Há 30 anos, Jerônimo é o segurança simpático que virou patrimônio de shopping
Ele é o segurança mais antigo e conhecido pelos corredores. Além de simpático, ele ainda se emociona com a chegada do Papai Noel
Faça chuva, faça sol, ele está ali, andando pelos corredores do shopping mais antigo da cidade, atento em cada detalhe, mas sem nunca negar um sorriso ou ‘boa tarde’. Jerônimo Elias da Silva Junior é o segurança mais antigo do Shopping Campo Grande. Lá se vão 30 anos de histórias e lembranças.
O Lado B tentou durante muito tempo uma entrevista com o segurança que virou “patrimônio” para os mais antigos e está na memória afetiva de quem um dia foi criança e levou ralo ao correr descalço tropeçando nos clientes. Ontem (15), a empresa finalmente abriu as portas e Jerônimo topou falar da sua trajetória.
Depois de tanto tempo, ele ainda consegue rir ao saber que chamava a atenção de criancinhas. Mas também diz que chora com chegada de cada comemoração natalina. “Os natais sempre me emocionam, ver o sorriso e a esperança estampada no rosto de cada criança é inesquecível”, conta.
Com o colorido da árvore de natal e a presença do Papai Noel, ele não segura a emoção, muito menos as lágrimas. “Eu me emociono e até choro. Já chorei em muitos natais”, lembra sorridente.
Mas o principal nessa história nem é o Natal. Aos 54 anos, até hoje o que Jerônimo mais gosta de falar é da segurança e do amor que tem pelo ofício, desde que o shopping abriu as portas para o campo-grandense, em 18 de outubro de 1989.
E olha que o primeiro dia por ali não foi fácil. À época, lojistas e funcionários mal acreditavam que o lugar abriria na data prevista. Além da poeira, muitos detalhes faltavam ficar prontos, mesmo assim, a inauguração ocorreu e mexeu com o coração dos moradores, especialmente, com o de Jerônimo. “Eu fiquei encantando, era algo muito grandioso para a época, e estava ansioso com a chegada dele”, descreve.
Jerônimo se tornou segurança três meses antes da abertura. Foi contratado por uma empresa terceirizada e só depois da inauguração foi efetivado na equipe orgânica do shopping. “Eu tive a oportunidade de continuar, mas não imaginava chegar aos 30 anos de casa”.
A oportunidade surgiu pelo seu tamanho, acredita. “Tornei-me segurança porque tinha uma boa estatura, acho que isso contava muito na época para ser um segurança”.
Mas o homem alto, magro, com cara de feliz, já precisou se esforçar muito para lidar com todo tipo de situação e, ao mesmo tempo, garantir que ninguém passe a perna na segurança. “Comecei como vigilante e depois fui inspetor até chegar ao cargo de gestor de segurança. Mas fiz cursos, me profissionalizei, passei por muitos treinamentos, tudo voltado para essa área”, conta.
Ainda que o sorriso predomine no rosto, ele garante que a atenção e o “olho no olho” é que impede a ação até dos mais espertinhos. “Olhar nos olhos é importante, e se a pessoa tiver mal intencionada você percebe na hora”, explica. “E, em minha opinião, a nossa maior arma é a palavra. Quando você conversa, traz uma palavra ou um sorriso, essas coisas fazem com que as pessoas se sintam mais à vontade, em qualquer lugar”.
Em um país onde negro sofre com o racismo que teima em machucar a todos, até uma criança, Jerônimo também jura que nunca passou por esse tipo de situação e se sente feliz por, ao longo dos anos, ter visto outros negros conquistarem seu espaço, dentro e fora do shopping. “Eu fui criado assim, de maneira tranquila e aberta quanto a isso, então aprendi a lidar, mas aqui eu nunca me senti assim por algum comportamento de cliente”, garante.
No dia a dia da função, ele também não dá tréguas para a disciplina e nem para equipe. “Tem que saber se comportar, tem que saber como falar com qualquer pessoa, compreender as diferenças e até mesmo quando há necessidade de abordagem. Isso é essencial para um segurança. Eu cobro muito isso de mim”, explica.
Mas o que tem de disciplinado tem de carinhoso e simpático, por isso, nem cliente estressado tira a paciência de Jerônimo, que jura nunca ter arranjado conflitos. Filho caçula e irmão de três mulheres, o carinho dentro de casa sempre foi rotina e boa parte do que aprendeu com a família também é levado para o trabalho. “Muita coisa eu emprego aqui dentro, uma delas é o respeito, o amor pelo o que eu faço e a paciência. Isso tudo veio da minha família”.
Dentro de 30 anos como segurança, surgiu oferta para trabalhar em outros lugares. Jerônimo até manteve trabalhos paralelos nas horas de folga, mas tempos depois largou tudo para se dedicar exclusivamente ao shopping. Hoje passa os dias ganhando amigos e “gerenciando”, diz como quem se sente feliz com a trajetória. “Acho que eu nasci supervisor”, ri.
De segurança mais antigo a um dos mais reconhecidos pelos clientes, Jerônimo também conseguiu dar uma vida melhor para a família. Casado há 32 anos, comemora ter quatro filhos e três netos, dos quais é impossível fugir de um abraço, mesmo durante o expediente. “Quando meus netos passeiam no shopping e me encontram, eu não escapo de um abraço apertado. Isso também me deixa feliz”, finaliza.
Na memória de muitos clientes, Jerônimo é um dos personagens de um documentário que será lançado nas plataformas digitais nesta sexta-feira, 18 de outubro, para comemorar as três décadas de existência do shopping, que também deu um novo sentido a cidade no final da década 80.
Curta o Lado B no Facebook e Instagram.