O que o Pão de Açúcar tem guardado sobre o Mato Grosso do Sul?
De longe, a pose da estatua no pé do Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro, remete à imagem bem conhecida. É o mesmo homenzinho uniformizado, em um movimento estranho, como naquela praça de Dourados, no interior de Mato Grosso do Sul.
Um colega jornalista sempre repetia a informação e desta vez resolvi verificar. Ali, em um dos principias pontos turísticos do Brasil, há sim uma homenagem ao “Tenente Antônio João” e aos “heróis” do hino sul-mato-grossense.
É automático, na hora dá vontade de cantarolar: “Vespasiano, Camisão e o tenente Antônio Joãaaaaaaaaaaao...”
É claro que a homenagem em praça pública não existe por causa da música, muito menos pela existência de Mato Grosso do Sul. É um reconhecimento à coragem dos combatentes da Guerra do Paraguai. No monumento, estão as imagens do Coronel Camisão, de Guia Lopes, do tenente Antônio João e de episódios como o “Salvamento dos Canhões”.
Todos também não estão ali por conta do Pão de Açúcar e sim pela localização da Escola Superior de Guerra, bem ao lado do embarque e desembarque de turistas no teleférico carioca, no bairro da Urca.
Mas o que importa é que alguns dos “nossos” estão em evidência, o que para uma sul-mato-grossense é no mínimo curioso e de uma importância incrível quando se está sozinha em uma cidade cheia de gente que não te dá a mínima para quem não é carioca ou estrangeiro.
A satisfação só perde a força quando resolvo avançar no passeio e procurar o mausoléu que guarda os restos mortais dos nossos “heróis” e que, segundo o Google, também fica ali, na mesma praça, aos pés do Pão de Açúcar.
“Moça, nunca nem ouvi falar disso. Trabalho aqui há 22 anos e nunca vi esse Guia Lopes que você está falando”, diz o segurança, a cerca de 50 metros da estátua.
Com tempo de sobra para uma conversa, ainda tirei algumas risadas do homem, lembrando que o Guia Lopes tem uma história e tanto.
“Ele entrou na guerra por vingança, porque os paraguaios sequestraram a esposa e os quatro filhos dele em Jardim, onde a família morava. Amigo, ele guiou os soldados durante uma das fugas do Paraguai. Talvez todo mundo tivesse morrido sem o Guia Lopes”, conto do meu jeito.
Não perguntei o nome do dito cujo, mas duvido que alguém consiga arrancar de algum funcionário, policial ou militar das redondezas a localização do monumento em homenagem à Guerra do Paraguai, muito menos a localização do mausoléu.
O soldado na portaria do quartel também jura que não existe nada desse “tipo” ali. “A senhora deve ter errado de lugar. Não é lá em Niterói?”, pergunta o militar.
Insisto e vou até a bilheteria do teleférico, pela segunda vez na manhã de uma quinta-feira. “Agora que você falou, um dia eu vi umas pessoas descendo ali naquela casinha. Será que é lá?”, responde uma atendente do Pão de Açúcar, apontando para a tal “casinha”.
Quando chego perto, finalmente a “revelação”: no centro de um gramadinho sem graça está o mausoléu. No topo, uma placa de 1940 confirma: “...mausoléu para perpetuar a memória dos militares mortos na Guerra do Paraguai”.
O lugar foi aberto à visitação há um ano, no centenário do Pão de Açúcar, mas pelo nível de esquecimento, ninguém deu muita importância. Também, quem quer ver restos mortais se pode pagar R$ 53,00 e “sobrevoar” a Baía da Guanabara?
Sem entender o meu propósito, o segurança, atencioso desde o início, tenta justificar a desinformação. “Moça, você veio lá do Mato Grosso para ver isso”, pergunta com sorrisão no rosto.
Antes da resposta, penso que pelo menos vou poder praticar a boa e velha reação sul-mato-grossense e não voltar para o hotel sem tirar um sarrinho do carioca. “É Mato Grosso do Sul!”.