Depois de 10 anos, Sofia só conseguiu cursar Medicina por causa do amor de sogra
Zélia transformou completamente a vida para ajudar a nora a realizar o sonho de ser médica
A relação entre nora e sogra sempre revela uma emoção diferente. A teóloga Sofia Dias, de 35 anos, sentiu isso quando conheceu o marido. Mas foi com a chegada da primeira filha que uma grande mudança ocorreu em sua vida. Depois de quase 10 anos batalhando para cursar Medicina, ela só conseguiu realizar o sonho com a ajuda da sogra Zélia Maria Perinatto Marelli, que abriu mão de tudo para acompanhar a nora. O que fica entre as duas é amizade e uma parceria às vezes desconhecida em outros relacionamentos.
Tudo começou em 2008 quando Sofia, nascida em São Paulo, decidiu fazer Medicina. “No segundo colegial quem me desestimulou foram os professores, eles colocavam que a Medicina era quase impossível, que eu precisava ser um gênio para passar e ficaria até o resto da vida estudando para conseguir. Foi quando eu comecei a fazer Teologia”.
Mas no terceiro ano de faculdade, Sofia soube que não era aquilo que sonhava. Foi quando passou os dias na casa de uma prima que era médica, e percebeu que o desejo não era impossível.
Passou a estudar muito, mas só conseguiu uma vaga em uma universidade particular de São Paulo. Chegou a fazer o primeiro ano, mas precisou parar duas vezes por problemas de saúde. “Quando eu precisei trancar a faculdade pela primeira vez tive depressão, mas percebi que nada acontece por acaso. Foi nesse tempo que conheci o Pedro (marido) e juntos fomos para Argentina”.
Depois uma pneumonia severa, Sofia voltou ao Brasil e decidiu trabalhar para dar um jeito de voltar à faculdade de Medicina. Mas com as altas mensalidades, estava cada vez mais distante bancar o curso com o próprio dinheiro.
Quando se mudou para Campo Grande com Pedro, a solução foi dar aula e dividir a rotina com estudos noturnos para tentar cursar Medicina em uma faculdade pública de Mato Grosso do Sul. De dia Sofia estava em sala de aula, à noite se debruçava incansavelmente nos livros. A dedicação era tamanha que ela despertou atenção em professores, colegas de profissão, que resolveram ajudá-la com cursinhos.
Foram longos anos tentando passar, até que em 2017 ela desistiu. “Pensei que não queria mais, dei uma basta na vida de estudos logo após o último vestibular, porque não acreditava mais que iria passar. Foi quando eu engravidei da Maria, mas descobri em seguida que havia passado na faculdade estadual da Bahia e em uma federal do Amazonas”.
As duas descobertas foram um susto para o casal. “A gente não parava de gritar, chorar, foi muita emoção. Era a realização de um sonho e outro desafio”. Sofia chegou a ir Manaus e cursar o primeiro semestre, mas precisou trancar novamente por causa da gravidez. “Por isso eu falo que estou há 10 anos no primeiro ano de Medicina, porque não consegui aproveitar as matérias que fiz na universidade particular”.
Depois que a filha nasceu um novo desafio. Sofia e o marido buscavam alternativas para que ela continuasse Medicina em Manaus. “Eu estava aqui e tinha pouco tempo para me matricular novamente, senão perdia a vaga na universidade”.
Funcionário público, o marido tentou uma transferência, mas não conseguiu. Foi quando Zélia, sogra de Sofia, entrou em jogo. Vendo o desespero da nora e o sorriso da neta, ela tomou uma atitude que a família não desconfiava. “Falei para ela que não importaria como, daríamos um jeito. E foi assim, decidi me mudar com ela para o Amazonas”, conta a aposentada, aos 53 anos.
Zélia deixou o marido em sua casa no interior de São Paulo e viajou com a nora, sem expectativa de voltar rápido para casa. Nesse tempo Sofia descobriu uma grande amiga e viu na sogra uma força para seguir em frente. “Não foi um período fácil, ela estava longe do meu sogro, eu longe do Pedro. Maria, minha filha, sentia muita falta do pai. Mas eu brinco que ela foi um anjo na minha vida, não sei se eu teria dado conta sozinha”.
Depois de seis meses cursando fora de Mato Grosso do Sul, Sofia batalhou muito por uma transferência, até que no segundo semestre de 2018 veio a resposta. “Consegui transferir para UFMS daqui e foi aquela alegria, a família vibrou comigo”.
Zélia novamente não desistiu da nora, apesar de ter ajudado tanto ao sair de casa. Vendo a dificuldade de Sofia em administrar o tempo com a Medicina, a casa e a filha, a sogra resolveu dar mais uma mãozinha inesperada à nora e o filho. “Eu sei que é o sonho dela e isso é muito importante. Ao mesmo tempo minha netinha é tudo pra mim e resolvi me mudar para ajudar cuidar dela”.
Agora, ela e o marido aposentado vivem em Campo Grande. “Não me arrependo, foi uma decisão tomada de coração. Ver o sorriso da minha neta, da Sofia e do meu filho não tem preço”.
Para a nora o sentimento que fica é gratidão e se tornou quase impossível levantar da cama sem pensar sobre a persistência. “Hoje falo que não podemos desistir. Parece que nada é por acaso. Agora meu objetivo é formar e cuidar de pessoas, assim como a minha família, é o sonho da minha vida”.