As Moreninhas já foram banidas até de currículo, mas hoje são orgulho
Moradores antigos lembram do início díficil do bairro, onde alguns eram obrigados a esconder o endereço
Foi um tempo tenebroso para Júlio. O bairro que ele correu para pegar as chaves nos primeiros dias de entrega em 1980 foi, por muito tempo, motivo de segredo. Quem se atrevia a dizer que vivia na Moreninha, era fuzilado com olhares ou palavras pra lá de ofensivas.
Júlio Cezar de Oliveira Novaes, 68 anos, que conta essa história na varanda de sua casa, na Rua Barueri, foi um dos primeiros moradores do bairro famoso, que neste fim de semana, celebra 40 anos “de vida”.
O endereço foi, durante os cinco primeiros anos, alvo de muito preconceito. Júlio recorda que trabalhava com acabamento de móveis e não podia falar onde morava. “Eu não falava que vivia na Moreninha, só dizia que morava para a saída de São Paulo. Se falasse, corria o risco de perder o trabalho. As pessoas não confiavam em me receber na casa delas”.
Naquele tempo, os absurdos ouvidos eram de “bandido a biscate”, narra envergonhado. “As pessoas tinham preconceito mesmo, diziam que aqui só tinha bandido e biscate, era horrível”.
Por muitos anos, o bairro foi mesmo cenário de violência constante, mas nada que justificasse tamanho desprezo. “Com o tempo, a gente foi se fortalecendo, os moradores foram transformando a região, lutando juntos pelo bairro e mostrando que as Moreninhas têm muita gente de bem”.
Quarenta anos depois, o sorriso segurando o documento que comprova a entrega da casa traduz o alívio do morador que, há décadas, deixou de esconder onde vivia e ficou orgulhoso. “Há muitos anos, eu não escondo o meu bairro, pelo contrário, eu tenho o maior orgulho de dizer que vivo nas Moreninhas. Eu não saio daqui por nada nesse mundo”, diz.
A empresária Alexandra da Silva Santana Ramos, de 39 anos, chegou ali no bairro ainda bebê. Anos depois, viu o endereço desaparecer até do currículo. “Tinha gente que preferia não colocar, porque temia ser desclassificado da seleção, tudo por causa do preconceito. As pessoas falavam muito”.
Hoje, ela diz que o cenário é diferente. “O bairro é motivo de orgulho, cresceu muito, hoje, muitos dizem que aqui é uma cidade, porque tem tudo, praticamente o morador nem precisa sair daqui para fazer alguma coisa”.
É o que pensa o João Alvez, de 29 anos, que também afirma que o preconceito é coisa do passado. No entanto, diz que a distância permanece como motivo de intriga. “Tem gente que fala que aqui é longe e não dá pra negar, é longe mesmo”, ri.
O eletricista Agmar Pereira Lima, 84 anos, recorda de um episódio que o deixou entristecido. “Foi quando eu fiz meu título de eleitor, vieram me entrevistar e uma pessoa pediu pra eu não colocar que era da Moreninha, mas eu não aceitei. Jamais ia deixar de falar onde eu morava”, recorda.
Hoje, ele atende em todas as regiões da cidade e defende que qualquer intriga sobre as Moreninhas não tem fundamento. “Essa região é maravilhosa e cresceu muito, merece ser valorizada cada vez mais. Hoje, não temos todos os primeiros moradores vivendo aqui, mas quem ficou, sabe o valor do bairro e o quanto é um lugar bom para viver”, finaliza.
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