Israel não se deixou definir por tragédias da vida e agora vai dançar na Europa
Do interior de Mato Grosso do Sul para os palcos europeus, o menino criado pelos avós virou bailarino clássico.
Em cada apresentação de balé, em meio a adrenalina de subir no palco, Israel Ayala carrega também as memórias de sacrifícios e renúncias na vida do menino que perdeu a mãe aos 6 anos e foi criado pelos avós, com poucos recursos, no interior. Foi um sonho chegar à Capital e se tornar um bailarino clássico até um dia dançar nas maiores companhias do mundo.
Depois de 5 anos nesse começar de novo, Israel conquistou durante o 4º "Aplauso Festival de Dança", em São Paulo, duas bolsas de estudos no exterior, uma na Barcelona Dance Center, em Barcelona, na Espanha, e outra na Maple Leaf School of Rússia Ballet, no Canadá.
Israel descobriu o Ballet Clássico aos 16 anos, ainda em Porto Murtinho, município há 440 km de Campo Grande. Capoeirista, jogador de vôlei, atleta e músico na orquestra da cidade, apesar das atividades muito diferentes, ele diz que cada uma contribuiu para a formação do bailarino que é hoje.
O primeiro contato com a dança veio com o professor André Souza e o projeto "Homens do Ballet" desenvolvido por ele, um encontro que fez a história de Israel se encaixar.
"Eu gostava muito do esporte, da arte e me destacava. Pensei em seguir sempre esse caminho. Com a orquestra, desenvolvi um ouvido musical, que é uma vantagem na hora de coreografar. Além disso, o resultado do trabalho corporal também foi rápido, como atleta, já tinha força física e consigo que meu corpo se adapte sem fazer aula, porque ele já está acostumado com o impacto da dança", conta.
No começo, a curiosidade a respeito do balé acabou falando mais alto que as inseguranças, já que homens carregam um esteriótipo muito grande, logo de cara sendo relacionados a homossexualidade. Israel já teve que ouvir muita piadinha, principalmente, porque morava no interior do Estado.
Outra grande influência foi da avó, que apesar do pouco dinheiro, sempre teve o olhar no futuro e incentivou o neto a participar de projetos sociais desde pequeno, construindo a base para ele deixar a proteção dos avós e seguir os próprios sonhos.
"Ela também teve de ouvir muita coisa, de gente dizendo que o balé me transformaria em gay. Mas sempre acreditou em mim e deu opções, dizia que se eu tinha a certeza do sonho de ser bailarino, torceria por mim e isso deu a força que precisava para dar o primeiro passo", lembra o neto.
No dia em que Israel completou 21 anos, o avô faleceu, mas os ensinamentos do homem que ajudou a criar o neto ainda servem de guia para o caminho que ele tem pela frente. Foi com ele que Israel aprendeu a se dedicar para ser o melhor em tudo que fizesse.
"Quando decidi vir, eles me disseram que não teriam condições de me ajudar financeiramente, porque a única fonte de renda deles era a aposentadoria do INSS, e foi um período em que passei por muitas necessidades sozinho em Campo Grande. Consegui ficar trabalhando como técnico de informática, profissão que veio de um projeto social do qual fiz parte, enquanto estudava e me preparava para ser um profissional e hoje consigo dar aulas na formação de novos bailarinos e capacitação de professores", relembra.
Dentro do projeto "Homens no Ballet", Israel desenvolveu a técnica a ponto de seguir estudando sozinho, depois que o professor se mudou de Campo Grande. Ciente das transformações que os programas sociais fizeram por ele, hoje é Israel quem continua tocando o projeto e passando conhecimento para outros 7 jovens.
Com a bolsa de estudos, ele tem a oportunidade de ganhar os palcos europeus e fazer testes para as maiores companhias de dança clássica do mundo, onde o balé clássico é mais valorizado, para um dia voltar às origens e abrir o próprio estúdio de dança.
Sonhar baixo é uma palavra que o bailarino não conhece, por isso, além de continuar com os projetos sociais, o plano é que no estúdio de dança também funcione um espaço para a reabilitação de bailarinos, com investimento em preparo físico e apoio psicológico, uma vez que a dança é uma atividade que em troca da beleza exige a entrega de corpo e alma, o que torna necessário o apoio emocional.
"Pretendo plantar as sementes em novas crianças, vou fazer o caminho que preciso fazer, melhorar minha dança e voltar para o Brasil, um país que tem muito potencial que não sabemos administrar, mas que pode se tornar um celeiro de artistas, principalmente em Mato Grosso do Sul, de onde sai muita gente boa".
Mesmo com as dificuldades, Israel não trilha esse caminho sozinho. Depois da avó, o maior incentivo dele é o apoio da companheira Yasmin Salame, que também é bailarina e foi a responsável pela inscrição dele no concurso em que Israel conquistou, além do 1º lugar na competição, a bolsa de estudos em Barcelona.
Ainda existem obstáculos para que tudo isso seja possível, Israel calcula um investimento de cerca de R$ 4 mil só para as passagens, mais custos com hospedagem a alimentação, já que a bolsa só cobre o valor do curso, que é de 2 mil euros por mês. Para conseguir o dinheiro, ele criou uma vaquinha online e vai realizar um churrasco beneficente no Centro de Tradição Gaúcha Tropeiros da Querência, que cedeu o espaço de maneira gratuita.
Para contribuir com o sonho de Israel, é possível fazer doações online clicando aqui.
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