessoas que procuram aqui para aprender o esporte por ter receio de academias que visam as competições, esses alunos podem aprender sem ter o receio de não se adaptar ou não conseguir fazer algum golpe, sem ter medo de não se sentirem incluídos”.
A história de superação do lutador emocionou seus alunos que, como uma forma de homenagear o professor, o inscreveram em um concurso de um dos patrocinadores do Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro para que Higa fosse um dos sortudos a carregar a tocha olímpica em Campo Grande. E ele foi escolhido. “Estarei lá no dia 26. Acaba sendo a representação de um sonho, de que o Jiu- Jitsu se torne um esporte olímpico e que o nosso esforço no esporte dê frutos para as crianças. A expectativa é muito grande. Fica como lembrança para a família e para os alunos. Vou trazer a tocha que carregar e colocar na parede da academia, ao lado das outras homenagens que recebi”, finalizou orgulhoso.