Avô dedicado, Toninho era “pai” das autopeças que nunca foi mecânico
Se despedindo da vida no dia 31, seu Antônio foi um dos mais tradicionais comerciantes de autopeças em MS
Durante sua vida, Antônio Gonçalves Pessôa nunca teve medo das experiências. Nas autopeças, sabia tudo que era "rebimboca da parafuseta" – tamanho, preço, funcionalidade. Já no meio familiar, era o pai que conhecia cada um de seus seis filhos, além de ser o "vozão" acolhedor da criançada – isso para tantos netos e bisnetinhos que ele pôde estar junto. Sem falar que "Toninho", como era conhecido, era um craque nos números.
"E de cabeça. Tinha uma memória matemática que era de impressionar. Imagina só naquela época, sem computador e nenhuma das tecnologias atuais, tendo que memorizar o catálogo das peças manualmente?", recorda Milton Pessôa, funcionário público de 59 anos, filho de seu Antônio.
Porém, precisou um acidente doméstico em que Toninho quebrou o fêmur para que, aos 84 anos, esse senhor de sangue português – considerado um dos mais tradicionais comerciantes de MS – "quinasse" dessa vida, como é de costume dizer na "terrinha" àqueles que partiram.
"Diferente do que se pensava, meu pai nunca foi mecânico, mas era de praxe os amigos recorrem à ele sempre que tinham alguma dúvida automotiva. Diziam que era 'o cara'. Mesmo sem mexer com as peças há algum tempo, ele era um especialista no assunto, praticamente um dos únicos que ainda entendia sobre principalmente quando se tratava de veículos antigos", explica Milton.
"Mas ao invés de carros ou até mesmo autopeças, ele gostava era de colecionar moedas, cédulas e selos – tudo antigo. Ele tinha paixão muito intensa pelas coisas de outrora. Acho que por isso ele viveu bem o tempo dele, soube aproveitar cada instante", afirma.
De trator ao quase esquecido Willys-Overland, Toninho foi um dos primeiros a abrir loja de autopeças na região sul do antigo Mato Grosso uno. Natural de Avanhandava, no interior de São Paulo, veio para MS servir o exército no município de Aquidauana. Depois da baixa, decidiu fazer a vida na segunda maior cidade na época, Campo Grande. Procurando emprego, por aqui ficou e nunca mais saiu.
"Iniciou justamente num posto chamado Autopeças Brasil, que ficava na rua 13 com a Cândido Mariano. Isso até 1968, ano em que resolveu montar a própria loja, a Autopeças Pessôa", esclarece Milton sobre o ganha-pão de seu Antônio, que ficou aberto até meados dos anos 2000.
O comércio de Toninho teve início na rua 14 de Julho, entre a avenida Mato Grosso e a rua General Melo, pertinho do Colégio Colégio Dom Bosco. Só bem depois é que se mudou para a rua Eduardo Santos Pereira (antiga rua Paraná), em que a frente do imóvel servia de loja enquanto os fundos era a moradia para ele, esposa e os filhos.
"Ele era um comerciante nato porque já tinha na cabeça que o seu serviço era, muitas das vezes, emergencial. Como dono, o diferencial na época foi atender à noite e aos finais de semana. Costumavam bater na frente da loja à procura do meu pai, afinal ele dormia no fundo – e todo mundo sabia disso", conta o filho.
Milton vivenciou bem isso. "Praticamente nasci dentro daquele comércio de autopeças, então foi natural que eu também ajudasse ali ou acolá. Já como funcionário mesmo, fiquei trabalhando com ele e minha irmã Marcia, ela que ficou mais tempo do que eu", relembra. Após 4 anos, ele saiu da loja do pai pois havia passado em um concurso da Sefaz (Secretaria de Estado de Fazenda), onde permanece até hoje.
Do comércio que não existe mais, Toninho ficou com a experiência de uma vida inteira no mundo das autopeças, além de ter criado a "prole" que virou os mais de 20 familiares que hoje forma o "time" da família Pessôa – uma das heranças do patriarca.
Seu Toninho tinha baixa estatura, era católico devoto de Nossa Senhora de Aparecida e até mesmo um contador de piadas nato – quase que um ator. No jargão do pai, Milton se lembra: "'quem não é o maior, tem que ser o melhor', costumava dizer. Para nós, fica a saudade dos bons momentos vividos ao seu lado e o exemplo de vida que deixou", finaliza.
Seu Antônio deixa esposa, seis filhos, sete netos e quatros bisnetos.
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