Em telas, pele e até orelhão, Eli cria mundos diferentes com a arte
Usando de MDF até carvão, a artista compartilha sobre processos de criação em suas redes sociais
Quem observa os trabalhos da artista visual Eliane Fraulob, de 24 anos, pode até pensar que os resultados são aleatórios, mas acompanhando os processos compartilhados é possível ver a criação de novos mundos com a arte. Identificando seu trabalho como um “abstrato experimental”, ela usa desde telas até experimentos com tatuagens e orelhões.
Formada em Arquitetura e Urbanismo, Eli conta que sempre esteve envolvida com a arte, mas até chegar à faculdade não costumava pensar muito sobre o que desenhava. No período da graduação, em uma viagem de estudos para São Paulo, ela passou a perceber que era possível ver tanto a arquitetura quanto sua própria arte de um modo diferente.
“Lá eu fiz minhas primeiras fotografias com o celular, e quando voltei para Campo Grande, fui postando no Instagram e o pessoal gostou. Foi quando comecei a perseguir a fotografia e encontrar um link entre ela, minha arte e a arquitetura”, diz.
Nessa época, a artista conta que ainda usava os desenhos como forma de distração, mas tempos depois encontrou alguns vínculos com técnicas usadas ainda hoje. “Como eu estava sempre buscando nos desenhos uma forma de me distrair, os trabalhos que desenvolvi naquela época eram traços aleatórios que eu buscava encontrar significado, meio igual quando você olha para uma nuvem e tenta enxergar algo lá. Algum rosto ou objeto. Em grande parte, elaborava rostos nos meus desenhos por conta disso. Hoje sei que isso se chama pareidolia, mas naquela época era só um hábito que eu já praticava há anos”.
Hoje, ela comenta que tenta mesclar novas técnicas de desenho ligadas ao inconsciente, “minha formação percorre meu caminho, por isso muitas vezes meus trabalhos se mostram paisagens ou territórios”.
Em relação aos trabalhos atuais, ela conta que tenta explorar a criação de paisagens ficcionais e imaginárias. “Dentre os materiais e técnicas que utilizo, me interesso pela exploração de materiais como restos de MDF e acrilicos reutilizados, além de tintas a óleo, canetas das mais diversas, grafite, carvão e aerosol acrílico. Para mim, a diversidade de materiais e a inconstância do resultado em mesclá-los fazem parte do abstrato experimental que busco trabalhar”, detalha.
Mas, além das telas mais tradicionais, a imaginação tem corrido para outros caminhos. Entre os exemplos compartilhados pela artista em seu perfil no Instagram, @elianefraulob, também estão desde tatuagens até trabalhos em patrimônio como um orelhão em Bonito.
Interessada na área de patrimônio durante o período da faculdade, ela explica que conseguiu fazer essa relação na prática. Um amigo, Luis Martinez, havia aberto um restaurante e, em frente ao espaço, estava o tucano.
“Meu namorado também é de lá, e ele, meus sogros e esse meu amigo sempre comentavam que muitos turistas que passavam pela avenida principal da cidade queriam parar e tirar foto com o tucano, mas que realmente não estava no melhor dos estados. Então esse meu amigo me chamou para restaurá-lo, até para dar um charme a mais no restaurante que estava para abrir”, conta.
Além do orelhão, as tatuagens também surgiram como mais uma oportunidade de observar seus processos e resultados criativos.
“As tatuagens foram uma surpresa na minha vida, nunca pensei em ser tatuadora, Elas surgiram como mais uma possibilidade de adquirir minha arte. Ando observando uma onda de artistas visuais que encontram na tatuagem uma nova forma de comercializar seus trabalhos de forma única e decidi tentar também”.
Sobre a relação da arte com as tatuagens, Eli pontua que realmente pode ser uma forma diferente de adquirir um quadro, por exemplo. “Só que nesse caso estamos falando não da construção física da casa, mas sim do seu corpo, que te carrega por todos os lugares que você vai”.
Da Arquitetura às Artes Visuais
Explicando sobre como migrou de área, Eliane narra que inicialmente foi apoiada por um amiga da própria faculdade. “Fui muito incentivada por um veterano meu, que viria a ser um grande amigo, o Eduardo Azevedo. Ele chegou em mim e falou “esses rostinhos dariam belos adesivos” e então imprimi e coloquei para vender”.
Além das vendas iniciais, Eli participou de uma exposição fotográfica no Marco (Museu de Arte Contemporânea) e, em 2019, o grupo de pesquisa Algo+Ritmo foi a possibilidade de ligar a arquitetura ao sonho de trabalhar com fotografia documental ou de arquitetura.
De tentar participar do Festival de Inverno de Bonito, e no nervosismo se esquecer de enviar o formulário, até participar do Festival Reduto em Campo Grande, ela narra que foi se aproximando do que queria.
Com o TCC sendo seu último ato na Arquitetura, ela explica que se sentiu feliz em finalizar o ciclo com ele. “Eu sempre fui privilegiada, das escolas que estudei, grande parte estão no mesmo bairro, na região Centro da cidade. Foi só quando entrei na UFMS que eu passei a conviver com realidades diferentes da minha. Foi por isso que decidi estudar sobre segregação socioespacial na minha monografia, por que eu, por ter vivido em uma bolha por grande parte da vida, ter estudado sobre urbanismo e Campo Grande na universidade, hoje sei que existe essa divisão socioeconômica no espaço da cidade, e que a infraestrutura não é a mesma para todos os bairros”.
Sobre a decisão de migrar para outra área, Eli explica que em 2022, quando finalizou o curso, entendeu que precisava mudar. “Pensei em outros caminhos que tinha afinidade, fiz curso de costura, elaborei acessórios com meus desenhos e comecei a pintar telas com materiais que eu nunca tinha trabalhado antes. Foi uma fase para eu me redescobrir.
Olhando para trás, vejo que todas as coisas que estudei no curso me perseguiram nos meus processos e criações. É uma faculdade que te ensina a desenvolver e executar projetos, dentre outras coisas. Então em cada projeto meu tinha um pouco da minha formação”, diz.
E, em relação às suas referências, ela pontua que cada projeto seu mostra as ligações com as formações prévias.
“Foi quando entendi que as pesquisas que realizei no curso e em minha monografia estavam ligadas com a forma que eu pensava o mundo e minha arte. Em especial, a teoria da deriva me chama muito a atenção. Sem dúvida o livro que mais me encantei em ler em minha formação foi “Estética da Ginga”, da Paola Berenstein Jacques. Nele tem uma frase do Hélio Oiticica que virou praticamente meu mantra; “aspiro ao grande labirinto”. Pra mim, esse livro diz muito sobre o que estudei dentro da deriva e a psicogeografia, sobre o meu trajeto e meu trabalho artístico”, comenta Eli.
E, para acompanhar e conhecer mais sobre os trabalhos de Eliane, a dica é acompanhar os perfis @wtttevr e @elianefraulob.
Acompanhe o Lado B no Instagram @ladobcgoficial, Facebook e Twitter. Tem pauta para sugerir? Mande nas redes sociais ou no Direto das Ruas através do WhatsApp (67) 99669-9563 (chame aqui).