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Comportamento

De missionária a vendedora em baile funk, Augusta soube curtir a vida

Durante 72 anos, ela aproveitou a vida sem medo de ser feliz e protagonizou histórias inusitadas

Jéssica Fernandes | 14/02/2022 09:23
Augusta durante espetáculo do palhaço Patati. (Foto: Arquivo Pessoal)
Augusta durante espetáculo do palhaço Patati. (Foto: Arquivo Pessoal)

Augusta Damasceno, 72 anos, aproveitou a vida como poucas pessoas conseguem. As histórias dela e as proezas que protagonizou são quase inacreditáveis, porém todas verídicas. Ela era capaz de fazer tudo, desde ser missionária na igreja evangélica a vendedora de coco no baile funk do Rio de Janeiro (RJ). Enquanto viveu, a dona Augusta não se limitou, realizou os sonhos que almejava e deixou três filhos, que agora, recordam com carinho os melhores momentos dela.

Em dezembro de 2021, Augusta saiu de Campo Grande com destino a São Paulo (SP) e não retornou mais. A pretensão era morar seis meses com os dois filhos, mas, antes de desembarcar do ônibus, ela sofreu um AVC (Acidente Vascular Cerebral). Após sete dias internada, a professora se despediu da vida.

Gary Franklin, 40 anos, George Richard, 39 anos, e Ives Glen, 35 anos, são os três filhos que ficaram para falar sobre a figura que era a mãe. Cheios de histórias para contar, os três relembraram diversos episódios marcantes, que são motivo de boas risadas para toda a família.

Augusta com os filhos Gary, George e Ives quando crianças. (Foto: Arquivo Pessoal)
Augusta com os filhos Gary, George e Ives quando crianças. (Foto: Arquivo Pessoal)

Moradora há 50 anos do Bairro Jockey Club, dona Augusta era conhecidíssima na região e mantinha amizade com todo mundo que cruzava a rua. Não era incomum ela ajudar pessoas, por isso, os rapazes estavam acostumados a ver a casa sempre cheia de gente. “A minha mãe acolhia qualquer um que passasse na rua, dava roupa, comida, levava para a igreja. Ela sempre ajudava quem precisava”, conta George.

Durante uma época, diversas travestis alugaram kitnets na região do Jockey Club. Conforme Ives, a mãe fez amizade com todas elas. “Tinham 20 travestis morando no bairro e todas frequentavam a nossa casa. Minha mãe fazia a gente dar bença pra elas e as apresentava: 'Essa é sua tia Gretchen, dá bença pra ela'. Minha mãe sempre respeitou as pessoas e era inclusiva”, afirma.

Augusta nunca gostou de ficar muito tempo presa a um lugar só ou fazendo sempre as mesmas coisas. Ela fazia questão, segundo Gary, de sempre estar próxima da família, porém gostava de ser independente. “Onde a gente estava, minha mãe sempre dava um jeito de estar junto, principalmente nos momentos especiais. Ela visitava a gente, mas ficava no máximo um mês e já arrumava alguma coisa. Ela era um passarinho que não podia viver dentro da gaiola”, fala.

Augusta durante cerimônia de formatura. (Foto: Arquivo Pessoal)
Augusta durante cerimônia de formatura. (Foto: Arquivo Pessoal)

Durante uma das visitas que fez ao Gary no Rio de Janeiro, Augusta decidiu estender a viagem e ficou vendendo durante seis meses água de coco em um dos maiores bailes funk do estado. O detalhe inusitado é que os três filhos foram descobrir só depois o envolvimento dela com o empreendimento.

Essa história emblemática é contada pelo Gary, que na época, achou que a mãe tinha voltado para Campo Grande. “Ela foi me ver no Rio de Janeiro, depois de um tempo disse que voltaria para a casa dela. Mas, ela arrumou um barraco e foi morar dentro de uma comunidade próxima à Barra da Tijuca. Ela trabalhava como babá de manhã e no final de semana, vendia água de coco no principal baile funk do Castelo das Pedras”, diz.

Para criar os filhos e sustentar a casa, Augusta teve diversos empregos, desde professora do magistério a pizzaiola durante a noite. Sempre exigindo deles notas boas na escola, o maior orgulho dela foi ter conseguido ver Ives e George se formarem em Medicina e Gary no curso de Direito.

Ives, Gary e George abraçados com a mãe. (Foto: Arquivo Pessoal)
Ives, Gary e George abraçados com a mãe. (Foto: Arquivo Pessoal)

George relata que quando concluiu a faculdade, a mãe fez questão de viajar para a Bolívia e prestigiar a cerimônia. “Ela foi a alma da formatura, ela chegava e gritava: 'Brasil, Brasil!'. Minha mãe era a alegria em pessoa, uma mulher espetacular”, ressalta.

Augusta também quis voltar a estudar e, aos 55 anos, começou a frequentar as aulas do curso de técnico em Enfermagem. No Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial), ela acabou ficando famosa pelo meio de transporte que utilizava. “Minha mãe ficou conhecida como a tia do patinete. Ela pegou o meu patinete e ia daqui ao Senac com ele”, revela Ives.

Homenagem - Criada desde criança na igreja batista, Augusta, que atuava como missionária, participava com frequência dos cultos e atividades da instituição. No sábado (12), a Igreja Senhor dos Exércitos fez um um em homenagem à memória dela.

Além do culto, Augusta recebeu outra homenagem especial do pastor da instituição. No Bairro Jardim Nhanha, ele mantém uma ONG voltada para ajudar crianças e jovens. No domingo (13), uma das salas do espaço foi batizada com o nome dela.

Durante os 72 anos de vida, ela surpreendeu os filhos mais de uma vez com as artes que aprontou e, o mais importante, trouxe muita alegria para aqueles que estavam ao seu redor. A dona Augusta partiu, mas seu legado e as histórias engraçadíssimas que protagonizou seguem vivas.

Os três filhos da Augusta ao lado da placa em homenagem a ela. (Foto: Arquivo Pessoal)
Os três filhos da Augusta ao lado da placa em homenagem a ela. (Foto: Arquivo Pessoal)

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