Há 47 anos, loja de tintas no Centro se mantém aberta pela disposição de Nelson
Com uma garagem para carros ao lado do prédio, a loja vende de acessórios para carro até materiais de pintura de todos os tipos.
A movimentação na Rua Aquidauana é tímida se comparada ao resto do Centro da cidade. E assim como a rua, o prédio que, segundo o proprietário Nelson Chaia, de 74 anos, já abrigou a maior loja de tintas da cidade também é discreto.
Construído em 1971, o único elemento a chamar atenção é o número 240 na fachada marrom e amarela, feita também com tijolos aparentes.
Antiga Arco-íris tintas, a atual NN Automóveis já foi a única a trocar para-brisas em Campo Grande. Com uma garagem para carros ao lado do prédio, a loja vende de acessórios aos materiais de pintura de todos os tipos. Até os anos 90, o sucesso era tão grande que o proprietário chegou a abrir outras 3 franquias. Saudoso, ele ainda se lembra da época em que a rua era movimentada por caminhões lotados, que reabasteciam o estoque 5 vezes por semana.
Com um copo de café na mão, Nelson relembra que há 30 anos teria sido impossível parar e “jogar conversa fora”, porque os clientes entravam e saíam o tempo todo. Na loja que já teve, literalmente um time de futebol formado só por funcionários, os troféus ainda estão no alto das prateleiras de tinta, que costumavam ocupar todo o espaço na parede até os fundos do prédio, muito semelhante ao de um galpão.
Nelson começou a trabalhar aos 9 anos no Mercadão Municipal, na época em que “ainda era uma feira”. Lá teve o próprio box de pão caseiro. Foi acordando cedo e trabalhando até mais tarde que ele conta ter conseguido juntar dinheiro para construção do prédio onde trabalha até hoje.
Na tentativa de mudar de vida, Nelson deixou a loja nas mãos do irmão e estudou 6 meses para prestar vestibular, chegou a fazer faculdade de Direito em Uberaba, já que “naquele tempo não havia um advogado em cada esquina como hoje. Fazer carreira era muito mais fácil”.
A rotina durante a faculdade era corrida, o irmão cuidava da loja e ele ia para Uberaba mais ou menos a cada 15 dias e, dependendo de como as coisas estavam por aqui, ficava cerca de uma semana para concluir as provas. “Eu tinha os livros e dava para fazer o curso à distância, o fim de semana que eu chegava lá ficava trancado no hotel estudando até virar a noite”, lembra com orgulho.
Depois de formado, apesar de todo o sacrifício para estudar, Nelson descobriu que havia de fato sido feito para a vida de lojista. Se ele tem algum arrependimento de ter deixado de lado a carreira de advogado? "De jeito nenhum".
Foi com a renda da loja que Nelson cuidou da esposa e dos 5 filhos, dos quais 2 são adotados. Antigamente o assunto costumava ser um tabu, mas isso não influenciou em nada a decisão que para o casal foi natural.
Mesmo com tantos filhos, Nelson continua sendo o único a se dedicar à loja. “Todos eles estudaram e seguiram outras carreiras, tenho filho advogado, uma filha engenheira e a mais nova cursa Medicina na Argentina”, conta ao garantir não se sentir chateado com as escolhas de nenhum deles, Nelson entende que o comércio é uma vocação bem particular.
Com o movimento reduzido, sobra espaço nos fundos da loja que hoje rende o suficiente para se manter, mas que não vai fechar as portas enquanto Nelson tiver condições para trabalhar. garante o empresário.
Apesar da idade e de já ser aposentado, ele nem pensa em vender o prédio e aproveitar os frutos do trabalho em casa. Diz que pode, no máximo, tirar uma semana de folga no fim do ano para viajar com a esposa. “Abro a loja todos os dias às 7h da manhã e fecho às 17h, até eu morrer vai continuar sendo assim”.