Rádio Clube abre mostra Morar Mais por Menos com energia renovada
Quem passa de carro pela rua padre João Crippa, talvez não perceba o quanto o Rádio Clube Cidade mudou. A fachada continua branca, mas completamente renovada, sem rachaduras aparentes ou azulejos fora do lugar. É a entrada para a 2ª edição da mostra Morar Mais por Menos, que neste ano transformou o prédio e trouxe à tona as memórias da alta sociedade de Campo Grande.
Recuperar a fachada dependeu de pesquisa, para chegar ao que o prédio era em 1943. Uma tonalidade cromo, por exemplo, reapareceu agora em detalhes que quebram a uniformidade branca.
As pedras nos arcos das portas, no estilo Neocolonial-Missões, também sumiram com o tempo e tiveram de ser recolocadas. O toldo branco substituiu a cobertura velha, aos mesmos moldes da antiga, e terá nos dias de exposição o contraste do tapete vermelho, o símbolo glamour dos velhos tempos.
Uma das peças de maior valor sentimental é a namoradeira, que voltou a cor original para continuar produzindo histórias e ganhou um pequeno jardim. “O que tem de gente que já falou que foi pedida em namoro aqui, também em casamento”, conta o arquiteto Ângelo Arruda, que assina a nova fachada ao lado da colega Perla Larsen.
Ele mesmo selecionou 430 músicas dos anos 40 aos 70, para colocar o público no clima no caminho para o salão de baile, o coração do clube, remodelado por profissionais de 6 escritórios de Arquitetura.
Na entrada, dois aparelhos antigos lembram de 1924, quando amigos criaram o clube como ponto de encontro para ouvir rádio. No alto, 10 lustres de cristas dão o tom óbvio da sofisticação e apresentam o salão principal, que na versão 2013 tem camarotes com grandes poltronas e cadeiras clássicas Luis XV. A luminária clássica se repete ao centro e até no palco, em um desenho da artista plástica Ana Ruas.
"Pelos ambientes, tudo o que foi pintado de dourado pertencia ao acervo do clube e estava guardado, pintamos as cadeiras, as arandelas e dois lustres que já eram do clube", explica a arquiteta Thaysa Canale. A brasilidade, um dos conceitos da mostra, aparece em arvores secas e vasos com "Costela de Adão".
Fotos de casais apaixonados, de gente animada em diferentes décadas de badalação no Rádio Clube, estão espalhadas por grandes mesas, prontas para fazer muita gente reviver a juventude durante baile de máscaras marcado para a noite desta quarta-feira.
No meio do salão, um grande buraco leva ao ponto temático da mostra. Luis Pedro Scalise ocupou o antigo restaurante, criando o céu e o inferno. O acesso é como um "soco na parede". Para entrar, é preciso se curvar, explica o arquiteto, que colocou estrategicamente ao fundo um quadro com a imagem de Jesus.
Para chegar ao lado divino, é preciso passar purgatório, e por todos os sapatos pendurados em um mosaico vermelho. O inferno é pub, escuro, revestido de madeira e com imagens até no teto de lápides, túmulos, estátuas mórbidas, caixas mortuárias e tapetes negros. Os 7 pecados capitais são enredo, com a luxuria mergulhada em uma banheira.
No céu, o restaurante tem 25 mil guardanapos ao vento lembrando as nuvens e até chuva de tecido. É um espaço claro, também com detalhes em todos os cantos, das asas no assento do piano, ao patchwok branco do estofado, sem perder o glamour que é marca de Scalise.
Todo o clube foi ocupado pelas criações de profissionais sul-mato-grossenses. Alguns apostaram no inusitado, outros no econômico e muitos nas recordações
Lembranças - A nostalgia veste, por exemplo, o "Camarim da Noiva", um dos espaços mais delicados da mostra. Annelise Giordano faz uma homenagem à mãe. Era o lugar onde noivas e debutantes se preparavam para não fazer feio.
Sobre a penteadeira agora estão a grinalda e o véu de Rosana, hoje com 63 anos. Ao fundo, o vestido do casamento comemorado no Rádio Clube. Até o convite ficou guardado todos esses anos e agora faz parte da mostra. "Minha avó casou aqui, minha mãe e meu irmão. Minha festa de 15 anos foi aqui", lembra a filha arquiteta que tem ainda na cabeça o número do título de sócia, "1521".
Na "Sala do Presidente", uma cadeira de brilho cor de rosa chama atenção ao bater dos olhos. Batizada de "Vedete", dá corda para a imaginação no ambiente de trabalho da diretoria que também tem uma pequena mesa de jogos e um recorde com pedras no chão para quem quiser andar e acalmar o dia.
Em uma das paredes de maior destaque, a cerâmica reproduz azulejos portugueses e ladrilhos hidráulicos e causam confusão que leva as mãos de muita gente ao toque, na dúvida se a imagem é papel ou realmente o revestimento convencional. A grande luminária pendente foi produzida com antenas de TV descartadas, respeitando o conceito de sustentabilidade da mostra.
A Morar Mais por Menos será aberta ao público apenas amanhã, na Rua Padre João Crippa, nº 1280. São 54 ambientes com a proposta de apresentar materiais sustentáveis, novas tecnologias e inclusão social.
A primeira impressão, normalmente, é de que tudo é muito caro, bem diferente da proposta do evento. Realmente, vários espaços têm peças e produtos inatingíveis para a maioria dos mortais assalariados. A diferença em relação as revistas de decoração está no olhar mais próximo.
É possível aprender a reutilizar com sofisticação tubos de PVC, até no revestimento de uma sala, onde uma poltrona custa mais de R$ 5 mil. Os arquitetos e paisagistas conseguem desenhar uma cama de casal moderna, usando placas baratas de MDF, reaproveitam madeira em grandes poltronas ao ar livre e preservam assoalhos e tetos que, para leigos, poderiam ser caso perdido, transformam garrafões em uma fonte de água ao lado de um spa luxuoso, contrastando com um projetor demais de 220 mil e uma tela de 119 polegadas.
No "Quarto do Casal Contemporâneo", há uma poltrona com sistema de som acoplado, o que é móvel para poucos. Mas também há uma grande mesa feita com portas esquecidas, a preservação de vigas aparentes e de janelas antigas que asseguram luminosidade natural, reduzindo o custo com energia.
Também há ideias surpreendentes para quem não consome design com frequência, com o teclado moderno que ganhou uma grande estrutura em acrílico, transformando o instrumento em um piano.
Além de todos os ambientes, que vão do quarto à sala de jantar, há também restaurante, café e bares operacionalizados pelo buffet La Buona Cucina e Firulas Café.
A Mostra funciona de terça a domingo, das 16h às 22h. O ingresso custa R$ 20,00