César se matou aos 14 anos, depois de menina de 12 cometer suicídio
Mãe abre o coração sobre a dor que é perder um filho para o suicídio e a importância do olhar sensível da sociedade para depressão
César era um menino bom, segundo a mãe. Estava no Ensino Fundamental e sonhava em ser designer. Como muitos adolescentes, tinha planos de abrir o próprio negócio, viajar, fazer cursos e já dizia ter encontrado até namorada. César tentou viver, mas não conseguiu.
Ele sentia dor imensa, que nem a mãe atenta conseguiu descobrir a origem. Mas tudo piorou depois de ter perdido o que considerava o 1º amor, outro ponto dramático dessa história que une 2 famílias.
No dia 4 de julho, a menina de 12 anos cometeu suicídio, em Campo Grande. César foi ao velório, depois passou a procurar respostas com a mãe da garota e nas últimas semanas de vida só chorava. No domingo, 28 de julho, tirou a própria vida.
A vontade de falar publicamente sobre o caso surgiu da mãe, a cabeleireira Patrícia Romero, de 33 anos, na tentativa de alertar pais para um problema assustador, que por muito tempo teve o debate como tabu.
Ela diz que tentou de tudo durante os 24 dias entre uma morte e outra. Deu amor, procurou especialista, pediu ajuda da escola e se ajoelhou diante do filho pedindo pela vida. “Mas a dor dele parecia muito grande. Às vezes ele parecia bem, cheio de sonhos, com vontade de viver, mas quando lembrava dela, chorava, dizia que não viveria sem”, descreve.
Mas o sofrimento não parecia ser pela perda recente. Pouco antes da menina se matar, César já passou a falar da vontade de morrer. “Ele já vinha com depressão há algum tempo. Ele estava perturbado, queria matar aula porque queria sair, queria andar e, com o passar dos dias, ele brigava na escola, ficava afastado dos colegas, dizia que queria se matar”.
Depois que a menina partiu, Patrícia entendeu que ele também precisava de ajuda. Passou então a lutar pela vida do filho. “Eu tinha muito medo que isso acontecesse com ele. Porque depois que ela se foi, tinha momentos que ele ficava bem e caia de novo”.
Patrícia diz que o filho já fazia terapia, mas nas últimas semanas escolheu ir ao psiquiatra. “Então eu corri para tentar marcar um médico para ele, para ser consultado e tomar remédio, mas não deu tempo”.
Ela acreditava que abraçar e pedir para César viver o faria superar a dor que sentia. Mas não foi assim que aconteceu. Os últimos 24 dias foram difíceis em casa, principalmente, na escola. “Eu tinha ido à escola porque ele teve problemas com um colega, então falei do momento difícil que ele estava passando, mas foi só isso, não recebemos nenhuma ajuda”.
A mãe diz que entendia as dores do filho e também os momentos de rebeldia da adolescência. “Além da dor, os jovens de hoje não querem esperar a hora certa, a vida parecia ruim porque nem sempre ele tinha as coisas que queria. Eu dei amor, falava todos os dias que o amava, quando ele vinha com grosseria eu tentava entender, mas não era só isso, ele precisava de mais ajuda”.
Primeiro, Patrícia se lembra dele sorrindo no último domingo quando o filho pediu para dormir em sua cama. “No dia anterior, sábado, fez planos, falou para mim das vontades dele e depois pediu para dormir comigo. No domingo eu falei que iria sair para visitar uma reforma que estamos fazendo, ele não quis ir e ficou deitado na minha cama”.
Horas depois, ela voltou para casa e ao acender a luz encontrou o filho sem vida. César ainda deixou uma carta, curta, com nomes de 7 pessoas que o fizeram feliz. Estavam na lista Patrícia, o pai, o padrasto e quatro amigos. Algo parecido com série adolescente polêmica, 13 Reasons Why, sobre uma estudante que comete o suicídio e deixa uma relação de pessoas que deram 13 razões para ela se matar.
Nesta quinta-feira, dois amigos de César apareceram no trabalho de Patrícia para dar um abraço nela. “Ele falou que queria morrer, eu abracei e disse que ele não precisava fazer isso. Ele então disse que ia repensar o assunto”, contou o amigo de 14 anos, colega de sala.
Depois da morte, os garotos esperavam apoio dentro da escola, mas não encontraram. “Só foram na sala falar que o caso aconteceu e nada mais. A escola nunca ligou muito, a gente fala sobre os problemas, mas todo mundo acha que é drama”, afirma.
A mãe também diz que enfrentou dificuldades para receber atendimento psicológico e psiquiátrico para o filho e sentiu falta de profissionais preparados para entender que os problemas na escola não eram só crises da adolescência. Hoje, respira fundo para conter as lágrimas e voltar a viver. “Eu ainda não voltei para a minha casa e já prometi que não volto mais. Vou alugar, mas lá não tenho coragem de ficar”.
Numa entrevista em que o tempo se fazia necessário a todo instante para enxugar as lágrimas e recuperar o fôlego, Patrícia mostrou que ainda busca achar sentido na morte do filho. “Absolutamente nada vai trazer o meu filho de volta, mas ele morreu e deixou muito filhos para mim. Os amigos dele que estão desolados agora são os meus filhos e é por esses adolescentes que eu quero pedir ajuda”, finaliza.
Ajuda- Nem sempre é fácil tratar o assunto, falando da gravidade do problema, sem aprofundar na prática do suicídio. Mas precisamos falar sobre, dialogar é prevenir.
Dados da Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) de Campo Grande (MS) mostram que 91 crianças e adolescentes tentaram se matar em 2018. Entre os casos, 84 eram meninas.
Em Campo Grande, o Grupo Amor Vida (GAV) presta um serviço gratuito de apoio emocional a pessoas em crise através dos telefones (67) 3383-4112, (67) 99266-6560 (Claro) e (67) 99644-4141 (Vivo), todos sem identificador de chamadas. Ligue sempre que precisar!
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